DÉBORA FANTINI
DA REPORTAGEM LOCAL
São Paulo vai poder ficar mais alta se a revisão do Plano Diretor proposta pela prefeitura for aprovada pela Câmara de Vereadores, que recebeu o texto no último dia 2 de outubro e não tem ainda previsão para concluir sua análise.
Uma das alterações libera a verticalização, autorizando construções com até seis vezes a área do terreno nas operações urbanas -trechos definidos no Plano Diretor para melhorias urbanísticas-, pagando-se uma contrapartida à prefeitura, a outorga onerosa, já presente na legislação em vigor.
Na lei atual, esse índice só é permitido na Operação Urbana Centro. Nas demais, o coeficiente de aproveitamento -área que pode ser construída em relação à do lote- máximo é quatro. Pela proposta, esse coeficiente poderá ser elevado para seis, desde que o coeficiente médio da quadra seja quatro.
"Num único quarteirão [10 mil m2] poderão ser despejados 40 mil m2. Não vai ser mais preciso [o incorporador] adquirir um quarteirão inteiro para fazer uma torre", avalia Lucila Lacreta, membro do Conselho Municipal de Política Urbana.
A Sempla (Secretaria Municipal de Planejamento) argumenta que as áreas onde a verticalização será permitida ficam no entorno das estações de trem e de metrô.
"A cidade precisa ficar mais compacta em torno das linhas de transporte de massa para evitar a emissão excessiva de gás carbônico", afirma o secretário de Planejamento, Manuelito Magalhães.
Cálculos do consultor de planejamento urbano Ivan Maglio, que coordenou a equipe da Sempla na elaboração da lei vigente, mostram que, com o novo Plano Diretor, São Paulo poderá atingir o dobro de seu tamanho atual crescendo em altura. "Mas há um déficit de metrôs e ferrovias de cerca de cem quilômetros", aponta.
A proposta enviada à câmara também sugere alterações nas chamadas AIUs (Áreas de Intervenção Urbana). Já presentes no plano atual, essas áreas podem usufruir do mecanismo de outorga onerosa para fins variados, como criar parques nas várzeas de rios e córregos e expandir linhas viárias.
Ao contrário do que ocorre na operação urbana, o dinheiro da outorga não precisa ser investido no perímetro da AIU.
A mudança principal do plano é no tipo de AIU próxima aos ramais da rede de transporte público. Será permitido construir quatro vezes a área do terreno num raio de 600 m ao redor das estações -antes, esse raio era de apenas 300 m, o que foi mantido apenas para o entorno dos trilhos.
Descontrole
Como a proposta não prevê a elaboração de planos urbanísticos específicos para essas áreas de intervenção, urbanistas temem um crescimento descontrolado em áreas servidas pelo metrô -cuja proximidade é um chamariz explorado em folhetos publicitários de imóveis.
"Um estudo com a Secretaria Estadual de Transportes Metropolitanos embasará a definição das áreas", afirma o chefe da Assessoria Técnica da Sempla, Miguel Bucalem.
O professor aposentado da FAU-USP (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo) Luiz Carlos Costa afirma que, nas áreas de intervenção, os adensamentos são criados pela iniciativa privada, que tem exercido pressão para ampliar o aproveitamento dos terrenos.
"O mercado está mais interessado na revisão do zoneamento [que será feita só depois da aprovação das alterações no Plano Diretor], que estabelecerá com precisão onde se vai poder construir", rebate Cláudio Bernardes, vice-presidente do Secovi-SP (sindicato do setor imobiliário).
Operações urbanas cobrirão 17% da cidade
Revisão do Plano Diretor prevê mais dois perímetros para intervenções, um deles com foco em habitação
DA REPORTAGEM LOCAL
Com duas novas operações urbanas introduzidas na revisão do Plano Diretor, 17,24% do território paulistano poderão ser ocupados por meio desse tipo de intervenção.
Na revisão, foram introduzidas as operações urbanas Amador Bueno, com foco em habitação e localizada na zona leste, e o pólo logístico Fernão Dias, na zona norte.
Para que possam ser implantadas, é preciso aprovar leis específicas determinando onde será permitido ultrapassar os limites construtivos e em quais obras a prefeitura deverá investir o dinheiro arrecadado por Cepacs -títulos públicos que investidores trocam pelo direito adicional de construir.
Hoje, apenas cinco operações têm lei própria. A mais recente é a Rio Verde-Jacu, na zona leste.
Segundo a Sempla, a operação Vila Sônia (zona oeste) deverá ser a próxima. "Ela está em estágio avançado, o estudo de impacto ambiental está em andamento e deverá ser implantada ainda nesta gestão", afirma o secretário de Planejamento, Manuelito Magalhães.
Ao longo do metrô
O vice-presidente do Secovi-SP Cláudio Bernardes citou a operação Vila Sônia como uma das de maior interesse do mercado imobiliário, ao lado de Carandiru-Vila Maria (zona norte) e Santo Amaro (zona sul).
"Estamos só aguardando a lei da operação Vila Sônia para começar a comprar terrenos, ao longo do metrô não tem erro, são todos bons para se construir", afirma Bernardes.
"Se a prefeitura faz operações em áreas de interesse do mercado imobiliário, tem mais chance de obter sucesso", completa. Segundo ele, a tendência do mercado continuará sendo condomínios com torres de cerca de 20 andares e muitos espaços de lazer.
No plano atual, a limitação do gabarito (altura máxima) das edificações em muitas áreas da cidade corresponde a 15 metros, o equivalente a cinco andares. Essa determinação objetiva estimular o mercado a apostar em outros produtos que não os de alto luxo.
"Há uma classe média mais baixa, que não quer ter despesa de condomínio alta", aponta o professor de planejamento urbano da FAU-USP Nabil Bonduki, ex-vereador e relator do plano atual na Câmara.
(DÉBORA FANTINI)
Revisão superou adiamentos
DA REPORTAGEM LOCAL
A proposta de revisão do Plano Diretor foi enviada à câmara no último dia 2 de outubro, depois de sucessivos adiamentos.
A lei atual (13.430/2002) determinava que a revisão tivesse sido feita no ano passado.
Numa das prorrogações, o Conselho Municipal de Política Urbana conseguiu suspender judicialmente audiências públicas marcadas para as vésperas da votação da proposta em junho deste ano.
O conselho argumenta que a discussão estava sendo realizada sem a participação da população prevista no Estatuto da Cidade, lei federal sobre políticas urbanas.
"Não dá para rever projetos e estudos que ainda não foram executados. Uma revisão feita no improviso não é um bom planejamento", afirma Lucila Lacreta, do Movimento Defenda São Paulo e membro do conselho.
A prefeitura decidiu, então, dividir a legislação em três partes. A que está na câmara é a revisão do Plano Diretor, as outras duas são os planos regionais e a Lei de Uso e Ocupação do Solo, sem data marcada para serem revistos. (DF)
Fonte: Folha de S.Paulo – 21/10/2007