“Professor da USP diz que é preciso elevar marginais” – Folha de S.Paulo

 

Medida será necessária para elevar permeabilidade do solo, diz Mario Thadeu Leme de Barros

Para ele, as obras feitas no Tietê nos últimos 15 anos foram "fundamentais", mas feitas para um nível de segurança "hoje muito menor"

MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Esqueça as soluções em dois, três anos. As enchentes vão continuar a paralisar São Paulo. A opinião é de um dos maiores especialistas em drenagem urbana, Mario Thadeu Leme de Barros, 57, professor-titular da Escola Politécnica da USP.
Ele diz que, no prazo de 20, 30 anos, é uma boa ideia acabar com as marginais.

FOLHA – Dá para acabar com as enchentes ou elas são inevitáveis?
MARIO THADEU LEME DE BARROS – São Paulo tinha 200 mil habitantes no início do século 20. Em cem anos, passou para 18 milhões. Foi um impacto muito grande porque a ocupação da bacia do Alto Tietê foi desordenada. A urbanização fez com que o rio passasse a viver confinado. A situação de controle de cheias numa situação dessas é muito complexa. Em dois, três anos, teremos que conviver com essa situação. É preciso fazer investimentos em controle de cheias, mas deveríamos tomar medidas mais radicais.

FOLHA – Que tipo de medida?
LEME DE BARROS – É preciso pensar em soluções viárias que tirem trânsito das marginais. Isso só vai ocorrer com a redução do transporte privado. A médio e a longo prazo, poderíamos construir diques, para aumentar a capacidade do rio, e elevar as pistas das marginais. São soluções muito caras. O ideal é diminuir a vazão da água que corre para o rio, com obras de retenção e mais piscinões.

FOLHA – O sr. acha viável acabar com as marginais?
LEME DE BARROS – Daqui a 20, 30 anos, haverá tantas restrições ao automóvel que será possível pensar nisso. Não vejo muita saída fora dessa solução. Temos que recuperar áreas de infiltração, criar zonas verdes, parques lineares. É a renaturalização das bacias urbanas.

FOLHA – As obras feitas no rio Tietê nos últimos 15 anos foram boas?
LEME DE BARROS – Foram necessárias e fundamentais. Sem elas, tudo teria sido muito pior. Só que essa obra foi feita para um determinado nível de segurança, que hoje é muito menor.

FOLHA – O sr. quer dizer que o prazo de validade das obras se esgotou?
LEME DE BARROS – Não. O que ocorreu foi o crescimento da mancha urbana e do lixo que vai para os rios. Estamos sempre correndo atrás do prejuízo.

FOLHA – O que poderia ser feito para aumentar a vazão do rio?
LEME DE BARROS – Há um grande volume de lixo que não é coletado e vai parar no rio. É preciso limpar o rio, porque a calha está no limite. A região metropolitana tem mais de 30 municípios, e a água não respeita os limites políticos do município.

FOLHA – Mas existe uma comitê de gestão da bacia do Alto Tietê.
LEME DE BARROS – O comitê não aborda a questão de cheias com a complexidade que o tema merece. Ele cuida mais de diretrizes, de políticas de longo prazo. Deveria haver um organismo que fizesse a gestão e o planejamento de forma integrada.

FOLHA – Os políticos sempre culpam as chuvas pelas enchentes. Esse argumento tem fundamento?
LEME DE BARROS – Sobrevoei a cidade de helicóptero e é impressionante. Você passa ao lado de grandes supermercados, de grandes empresas, e o estacionamento é totalmente impermeável. Isso não faz sentido.

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