Maria Amabile Mansutti, do Cenpec; Samantha F.S. Neves, do GT Educação; Vera Masagão Ribeiro, da Ação Educativa
Este texto reúne algumas questões e considerações iniciais sobre a proposta orçamentária do Executivo para 2009; não se trata de uma análise aprofundada, feita por pesquisadores da área de financiamento da educação, mas sim de uma discussão inicial, para que mais organizações e movimentos aventurem-se a debater o orçamento municipal, peça-chave para a efetivação de políticas públicas em nossa cidade.
Uma primeira questão diz respeito à destinação de recursos para a Educação Infantil. As despesas realizadas no primeiro semestre de 2008 com a Educação Infantil, conforme os dados do Tribunal de Contas do Município, são os seguintes: R$288 milhões foram destinados aos convênios para a operação e manutenção das creches, R$232 milhões para a operação e manutenção das EMEIs e R$165 milhões para a operação e manutenção das CEIs (creches diretas). Por outro lado, na proposta do Executivo para o orçamento de 2009, a Secretaria Municipal de Educação (SME) propõe cerca de R$ 620 milhões para operação, manutenção, construção e reformas das creches e escolas de Educação Infantil públicas (as EMEIs e as chamadas creches diretas), e cerca de 460 milhões para as creches conveniadas (operação, manutenção e ampliação).
Cabem aqui algumas ponderações sobre a previsão de recursos por modalidade de ensino:
Estimativas realizadas com base apenas na População Economicamente Ativa (PEA) indicam que mais de um milhão de paulistanos entre 15 e 59 anos não têm o ensino fundamental completo. Para atender a essa demanda seria preciso um esforço considerável de ampliação de matrículas da modalidade EJA. No entanto, o que se verifica, segundo o Inep, é uma queda de matrículas na modalidade a partir de 2004.
Quanto à educação profissionalizante, embora esta seja uma modalidade oferecida prioritariamente pelo Governo do Estado (FATECs e ETECs) e pelo Governo Federal (CEFETs), é preciso ponderar que um município com um orçamento de Educação das dimensões de São Paulo (previsão de cerca de R$5 bilhões para 2009), tem condições de destinar mais recursos para a educação profissional, o que poderia ser feito preferencialmente na modalidade EJA, cujo atendimento é dominantemente municipal.
Outro aspecto a ser discutido diz respeito à destinação de recursos a programas e projetos destinados a melhorar aspectos qualitativos da educação no município, como o desempenho dos alunos quanto à leitura e escrita e os materiais e publicações utilizados pelos profissionais da educação. Para o “Programa Ler e Escrever” estão previstos R$15 milhões; para “publicações de interesse do município”, R$4 milhões; para “apoio didático-pedagógico educacional”, R$14 milhões; para a “avaliação do aproveitamento escolar dos alunos da rede municipal”, R$8 milhões, e para “aquisição de materiais, equipamentos e serviços de informática e comunicação”, R$63 milhões. Porém, como dado de comparação, estão previstos 201 milhões para o Programa Leve Leite.
Quanto ao Plano Municipal de Educação – cujo processo de formulação tem se dado conjuntamente entre a sociedade civil e o poder público desde agosto deste ano, em comissões que estão buscando construir um processo efetivamente amplo e democrático, com discussão nas escolas e comunidades da cidade – não há previsão orçamentária nesta proposta que foi encaminhada pelo Executivo.
Por fim, cabe a seguinte ponderação: para garantir a ampliação de recursos que reivindicamos, uma possibilidade importante seria a redução dos gastos com Administração¹: os gastos com suporte administrativo, administração de SME e administração da Diretoria Regional somam R$580 milhões de reais na proposta orçamentária de 2009 – 10% do orçamento total da educação, que é de cerca de 5 bilhões. O pesquisador Marcos Bassi, em artigo ainda não divulgado, percebeu que no período 1995-2006 as despesas realizadas com o ensino fundamental foram cedendo lugar para as administrativas e que o percentual de despesas com a educação infantil (creche e pré-escola) pouco se alterou no mesmo período.
Debate sobre orçamento deve considerar percentual fixo para educação
Quando discutimos o orçamento no município de São Paulo, é importante retomarmos ainda os debates sobre a vinculação de 30% do orçamento para manutenção e desenvolvimento do ensino (MDE)². Essa discussão não se dá no âmbito da votação do orçamento, pois a redução dos recursos para MDE se definiu quando a Lei Orgânica do Município foi alterada em 2001: desde 1992, o município de São Paulo havia estabelecido um mínimo de 30% do orçamento municipal com MDE. Em 2001, houve uma redução desse percentual para 25%, e o montante para toda a educação foi fixado em um mínimo de 31% do orçamento da pasta, mas com uma concepção de educação inclusiva (programas Bolsa-Escola e Bolsa-Trabalho, telecentros e alimentação escolar – além do MOVA e dos CEUS, despesas que poderiam ser mais facilmente entendidas como educacionais).
Os dados do Tribunal de Contas do Município mostram que nos últimos três anos, cerca de 10% dos gastos com educação foram destinados à assistência social, cultura, transportes. Por outro lado, Marcos Bassi percebeu que o aumento significativo das receitas de impostos no município no período 1995-2006 fez com que as despesas com Educação (todas, não apenas as relativas a MDE) quase dobrassem no período. Porém, as despesas com MDE tiveram um aumento muito menos expressivo. (ex: em 2007, as despesas com MDE foram de quase R$3 bilhões, enquanto as despesas totais da Educação foram de cerca de R$4,5 bilhões). Não se trata aqui de questionar os programas em si, ou a sua relevância no contexto de profundas desigualdades em nossa cidade e de pouca destinação de recursos a áreas fundamentais, como a cultura, por exemplo.
No entanto, é importante ponderar que, com essa mudança, os recursos para manutenção e desenvolvimento do ensino não tiveram uma ampliação proporcional à ampliação das receitas como um todo. Isso é especialmente grave se considerarmos que houve nesse período uma gradativa ampliação do atendimento educacional às crianças de 0 a 3 anos e de 4 a 6 anos, mas ainda insuficiente, principalmente na faixa de 0 a 3 anos (14,5% das crianças deste segmento da população em 2006 ficaram sem vaga – dados do Seade e Censos Escolares, sistematizados pelo Tribunal de Contas do Município).
Fontes:
BASSI, Marcos Edgar. O financiamento da educação na Prefeitura do Município de São Paulo: uma análise exploratória de suas fontes e aplicações (1995-2006). São Paulo, Ação Educativa, 2008. (Texto será divulgado no site da Ação Educativa em breve).
DIÁRIO OFICIAL DO MUNICÍPIO. Projeto de Lei 01-0605/2008. 15 de outubro de 2008.
TRIBUNAL DE CONTAS DO MUNICÍPIO. Dados apresentados por Luiz Camargo, em 17/10/2008.
¹ Importante destacar que nesta rubrica, “Administração Geral”, não estão incluídas as despesas com remuneração das/os profissionais, que estão distribuídas nos diferentes níveis de ensino.
² Manutenção e desenvolvimento do ensino: construção e manutenção de unidades educacionais; remuneração das/os profissionais da educação.