Participação de moradores na elaboração de propostas para melhorar a cidade representa mudança cultural

 

Foto: Airton Goes

Airton Goes – repórter comunitário

O salão paroquial da Igreja São Francisco Xavier, na Vila Missionária, não é muito diferente de outros espaços localizados na periferia de São Paulo, que o povo utiliza para se reunir. Talvez, seja só um pouco maior do que a maioria. As cadeiras são de plástico e quase tudo é improvisado. Inclusive o cartaz afixado na parede, feito de cartolina branca e pincel atômico, que informa ao participante do Encontro Preparatório do I Fórum Nossa São Paulo os diversos grupos temáticos a escolher: Saúde, Educação, Meio Ambiente, Transporte, Cultura, Criança e Adolescente, Habitação e Esporte e Lazer.

Qualquer observador, mesmo o menos atento, pode perceber que tudo ali é resultado de um esforço coletivo. A começar pelo cafezinho feito minutos antes na cozinha da paróquia pela Vani, do Movimento de Moradia, e pela Carmen, do Movimento de Saúde. Na última hora, a irmã Annamaria, da Pastoral da Saúde, precisou buscar garrafas térmicas em sua casa, pois as da Igreja estavam sendo utilizadas pelo pessoal do curso de noivos, que se encontrava em outra sala da paróquia. Quanto às bolachas servidas, diversas pessoas voluntariamente trouxeram um pacote cada uma.

Até aí nem uma novidade para quem conhece a periferia de São Paulo. Tudo muito parecido com o que ocorre há anos em bairros esquecidos pelo poder público. Mas a normalidade aparente esconde uma grande novidade: sem serem convocadas pelo poder público, nem por um partido político ou parlamentar, as pessoas reunidas naquele salão paroquial, na tarde do último sábado (26/04), estavam ali para deliberar o que desejam da próxima administração municipal para melhorar a região e (sagrada ousadia) a cidade. E, ao fazerem isso, deram um passo a mais na conquista da cidadania para todos.

Em uma região carente como os distritos de Cidade Ademar e Pedreira, tão populosa e com tantos problemas, incluir a palavra “propor” às usuais “reclamar” e “protestar” (contra os serviços públicos oferecidos pela administração municipal) pode representar o início de uma mudança cultural.

Leia sobre as propostas elaboradas no encontro

Fora a população local, as únicas pessoas convidadas pelos organizadores do encontro foram Oded Grajew e Odilon Guedes, ambos do Movimento Nossa São Paulo. Eles, que já participaram de outros eventos na região da Pedreira e Cidade Ademar, voltaram a estimular o envolvimento dos moradores na discussão sobre o futuro da cidade.

“Não podemos achar normal que as crianças saiam da escola, depois de oito anos, sem saber ler e escrever corretamente. Não podemos achar normal ficar duas horas em um ônibus superlotado, para ir trabalhar. Não podemos achar normal morar num barraco na favela”, argumentou Guedes. Segundo ele, essas coisas, que “não são normais, só vão mudar com a pressão popular”.

Grajew destacou a importância da nova lei, que obriga o futuro prefeito ou prefeita de São Paulo a apresentar em até 90 dias após sua posse um programa de metas quantitativas para cada um dos setores da administração pública municipal, subprefeituras e distritos. “Quando vier um candidato pedir voto aqui na região, perguntem quais as metas dele para a saúde, a educação… se ele não souber responder, digam para voltar quando souber”, sugeriu.

Ele lembrou que a lei só foi aprovada por que houve uma pressão muito grande da sociedade civil, inclusive de entidades e movimentos da Cidade Ademar. E adaptou um ditado popular para exemplificar a importância da participação de todos. “Tenho dito por aí o seguinte: se a gente correr, o bicho pega; se ficar, o bicho come; mas se a gente se juntar, o bicho foge.”

 

 

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