“Por uma BH melhor” – Jornal Estado de Minas

 

Na Sala Juvenal Dias, diversos atores sociais organizam movimento inspirado em iniciativas semelhantes de Bogotá e São Paulo: abrindo o debate em Belo Horizonte

Júlia Moysés

Relatório do Fundo de Populações das Nações Unidas, divulgado em junho de 2007, afirma que até este ano mais da metade da população mundial estará vivendo em cidades. São cerca de 3,4 bilhões de habitantes urbanos, que, em muitos casos, convivem com problemas como criminalidade, trânsito caótico, poluição, crescimento desordenado, falta de acesso aos bens culturais e o pior deles: políticas públicas ineficazes.

Antevendo o ritmo insustentavelmente acelerado desse quadro, entidades da sociedade civil da capital da Colômbia criaram, há 10 anos, um movimento com o objetivo de melhorar a qualidade de vida da população por meio da participação democrática. O Bogotá como vamos foi um dos responsáveis pela transformação da maior cidade colombiana de símbolo do caos para uma das 10 melhores cidades para viver da América Latina, inspirando a criação de movimentos similares no mundo inteiro. O pioneiro no Brasil foi o Nossa São Paulo, outra cidade, na capital paulista. “As mudanças têm que vir da sociedade civil, pois a maioria das pessoas do mundo político se beneficia do sistema que está aí”, diz Oded Grajew, idealizador e integrante do movimento e presidente do Conselho Deliberativo do Instituto Ethos.

Em Belo Horizonte, representantes de ONGs, fundações empresariais, empresas, universidades e conselhos profissionais, totalizando mais de 10 instituições, já realizaram dois encontros para a criação de movimento semelhante. No último, promovido dia 4 na Sala Juvenal Dias, no Palácio das Artes, novas instituições foram agregadas e os participantes se dividiram em grupos de trabalhos, além de discutir um nome para o conjunto de ações. “Queremos ter um movimento aglutinador, com um caráter plural”, diz o professor do mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local da Una, professor da graduação da PUC Minas e um dos integrantes Armindo Teodósio. Por enquanto, já participam do movimento representantes da Fundação Avina,  Centro Mineiro de Aliança Intersetoriais (Cemais), Instituto Creditar, Fiocruz, Fundação ArcelorMittal, Instituto de Desenvolvimento Humano Sustentável (IDHS), PUC Minas, Centro Universitário Una, Instituto Hartman Regueira, Instituto Horizontes, Oficina de Imagens, Rede Cidadã, Fiemg, CDL-BH, Samarco e Tim.

ATUAÇÃO

Movimentos sociais que buscam a governabilidade democrática e estado de direito têm particularidades de acordo com a cidade onde se originam, mas alguns elementos em comum são significativos. Um deles é o levantamento e monitoramento constante de indicadores sociais objetivos que podem ser confrontados com as pesquisas de percepção feitas com os moradores. “Cada cidade tem seus indicadores próprios. Indicadores minimizam a manipulação por interesses privados ou coletivos. A idéia é produzir conhecimento formal e informal para abrirmos o debate”, afirma Teodósio, lembrando que outra importante característica é o engajamento de diversos atores sociais e a atuação junto às administrações públicas.

 “Não é um movimento que desconstrói os poderes constituídos. Temos que estabelecer um novo diálogo com a política”, diz o professor. Tal atuação, porém, não significa partidarismo. Todos os movimentos se declaram apartidários, apesar do lançamento de parte deles, incluindo o de Belo Horizonte, coincidir com o ano de eleições municipais. “O ano eleitoral nos prejudica, pois alguns grupos podem olhar com receio. Mas existe uma efervescência na América Latina e não podemos perder o momento. Além disso, precisamos iniciar o diálogo com o prefeito e os vereadores eleitos logo no início da gestão”, acrescenta.

EMPRESAS

Com nome provisório “BH mais justa e sustentável”, a iniciativa atribui papel especial às empresas. Quase sempre vistas como patrocinadoras de ações, aqui são convidadas a participarem efetivamente do debate sobre a cidade, como importantes atores da sociedade civil. “O convite feito à Fiemg foi de participação social. Temos o objetivo de envolver a indústria neste repensar a cidade”, diz a coordenadora do Núcleo de Responsabilidade Social da Fiemg, Marisa Seoane Resende. “Estamos nos colocando como um parceiro social”, reforça a coordenadora técnica da área de sustentabilidade da Samarco, Rosângela Ferreira, lembrando que a mineradora “já tem um protagonismo nesse tipo de rede, de alianças intersetoriais, nas cidades onde atua”.

Além de compor o debate social, outra importante contribuição das empresas é no plano da gestão. “As empresas podem contribuir com os movimentos sociais, pois elas têm facilidade com essas ferramentas de gestão que o terceiro setor muitas vezes tem dificuldades para trabalhar”, diz Ferreira. “Os empresários entendem a linguagem desse tipo de movimento porque dá uma ênfase na gestão pública”, completa Grajew. O movimento de Belo Horizonte será lançado no dia 11 de dezembro, véspera do aniversário da cidade, como um presente para o município. O próximo encontro do grupo será em 10 de setembro, das 9h às 13h, no Centro Universitário Una (Rua Aimorés, 1.451, Lourdes), com participação é aberta a todas as pessoas (físicas e jurídicas) interessadas. Informações pelo e-mail info.brasilsudestedf@avina.net

Cidades em rede

Criado em maio de 2007, o movimento “Nossa São Paulo, outra cidade” já apresenta os primeiros resultados e serve de exemplo para movimentos semelhantes que surgem em outras cidades do país. No Rio de Janeiro (“Rio como vamos”), Ilha Bela (“Nossa ilha mais bela”), Teresópolis (“Nossa Teresópolis”), dentre outras, eles já estão estruturados, enquanto que em Belo Horizonte, Belém, Recife, Brasília e Goiânia, estão em fase de criação. A efervescência é tanta, que em 8 de julho, durante a primeira reunião inicial do movimento em BH, no Museu Histórico Abílio Barreto, foi lançada a Rede Social Brasileira por Cidades Justas e Sustentáveis. “A Rede é para troca de idéias, experiências e discutir possíveis ações em comum”, diz o idealizador e integrante do “Nossa São Paulo” e presidente do Conselho Deliberativo do Instituto Ethos, Oded Grajew, presente na ocasião, junto com assessor estratégico da Fundação Avina, Bernardo Toro.

A principal vitória do “Nossa São Paulo” foi, segundo seu mentor, a aprovação na Câmara Municipal de proposta para alterar a Lei Orgânica do Município. A emenda obriga o prefeito, sob pena de perda do mandato, a apresentar, 90 dias após sua posse, programa detalhado de governo, incluindo as ações estratégicas, indicadores e metas quantitativas. Além disso, terá que divulgar semestralmente os indicadores de desempenho relativos à execução do programa. O movimento também está atuando de forma significativa no processo eleitoral municipal. O site do movimento www.nossasaopaulo.org.br traz informações úteis para os eleitores, como o programa de governo dos candidatos, e destaca o aviso “Comunicado aos candidatos: não autorizamos o uso eleitoral do nome e do logotipo do Movimento Nossa São Paulo”. “Acredito que o debate político na cidade está se modificando e nossas propostas estão sendo adotadas por vários candidatos”, completa Grajew.

 

 

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