Em parceria com a USP, projeto de revitalização de prédio no Bom Retiro, em SP, vence prêmio da Urban Age
Bruno Paes Manso
A história do cortiço da Rua Solon, no bairro central do Bom Retiro, em São Paulo, está dividida em duas. A primeira fase durou cerca de 20 anos, desde que o prédio de oito andares foi abandonado pelos construtores nos anos 1970 e depois negociado informalmente pelo zelador para os sem-teto que buscavam moradia na região central. Nas décadas seguintes, cerca de 72 famílias viveram precariamente em apartamentos mal acabados, com rede elétrica improvisada sob o risco permanente de incêndio e de despejo.
A segunda fase começou em 2002. Professora de Habitação Popular na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, Maria Ruth Amaral de Sampaio consultou os moradores do cortiço para levar um grupo de alunos para estudar as condições da moradia no local e, assim, complementar o currículo.
Da troca de experiências entre estudantes, professores e moradores, iniciou-se um relacionamento que impulsionou o movimento de melhoraria na estrutura física do prédio e na situação jurídica dos habitantes, cujos problemas vêm sendo resolvido aos poucos.
Nessa segunda fase, o cortiço da Rua Solon virou Edifício União, nome registrado em uma plaquinha prateada na nova fachada central, que ganhou reboque e tinta cor de laranja.
Na tarde de ontem, o projeto foi escolhido entre os 133 concorrentes inscritos para ganhar o Deutsche Bank Urban Age Award São Paulo 2008 no valor de US$ 100 mil. Outros três projetos ganharam menção honrosa e um prêmio de US$ 5 mil. São eles o Instituto Acaia, na Vila Leopoldina, a Cooperativa de Reciclagem Nova Esperança, no Jardim Pantanal, e BioUrban, na Favela Mauro. A premiação é organizada paralelamente à Conferência Internacional Urban Age, que ocorre hoje e amanhã em São Paulo. “A vitalidade e a criatividade da sociedade civil em São Paulo são algo espantoso. Nunca vi algo parecido no mundo”, diz o urbanista da London School of Economic Ryck Burdett, que presidiu o júri.
Transportador de carga e frete, Francisco Bezerra, de 41 anos, se mudou para o cortiço da Rua Solon em 1991, onde foi morar com a mulher e três filhos.
Temendo perder o apartamento na Justiça e em incêndios, nunca investiu na decoração. Ganhou coragem, assim como outros moradores, depois de ver avançar a ação de usucapião coletivo e a instalação da rede elétrica. Colocou piso frio na sala, comprou televisão e aparelho de som, fez compensados para dividir os cômodos, operando milagre no pequeno espaço de 31 metros quadrados. “Acho que conseguimos mudar de status”, diz.
Para a professora Maria Ruth, a mudança na forma como os moradores passaram a se enxergar e a se relacionar com a cidade foi um dos efeitos mais impressionantes do projeto. Com o dinheiro, o grupo pretende investir nas fachadas e fazer rede de água e esgoto. “Além de virar referência para enfrentar o problema dos cortiços verticais no centro, mostramos como a sociedade ganha quando a universidade sai da sala de aula”, diz.
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