Prefeitura de SP regulamenta lei de aquecedores solares, mas cede parcialmente a lobby contrário


por Paula Graciela
Contribuidores: com reportagem de Alexandre Spatuzza

Após seis meses, a prefeitura da cidade de São Paulo regulamentou no dia 22 de janeiro a lei que obriga o uso de aquecedores solares na cidade em residenciais com quatro banheiros ou mais e estabelecimentos comerciais que fazem uso intensivo de água quente.

O decreto de regulamentação foi publicado com cerca de dois meses de atraso porque setores da construção civil não concordavam com a lei.

Apesar de não ter cedido em pontos principais [os que se opunham ao projeto queriam adiamento em um ano para a implementação da lei e isenção de taxas para os projetos que incorporem a tecnologia] a prefeitura concordou em aumentar o número mínimo de banheiros para quatro, dos três mencionados na lei 14.459 de julho de 2007.

Segundo o decreto, as residências novas que tenham três banheiros, incluindo apartamentos, deverão ter a infra-estrutura pronta para a instalação do aparelho. O decreto também dá diretrizes para estabelecer quais edifícios estão isentos de instalação do equipamento por incapacidade técnica segundo o tempo de incidência do sol.

O decreto dá um prazo de 180 dias da data de sua publicação para o início da obirgatoriedade, ou seja, até 21 de julho de 2008.

Além disso, o decreto determina que em 180 dias será publicada nova regulamentação para a instalação do equipamento em projetos de habitação de baixa renda.

BRIGA DE BASTIDORES

Os que apóiam a medida elogiaram a publicação do decreto.

"O importante é que a regulamentação saiu e o Brasil segue na tendência mundial", disse o engenheiro Augustin Woelz da Sociedade do Sol e militante da implantação do equipamento.

No entanto, o atraso no projeto foi resultado de uma batalha entre grupos a favor e contra a medida, a Revista Sustentabilidade apurou.

A lei foi sancionada pelo prefeito Gilberto Kassab (DEM) em julho de 2007 com grande repercussão na imprensa. Ela determinava que a regulamentação deveria ser feita em até 120 dias.

Após a sanção da lei, a prefeitura teve de pedir uma extensão dos prazos para regulamentação porque o grupo de trabalho criado não achava consenso entre os grupos envolvidos no processo.

De um lado, o Sinduscon-SP liderou um grupo de entidades do setor de construção civil com a principal meta de minimizar e adiar a obrigatoriedade de implementação da lei, alegando impossibilidade técnica.

O Sinduscon-SP foi um dos participantes do grupo de trabalho, que, junto com outras entidades do setor (Secovi, Asbea, Abrainstal, Abrasip), propôs que as orientações básicas para a aplicação do uso de aquecimento solar não podem deixar de considerar o uso racional da água.

As associações do setor também sugeriram isenção durante cinco anos de pagamento de taxas de aprovação de projetos que incluam o sistema e que a obrigatoriedade só seja implementada 12 meses depois da publicação do decreto de regulamentação.

Além disso, o Sinduscon-SP sugeriu que o aquecimento solar em piscinas somente seja obrigatório no caso de construção de novas piscinas, em edificações novas ou decorrentes de reformas e ampliações de edificações existentes.

No entanto, o Sinduscon-SP colocou-se contra a legislação desde o início, pois acredita que qualquer obrigatoriedade é nociva.

"Qualquer coisa que é obrigatória não dá certo. Uma iniciativa dessas tem que ser voluntária pela sociedade. Não é dessa forma que se resolverá o problema de gastos de energia", disse o vice-presidente da entidade, Francisco Vasconcellos, à Revista Sustentabilidade.

Do outro lado, a associação de fabricantes de equipamentos de refrigeração e aquecedores solares (Abrava), que ajudou o legislativo paulistano a elaborar a lei, esteve presente nas reuniões para esclarecer as normas de instalação e questões técnicas do projeto.

A Abrava culpou resistência do setor de construção civil pelo atraso, por razões políticas e não técnicas porque as construtoras não querem investir no treinamento do pessoal para fazer a instalação dos equipamentos.

"Na verdade não existem pontos complexos na regulamentação propriamente dita, não existe complexidade, pois todos os pontos previstos na lei estão dentro das normas brasileiras", explicou Carlos Café, presidente da Abrava em entrevista à Revista Sustentabilidade.

"A regulamentação está atrasada por causa do lobby politico do Sinduscon … efetivamente eles não sabem fazer, mas a realidade é que o setor vai ter que se adaptar mesmo. Se eles não sabem projetar um prédio com aquecedor solar eles vão ter que aprender."

Segundo a lei, a obrigatoriedade de sistemas de aquecimento solar se aplicará aos estabelecimentos não residenciais, que seguem atividades comerciais, prestação de serviço públicos e privados e também às industrias, como hotéis, clínicas de saúde e beleza, hospitais, escolas, lavanderias e indústrias em geral. O projeto será aplicado em edificações novas ou não, isoladas ou agrupadas, segundo informações de uma das coordenadoras do grupo de trabalho, Stela Goldstein.

Foram ouvidos também grupos interessados na aplicação da lei como ONGs e ambientalistas. Um grupo de sete entidades, incluindo o Greenpeace, Amigos da Terra e WWF enviou uma carta ao prefeito Kassab pedindo urgência na regulamentação da lei, a Abrava informou na sua newsletter mensal.

A WWF informou que apóia a medida, pois faz parte da ‘Agenda Elétrica Sustentável’ da entidade.

A carta afirmou que a lei é um mecanismo fundamental para alterar o padrão insustentável de consumo de energia e demais recursos naturais das edificações brasileiras, segundo trecho da nota reproduzido pela Abrava.

"As construtoras são contra a lei por medo de reduzir seu lucro em 1% a 1,5% porque eles acham que os equipamentos encarecem o imóvel e eles perderiam em relação ao prédio vizinho que não tem obrigatoriedade de instalar o equipamento", disse Woelz. "Na verdade, eles estão indo contra tendência mundial para preservar o planeta por causa de centavos."

PORTO ALEGRE

Em Porto Alegre, a situação é ainda pior, pois a lei tinha sido sancionada em 3 de janeiro 2007, e ainda não foi publicado decreto que regulamenta o incentivo ao uso de aquecedores solares, segundo a newsletter da Abrava.

Segundo a newsletter, o atraso se dá porque é necessária contribuições de várias secretarias municipais.

Em 2007, foram aprovadas leis parecidas em cerca de 40 municípios, informou a Abrava.

Fonte: Revista de Sustentabilidade – 23/01/2008

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