“STF rejeita barrar candidato com ‘ficha suja'” – Folha de S.Paulo

 

Por 9 votos a 2, ministros do Supremo mantêm entendimento do TSE de que só condenação definitiva impede políticos de concorrer

Em julgamento de quase 8 horas, prevaleceu a tese do ministro Celso de Mello, contrária à ação da AMB, que divulgou "lista suja"

FELIPE SELIGMAN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu ontem, por 9 votos a 2, manter entendimento do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), afirmando que os políticos com "ficha suja" podem se candidatar, a não ser que tenham contra si condenação transitada em julgado -sem possibilidade de recurso.

Num julgamento que durou quase oito horas, prevaleceu a tese do relator da ação, ministro Celso de Mello, contrária à ação da AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), cujo principal argumento foi baseado na "garantia do princípio constitucional da presunção de inocência", segundo o qual ninguém pode ser considerado culpado até que seja condenado em última instância.

Com ele votaram Cármen Lúcia, Carlos Alberto Direito, Cezar Peluso, Ellen Gracie, Eros Grau, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello. A decisão tem efeito vinculante, ou seja, deverá ser seguida pelos tribunais regionais eleitorais.

Celso de Mello ainda foi além e disse, após apresentar seu voto, que uma modificação na legislação que trata da inelegibilidade, no sentido de permitir que a Justiça Eleitoral negue registros dos candidatos condenados que ainda tenham a possibilidade de recorrer, seria "inconstitucional".

Foi um recado indireto do STF aos congressistas que analisam, no Senado, projeto de lei complementar para possibilitar a restrição de participação dos políticos com "ficha suja". Os demais ministros que acompanharam o voto do relator também apresentaram argumentos para defender a "improcedência" da ação, mas não chegaram a abordar a validade constitucional de uma nova lei mais rigorosa.

A defesa da tese derrotada ficou por conta do ministro Carlos Ayres Britto. Segundo ele, existe diferença entre direitos políticos e condições de inelegibilidade. Ele foi acompanhado pelo ministro Joaquim Barbosa, com apenas uma ressalva: candidatos deveriam ser inelegíveis em pelo menos duas instâncias do Judiciário.

Na mesma linha se manifestou o procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, ao dizer que a moralidade e a probidade administrativas devem ser levadas em conta como condição de inelegibilidade. "A interpretação de todo o Ministério Público é que uma sentença condenatória, mesmo de primeira instância, é suficiente para justificar a impugnação da candidatura", disse.

A tese foi duramente rebatida, porém, pelos demais ministros. Peluso chegou a criticar o que chamou de "irracionalidade da atuação do Judiciário".

Eros Grau, por sua vez, disse que "prefere a ordem à Justiça". Ao que Ayres Britto respondeu: "Que coisa horrorosa". Grau, que votava, retomou a palavra e criticou o colega. "Essa coisa horrorosa impede que cada um de nós seja injustiçado pelo juiz de plantão. Acredito na lei acima da vontade do rei. Ainda que o rei seja um ministro do STF ou do TSE."


"Lista suja"

A ação proposta pela AMB pedia a revisão da atual Lei de Inelegibilidades no sentido de possibilitar à Justiça Eleitoral negar o registro de candidatos condenados desde os tribunais de primeira instância.

A legislação que trata do tema afirma que o candidato só pode ser declarado inelegível se condenado criminalmente, com sentença transitada em julgado por prática de crime contra economia popular, fé pública, administração pública, patrimônio público, mercado financeiro, pelo tráfico de entorpecentes e por crimes eleitorais, pelo prazo de três anos, após o cumprimento da pena.

A alternativa para tentar barrar candidatos com "ficha suja" é a divulgação da chamada "lista suja". A idéia começou a ser posta em prática pela própria AMB, que em julho apresentou sua primeira versão, que inclui os candidatos à Prefeitura paulista, Marta Suplicy (PT) e Paulo Maluf (PP). Após uma semana, o prefeito e também candidato Gilberto Kassab (DEM) teve o nome acrescentado.

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