Sem diretrizes claras, o plano do governo federal consiste em um amontoado de citações a programas já em andamento como o Próalcool e o de eficiência energética com a troca de geladeiras antigas. O CFC retoma o papel de vilão em lugar do desmatamento, responsável por 75% das emissões brasileiras de carbono.
Debaixo de críticas da sociedade civil, os ministros do Meio Ambiente e da Ciência e Tecnologia, Carlos Minc e Sergio Rezende, apresentaram nesta quinta-feira (25/9) o Plano Nacional de Mudanças Climáticas. Com processo participativo “caótico” e pouco conteúdo deliberativo, as 150 páginas do plano mostram a irresponsabilidade do governo em relação ao tema. Não há diretrizes claras para a redução das emissões brasileiras e resume-se a um arrazoado de citações ao outros programas em andamento como o Proálcool e o programa de eficiência energética com a troca de geladeiras antigas. O CFC volta a ser o vilão do meio ambiente, não mais o desmatamento brasileiro que gera 75% das emissões do País.
Para o físico nuclear e professor José Goldenberg o plano não deveria ter sido apresentado. "Não vejo utilidade em levá-lo à Comissão Interministerial onde poderá ser usado para legitimar as atuais políticas que o Governo Federal tem conduzido e que me parecem insuficientes para enfrentar a gravidade do problema das mudanças climáticas tanto no País como no mundo", escreveu ele em carta ao secretário-executivo do Fórum Brasileiro de Mudanças Climáticas, Luiz Pinguelli Rosa. Em entrevista à Folha de São Paulo, Pinguelli declarou ter sugerido ao governo refazer o plano. "Não existe ainda um plano. Há matéria-prima boa para um plano, mas como dar a redação final é o problema", disse ao jornal.
O plano não diz, por exemplo, a quantidade de emissões carbono que será evitada caso seja implementado e também não menciona fundos para contenção de desmatamento, embora o governo da Noruega tenha anunciado há duas semanas a doação de recursos para o Fundo Amazônia. Carlos Minc lembrou o valor do apoio prometido durante a entrevista coletiva de ontem: “São um bilhão de dólares para evitar o desmatamento que o governo brasileiro vai receber e será usado no plano”. A declaração do ministro aumenta a polêmica, já que a utilização dos recursos do Fundo ainda será definida a partir de um Comitê Orientador que contará com a participação de diferentes segmentos da sociedade.
No capítulo sobre a energia limpa, o plano cita as hidrelétricas na Amazônia que ainda estão em fase de estudo de viabilidade como exemplos de emissão baixa de carbono que poderiam gerar ainda créditos nos Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (MDL) . “Atualmente estão sendo inventariadas as bacias dos rios Aripuanã, Trombetas, Juruena, Araguaia, Sucunduri, Branco, Itacaiunas, Jarí, Jatapu e Tapajós, em um total de 32.950 MW.”, diz o plano na página 35. Não há menção aos processos judiciais em andamento questionando a viabilidade de algumas dessas usinas com a do Juruena no Mato Grosso. Sua realização é dada como certa.
Sobre a energia eólica o documento é ainda mais genérico. “Na linha de se buscar a diversificação da matriz energética, pela valorização de soluções de cunho regional, tendo em vista os aspectos socioambientais, técnicos e econômicos, o Ministério das Minas e Energia também estuda a realização, ainda no primeiro semestre de 2009, de um leilão específico para a fonte eólica”.
A energia nuclear, desconsiderada pela gestão anterior do Ministério do Meio Ambiente, também aparece como solução energética limpa com mais informações específicas do que a energia eólica, mas com plano de uso não menos genérico. “Alguns setores entendem que, neste cenário a energia nuclear toma um importante papel no plano de expansão de energia elétrica brasileiro, e os citados estudos de planejamento indicam um crescimento do parque nuclear instalado de 2.007 MW para 3.087 MW em 2013, com a entrada de Angra III, já licenciada, e uma perspectiva de entrada de mais 4.000 MW a 8.000 MW até 2030”, diz o plano na página 39.
O coordenador da Iniciativa Mudanças Climáticas do ISA, Márcio Santilli, avalia que o plano só tangencia a questão dos impactos da mudança climática sobre o país e a população. "Precisamos identificar áreas críticas, populações sob maior grau de risco e construir agendas que permitam evitar o que for possível e proteger em relação ao que for inevitável".
"Praticamente todos os 174 itens são genéricos e se limitam a exortação e não vejo realmente como este documento pode ser muito útil ao Comitê Interministerial sobre Mudanças do Clima para a fixação de políticas”, conclui Goldenberg na carta que enviou a Pinguelli Rosa. Para Rubens Born, do Instituto Vitae Civilis, que integra o Grupo de Trabalho de Clima do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais (Fboms), o plano deveria representar a responsabilidade do país nas emissões mundiais de carbono e traçar métodos objetivos para acabar com o desmatamento. O Fboms divulgou nota a respeito, ontem (25/9).