A capacidade do sistema municipal de saúde de dar continuidade ao tratamento dos pacientes após o atendimento nas unidades de Assistência Médica Ambulatorial (AMA) permeou boa parte do debate sobre saúde, realizado no Sesc Vila Mariana, na última sexta-feira (25/04). O debate A Saúde Pública na Cidade de São Paulo contou com a presença do secretário Municipal de Saúde, Januário Montone, o ex-ministro da Saúde Adib Jatene e o ex-secretário de Saúde do Estado de São Paulo José da Silva Guedes.
Guedes afirmou que o sistema de saúde municipal foi desmantelado no período das gestões Paulo Maluf e Celso Pita e reconheceu o esforço das gestões posteriores em reconstruir o atendimento, mas demonstrou uma preocupação: “é preciso garantir que o paciente vai ter prontuário, que dali vai ser encaminhado e vai voltar”. Ele destacou dois problemas: a falta de médicos no Programa de Saúde da Família (PSF), devido ao pouco interesse dos profissionais, e a ausência de infra-estrutura em algumas unidades de saúde. “Pelo menos 80 das unidades básicas de saúde são pequenas, porque não foram criadas com essa finalidade”.
Para Jatene, o problema das AMAs é que remuneram melhor os médicos do que o Programa de Saúde da Família e, por isso, muitos estão migrando para as unidades, o que “coloca em grande risco o PSF”. Para Jatene, a AMA resolve o problema de saúde do paciente na hora, mas acaba descobrindo a necessidade de acompanhar o paciente depois. Segundo Jatene, a “dificuldade não é problema de gestão somente, é problema de recurso”, já que a AMA é mais barata do que o Programa de Saúde da Família.
O Secretário Montone reconheceu a falta de estrutura no atendimento de especialidades ao defender o quanto é importante o atendimento que abre portas à população, por que “amplia o acesso”, como ocorre com as AMAS. “Quando informatizamos a marcação de consultas aumentou em dois meses o tempo de espera [de dois para quatro meses]”. Segundo ele, na gestão atual “está sendo possível ter mais clareza sobre o que é resolvido na AMA, do que é preciso acompanhamento, o que é urgência. Ter essa clareza já é um avanço, permite “que a gente olhe o problema”.
Outra problema apontado por Jatene é desigualdade na distribuição de leitos hospitalares na cidade. De acordo com levantamento feito pelo ex-ministro, o número de leitos na cidade aumentou entre 1999 e 2007, mas nos 25 distritos mais bem servidos de hospitais há 10,57 leitos por mil habitantes, enquanto nas 71 distritos restantes há 0,49 leitos por mil habitantes. É preciso criar um mecanismo para condicionar a ampliação dos hospitais privados somente se também implantarem leitos em áreas onde a cobertura não existe. O ex-ministro afirmou que apresentou essa proposta ao secretário Montone.
Quando questionado se reconhecia a legalidade do Conselho Municipal de Saúde, o secretário afirmou que reconhece, mas que é necessário discutir o papel do conselho e que há uma “divergência de agenda política”. O atual conselho com 32 integrantes foi eleito no final do ano passado. Acabou impedido de assumir por meio de decreto da Secretaria de Municipal Saúde, que determinou a realização de novo processo eleitoral. A secretaria alegou ter recebido vários recursos administrativos de entidades da sociedade civil que questionavam a transparência na escolha dos representantes dos usuários. A população está representada por metade dos conselheiros, em número de 16, a outra metade é dividida entre gestores, trabalhadores e prestadores de serviços de saúde. Em março, o Tribunal de Justiça do Estado expediu uma liminar que reconheceu a legitimidade do conselho.
De acordo com o conselheiro Pedro Cláudio Bortz, que representa os trabalhadores de saúde, o secretário não tem demonstrado vontade de dialogar com os conselheiros. “Se há uma proposta de Plano Municipal de Saúde está guardada na gaveta. O problema é que sem ter acesso a isso, o conselho não consegue planejar as políticas de saúde no município”, afirmou.
Veja a apresentação sobre a saúde pública municipal apresentada pelo secretário no debate