Rede paulistana terá já em 2018 aulas de programação e de ética na internet

ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER, ENVIADA ESPECIAL A PEQUIM, E PAULO SALDAÑA, DE SÃO PAULO – FOLHA DE S. PAULO

A partir de 2018, alunos do 1º ao 9º ano do ensino fundamental da rede municipal de São Paulo terão aulas de programação e de ética na internet, com base em um currículo de tecnologia que será adotado por todas as escolas.

O plano da prefeitura paulistana é ter salas munidas de tablets e, em alguns casos, até de impressoras 3D.

Até o próximo domingo (30), o prefeito João Doria (PSDB) estará em um tour na China atrás de investimentos. Um dos planos é se aproximar de empresas chinesas dispostas a doar materiais para pôr o currículo digital em prática.

Segundo Doria, a meta é digitalizar todas as salas de aula até 2020. A rede tem 416 mil alunos no ensino fundamental, divididos em 561 escolas. São 14 mil turmas.

Formação permanente de docentes, o acesso aos equipamentos a todos alunos, assim como a manutenção, são desafios para a prefeitura.

O novo currículo de tecnologia entrará na grade obrigatória da rede e introduzirá os estudantes ao "dialeto" digital –como aprender noções de algoritmos (as fórmulas que determinam qual informação aparece primeiro numa busca) e a montar um site com a linguagem HTML.

"Os alunos também sairão dominando mídias digitais, como a edição de filmes, fotos, música, e terão aulas de robótica", diz o secretário de Educação paulistano, Alexandre Schneider.

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Raio-X

416 mil
alunos de ensino fundamental tem a rede municipal

14 mil
turmas

561
escolas

> todas já contam com acesso à internet, laboratório de informática e aulas de informática

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1) O que a prefeitura pretende

Currículo
Eixo Digital do currículo da rede sistematiza o ensino tecnológico a partir do 1º ano do ensino fundamental, com um itinerário para todas as escolas seguirem

Equipamentos
A gestão conta com a doação de 10 mil tablets de uma empresa chinesa. Recentemente, anunciou outra doação de 18,6 mil equipamento de infraestrutura de rede, como servidores e roteadores, além de convênio com o governo federal de R$ 27 milhões

Laboratórios digitais
Prefeitura pretende criar laboratórios de educação digital piloto em quatro CEUs. Ideia é que haja equipamentos de ponta, como impressoras 3D.

2) Desafios

Formação
Trabalhar com tecnologia e cultura digital exige, segundo especialistas, formação profissional permanente. Prefeitura ainda não tem plano estruturado

Equipamentos
Falhas no processo de manutenção dos equipamentos pode se tornar um problema

Escala
Desafio é que abordagem digital não se resuma a projetos pilotos e chegue a todas as turmas.

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Já há iniciativas nesse campo: uma turma do colégio José Herminio Rodrigues (zona norte) recriou o "Genius", brinquedo dos anos 1980 com cara de disco voador.

Os alunos dessa etapa já têm uma aula semanal nos laboratórios de informática, presente em todas as escolas. Mas a partir do ano que vem o novo currículo consolida um "eixo digital" para ser adotado por todas as unidades.

Parte desse currículo se destinará à "etiqueta virtual". Os estudantes aprenderão, por exemplo, se é ético ou não compartilhar nas redes sociais fotos e conversas que travaram privadamente com coleguinhas.

A prefeitura planeja projetos tecnológicos pilotos em quatro CEUs: Capão Redondo, Sapopemba, Paz e Feitiço da Vila, que devem receber impressoras 3D.

Isso tudo terá um custo. A estimativa fica em torno de R$ 70 milhões, aí inclusos equipamentos, softwares, mobiliário e formação.

Parte do investimento virá do Ministério da Educação (R$ 27 milhões). Outra, de softwares doados pela Microsoft (R$ 15 milhões).

A prefeitura busca outras doações de tablets e computadores. Daí entra o "made in China". Gigante chinesa das telecomunicações, a ZTE já se dispôs a doar material, diz o secretário de Inovação e Tecnologia, Daniel Annenberg, também na China.

Devem ser doadas 10 mil máquinas. Também será lançada uma licitação para compra de equipamentos.

Para a construção do novo currículo (que inclui a produção de documentos para todas as disciplinas), a secretaria fez uma pesquisa com 43 mil alunos. Uso de internet, tecnologia e até robótica aparecem com destaque entre as preferências dos alunos.

"É necessário uma formação permanente. Não podemos ter como horizonte um professor perfeitamente formado e pronto. Se em outras profissões é assim, na educação é ainda mais forte", diz Nelson Pretto, professor da Universidade Federal da Bahia e pesquisador do tema.

Já há na rede 882 professores de informática, o que deve facilitar o processo formativo, diz a prefeitura.

Pretto ressalta ainda que a abordagem não pode ser isolada. "O fundamental é que a escola seja inserida na cultura digital, tanto na aula de programação quanto para história, geografia", diz.

Presidente do Sinpeem (sindicato dos professores da rede), o vereador Claudio Fonseca (PPS) diz que a infraestrutura nas escolas será o mais complicado. "Muitos prédios precisam de adaptação e as escolas ainda têm sinal de internet muito fraco."

Em 2012, quando Schneider ocupava o mesmo cargo na gestão Gilberto Kassab (PSD), foram comprados 8.000 tablets. Sem manutenção, muitas escolas estão hoje com os equipamentos sem uso. Segundo o governo, os aparelhos ficaram obsoletos. A pasta não soube informar quantos ainda funcionam.

ESPIÃO

Um professor "espião" que pode monitorar o que seus alunos acessam no tablet e, se achar necessário, bloquear eventuais distrações (uma "escapulida" para o Facebook durante a aula, por exemplo).

Essa foi uma das propostas que mais entusiasmaram o prefeito paulistano João Doria na apresentação de um projeto de aula digital formulado pela Lenovo, gigante chinesa que comprou a divisão de PCs da IBM e a Motorola.

O primeiro dia de agenda do tour chinês do prefeito, que viajou a convite do governo local, incluiu visitas estratégicas para implementar a meta no país: "Vender São Paulo".

Os estatais Banco da China e a instituição que equivale ao BNDES desta que é a segunda maior economia do mundo foram outros compromissos de segunda-feira (24).

A meta de Doria era convencer os anfitriões de que injetar recursos em São Paulo é um bom negócio.

Diretor do Banco da China no Brasil, Zhang Guahua disse que as turbulências na economia e na política brasileira "de certa maneira, com certeza afetam a confiança" do investidor chinês. Ele frisou, contudo, que seu país pensa "a longo prazo", expressão que virou o bordão de Doria para dizer por que o Brasil continua atraente para o mercado internacional.

O prefeito também visitou a Muralha da China.

Enquanto conversava com jornalistas sobre o drama tributário do país, Doria não segurou o riso. Foi uma reação a chineses que gritavam "acelela" a poucos metros dele, na Muralha da China.

O grupo foi instruído pela equipe do tucano a bradar seu slogan #acelera para vídeos que abasteceriam suas redes sociais –os locais também repetiram o V na horizontal, gesto com as mãos inventado pelo publicitário Nizan Guanaes para a campanha eleitoral de 2016.

Outra acolhida: um casal de turistas maranhenses o interpelou e declarou apoio a eventual candidatura dele à Presidência. 

Matéria publicada na Folha de S. Paulo.
 

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