Entrevista – José Eduardo de Assis Lefèvre: presidente do Conpresp; Walter Pires: diretor do DPH; para responsáveis por tombamentos, não há estrutura que consiga dar conta da complexidade patrimonial de São Paulo
Rodrigo Brancatelli e Vitor Hugo Brandalise
A matemática tem sido cruel com o Conpresp. Ao mesmo tempo em que há 1.813 imóveis tombados ou em processo de tombamento – além de um sem-número de edificações espalhadas por aí que tem algum tipo de valor histórico para a cidade -, o órgão conta apenas com uma estrutura diminuta de nove conselheiros, uma secretária, duas ajudantes, um contínuo e uma assistente técnica. É pouco, muito pouco, para gerenciar quase 455 anos de construções, modificações e, claro, destruições no patrimônio paulistano.
Mesmo os fiscais das subprefeituras, que teoricamente seriam responsáveis pela fiscalização, não ajudam muito na conta – nenhum deles tem conhecimento técnico sobre o assunto para fazer análises dos imóveis. Para os arquitetos Walter Pires, diretor do Departamento de Patrimônio Histórico (DPH), e José Eduardo de Assis Lefèvre, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP e presidente do Conpresp, a única maneira de inverter esse quadro é pensar em grandes planos de gestão urbana, investindo na educação dos proprietários e criando incentivos para que a iniciativa privada revitalize as áreas degradadas.
Por que há tantos imóveis tombados destruídos?
Walter Pires – As questões levantadas pela reportagem são pertinentes, mas chama a atenção um número tão alto. Seguramente temos problemas nos edifícios tombados, mas sabemos também do esforço que é feito por muitos proprietários para recuperá-los. Há uma questão que envolve o crescimento do quadro de imóveis que precisam ser protegidos e a falta de uma estrutura pública, administrativa, jurídica e técnica para dar conta de todos os processos. A resolução que tombou o Centro Novo, por exemplo, englobou quase 250 imóveis diferentes. Então, de um dia para o outro, a gente passou a ter de gerenciar todos esses endereços. Se você multiplica isso por 50 moradores em cada prédio, temos no mínimo 12 mil contribuintes para informar. Para você ter uma ideia, recebemos mensalmente cerca de mil expedientes com solicitações dos moradores, desde pedidos de reforma e demolição até proposta de abertura de linhas expressas em terrenos tombados. Não há estrutura pública que consiga dar conta sozinha de toda essa complexidade.
José Eduardo Lefèvre – O Conpresp tem uma estrutura modesta: são nove conselheiros, uma secretária, duas ajudantes, um contínuo e uma assistente técnica.
Pires – Temos muitas situações peculiares, de difícil controle. Como as vilas operárias, como a Maria Zélia ou a Economizadora. O que estamos tentando fazer é formular uma política de preservação para que o diálogo sobre o patrimônio seja ampliado com a sociedade. Precisamos afinar o diálogo com o proprietário, para manter contato e mostrar a importância da preservação.
E o que está sendo feito para estreitar essa relação?
Pires – Agora, no carnê de pagamento do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), vem a informação de que o imóvel é tombado. É o primeiro passo para nos aproximarmos dos proprietários, virar parceiro deles, até para mostrar que a lei não é uma ameaça. Mas precisamos também de medidas que são muito mais amplas do que o Conpresp consegue fazer, que são planos de gestão urbana. A cidade precisa de mecanismos para recuperar as áreas e incentivar o uso e a ocupação dos imóveis degradados.
Afinar o discurso com a iniciativa privada pode ser uma medida eficiente para manter o patrimônio bem cuidado e tirar do papel esses planos de gestão urbana?
Lefèvre – Claro. Reformar um bem tombado e tornar aquilo útil para a cidade agrega valor, enaltece a imagem da empresa que está ali estabelecida. É necessário antes de tudo ter planos grandes, pensar alto, e para isso precisamos da contribuição da iniciativa privada. Como, por exemplo, no projeto da Nova Luz. O problema é que a agilidade das empresas privadas é muito diferente da burocracia da Prefeitura. O poder público tem muitas limitações e restrições. E isso amarra todo o processo de revitalização das áreas. É preciso ter uma sintonia maior entre as duas instâncias, ter uma mentalidade única para o bem da própria cidade.
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