“Programa das ciclovias não sai do papel” – Folha de S.Paulo

 


Sistema prevê uso de bicicleta como meio de transporte; secretaria não pode gastar verba com ciclovias fora de parques

Coordenadora do Pró-ciclista diz que falta de autonomia para fazer obras; projeto cicloviário da cidade ficará pronto no fim do ano

RICARDO SANGIOVANNI
DA REPORTAGEM LOCAL

PATRÍCIA GOMES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Um ano e quatro meses após a aprovação da lei que criou o "sistema cicloviário municipal" de São Paulo, a gestão Gilberto Kassab (DEM) não inaugurou nenhuma ciclovia destinada ao uso da bicicleta em vias públicas, como meio de transporte.

Com 23,5 km de ciclovias -apenas 4,5 km deles fora de parques, segundo a prefeitura- São Paulo subaproveita a bicicleta como veículo e não atende à demanda das cerca de 370 mil pessoas que a utilizam diariamente (para comparação, cerca de 1,7 milhão usam o carro todos os dias). Os dados são de pesquisa Ibope/Nossa São Paulo do final de 2007.

Essa quantidade de ciclistas, que corresponde à estimativa da prefeitura, é quase seis vezes a de 2002 -ano do último dado oficial sobre o assunto.
Desde 2006, o município possui um órgão responsável por fazer a lei sair do papel, por meio de estudos e da implantação de um sistema de ciclovias interligadas na cidade -o Pró-ciclista (Grupo Executivo de Melhoramentos Cicloviários).

Porém, por ser ligado à Secretaria do Verde e Meio Ambiente -e não à dos Transportes, por exemplo-, o Pró-ciclista tem poder executivo limitado: o órgão não pode empregar seu orçamento (R$ 11,8 milhões neste ano) em obras no sistema viário, porque a secretaria à qual pertence não tem autonomia para licitar e construir ciclovias fora de parques.

O grupo ainda não possui sequer o esboço de um projeto cicloviário para toda a cidade -algo que só deve ficar pronto no fim do ano, segundo Laura Ceneviva, coordenadora do Pró-ciclista. "Temos o recurso, mas falta autonomia e estrutura administrativa." O grupo tem 12 membros de seis secretarias -desses, só cinco em regime de dedicação exclusiva.

A comparação com grandes cidades que adotaram ciclovias nos últimos anos revela quão tímida é a política paulistana.

Bogotá, na Colômbia, construiu 340 km de ciclovias em sete anos -mais da metade implantadas de 1998 a 2000, um ano após o início dos estudos.
Segundo o ITDP (ONG que pesquisa alternativas em transportes), hoje 54% das residências têm bicicletas, e 66% do uso das ciclovias é para ir ao trabalho ou à escola.

Nova York, nos EUA, que tem 8,2 milhões de habitantes, fez cerca de 180 km de ciclovias nos últimos dois anos -o plano é ter 480 km ainda em 2009.
Enquanto isso, em São Paulo, usar a bicicleta segue sendo um ato de coragem. As mortes de ciclistas na cidade, que em 2004 foram 51, chegaram a 93 em 2005 e a 84 em 2006.

"Ando de bicicleta mais pelo gosto. E pela teimosia", diz o balconista Antônio Adelson de Souza, 54, que pedala 35 km por dia. "Os motoristas não respeitam, e até o lixo na rua é um obstáculo. Não tem pára-choque: o pára-choque é você", conta Souza, que já foi atropelado por um automóvel.
Enquanto as ciclovias não chegam, o ciclista deve respeitar as leis de trânsito: andar pela margem direita, no mesmo sentido da via.

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