Daniela Chiaretti, de São Paulo
A cidade de São Paulo gasta, por ano, US$ 208 milhões com os efeitos da poluição atmosférica. A
estimativa considera apenas os custos diretos que a cidade tem com as doenças e mortes causadas pelo coquetel de gases que os paulistanos inalam toda vez que enchem os pulmões. Em dias em que há paralisação do metrô e consequente aumento na concentração de poluentes, ocorrem nove mortes a mais do que nos dias pós-greve. Quem vive em cidades poluídas como esta tem a vida abreviada em 2,5 anos.
Uma série de exemplos assim, bem pouco animadores, foram citados ontem durante o seminário
"Poluição atmosférica e seus efeitos sobre a saúde humana – o estado atual do conhecimento
científico" organizado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). "O
pior argumento que se pode ouvir é que a poluição do ar não tem efeito na saúde", diz o professor Paulo Saldiva, do departamento de patologia da FMUSP. "Equivale a dizer que a Terra é plana", prosseguiu Saldiva, um especialista no assunto. "Poluição faz mal e todo mundo sofre. Sofre mais quem já é doente ou mais carente e o custo de não se fazer nada a respeito é bastante grande."
Dez pesquisadores apresentaram seus estudos sobre os efeitos do ozônio, dióxido de enxofre,
monóxido de carbono ou material particulado na saúde das pessoas. Foi um festival de horrores.
Estudos recentes apontam que 5% das internações por doenças respiratórias de crianças e 8%
nas de adultos ocorrem em função da poluição do ar. O aumento nas concentrações de CO
(monóxido de carbono), SO2 (dióxido de enxofre) e PM10 (material particulado) representou um
crescimento na mortalidade por doenças respiratórias de 15%, 13% e 7% respectivamente, citou o
professor Luiz Alberto Amador Pereira, da Universidade Católica de Santos.
Bebês e crianças até 2 anos são mais suscetíveis aos dias mais poluídos assim como alguns
adolescentes – "o que se explique, talvez, pelas alterações hormonais", sugeriu o professor. Só em 2008, pesquisadores do mundo todo já publicaram mais de 100 estudos sobre os efeitos dos
poluentes em crianças. Está comprovado que ocorrem mais casos de crises de asma, declínio na
função pulmonar, baixo peso ao nascer e abortos. Experimentos com ratos mostraram que os
animais que respiram o mesmo ar dos paulistanos registram mais casos de infertilidade que ratos
colocados em câmaras com ar filtrado. "Estamos falando da poluição da esquina", salientou
Saldiva, lembrando que as câmaras foram colocadas no jardim da Faculdade de Medicina, entre a
avenida Doutor Arnaldo e a rua Teodoro Sampaio.
O seminário ocorreu a dois meses do prazo para que entre em vigor a resolução 315/2002 do
Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), que determina a distribuição de diesel com
menos enxofre a partir de 1º de janeiro de 2009. Atualmente o diesel vendido na cidade tem 500
partes por milhão de enxofre e a partir de janeiro tem que ter 50 ppm. O prazo para que se
cumpra a resolução transformou-se em polêmica opondo, de um lado, a Petrobras, a Agência
Nacional do Petróleo (ANP) e as montadoras, alegando que não conseguirão se adequar a tempo,
e do outro, ONGs, técnicos, médicos e o governo municipal.
A campanha pelo diesel mais limpo ganhou a opinião pública. "A questão hoje está na Justiça",
lembrou o secretário municipal do Verde e do Meio Ambiente Eduardo Jorge. "Agora estamos
vendo um jogo de empurra entre os atores", prosseguiu. "Não há justificativa para o silêncio do
sistema de saúde municipal, estadual e federal sobre o impacto da poluição na mortalidade e
morbidade da população", disse Jorge. "A resolução está valendo em São Paulo e quem não a
cumprir vai se entender com a Justiça. Nós vamos atuar de acordo com a lei de crimes
ambientais."
Representantes da Petrobras e da Anfavea, a associação que reúne os fabricantes de veículos, eram aguardados no seminário, mas ninguém apareceu.
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