“Para ciclistas, prefeitura de São Paulo não trata bicicleta como meio de transporte” – Último Segundo

 

SÃO PAULO – A morte da ciclista Márcia Regina de Andrade Prado, na quarta-feira, reascendeu o debate sobre as condições de quem utiliza bicicleta na cidade de São Paulo. A resposta recorrente se concentra nas questões das ciclovias, mas William Cruz, que assinou com Márcia um manifesto dos ciclistas (“Manifesto dos invisíveis”), destaca: “ciclovia não é uma solução milagrosa”.

"As ciclovias são úteis, sim. São importantes, claro! Mas estão longe de serem a solução definitiva", diz Cruz. Ele conta que o manifesto surgiu diante da indignação ao ouvir que as bicicletas só serão viáveis quando houver ciclovias suficientes. “Quanto é suficiente?”, pergunta, em seu blog “Vá de Bike".

Das iniciativas recentes da Prefeitura, há uma lei, assinada em fevereiro de 2007, que prevê a criação do “Sistema Cicloviário de São Paulo” e classifica a bicicleta oficialmente como meio de transporte.

Pela lei, devem ser criadas ciclofaixas e ciclovias, serem definidos locais específicos para estacionamento das bicicletas, que têm de ser integradas ao sistema de transporte. Além disso, devem ser criados terminais de transporte coletivo e infraestrutura apropriada para guardar as bicicletas.

Outro assinante do manifesto, o ciclista André Pasqualini, que também conhecia Márcia questiona a lei. “A prefeitura não trata a bicicleta como meio de transporte. Precisa sinalizar as vias, investir em projetos para diminuir o número de acidentes, mas não faz nada. Principalmente a CET”, afirma. “A CET tem 4800 funcionários para cuidar do deslocamento dos carros e apenas três cuidam de bicicletas e pedestres”.

Cruz ainda acrescenta que “ciclovias que sirvam para proteger o ciclista do fluxo de carros são realmente úteis”, como no caso da Radial Leste. Nestas avenidas, o tráfego de carros ou está muito rápido ou não oferece espaço aos ciclistas, que não têm como competir com motos.

Porém, a ciclovia pode ser uma decepção nos casos em que são usadas “para que as bicicletas não atrapalhem os carros”, conclui. Na avenida Sumaré, por exemplo, ela é interrompida a cada cruzamento, onde a prioridade é dos carros, conta o ciclista. Além disto, “é um roteiro ‘a passeio’, não sendo rota de ciclistas que utilizam a bicicleta como meio de locomoção”, diz, acrescentando que “o melhor é a integração da bicicleta ao fluxo viário”.

Ele defende que as vias sejam melhor sinalizadas, o motorista respeite o ciclista e até mesmo sejam construídas ciclofaixas, semelhantes às faixas de moto, que existem na cidade.

O jornalista Frederico Marques, por exemplo, usa a bicicleta como principal meio de transporte para chegar ao trabalho. Apesar de gostar de trafegar pelas ciclovias, Marques conta que enfrenta dificuldade em partes de seu trajeto. “No meu caminho só a Faria Lima tem ciclovia, mas existe uma interrupção, na altura do shopping Iguatemi, que joga o ciclista para a calçada”, diz. Quando chega a sua empresa, existe a estrutura necessária. Ele tem um vestiário para se trocar e deixa a “bike” na garagem.

Procurada pelo Último Segundo, a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente informou que, em 2006, foi criado um "grupo intersecretarial responsável por pensar o uso da bicicleta como meio de transporte e transformar isso em política pública".

Ainda de acordo com a secretaria, alguns dos frutos disto foram a possibilidade da entrada de bicicletas em vagões de Metrô em alguns horários e de as deixar em segurança estacionadas nas estações de Metrô. Além disto, destacou os planos de construção de novas ciclovias.

Perguntada sobre a conscientização dos motoristas, a Secretaria diz estar confeccionando cartilhas educativas.

Conscientização

Pasqualini também defende uma maior responsabilização do motorista pelos seus atos. Ele fez um trabalho de mapeamento de todas as mortes de ciclistas registradas pela Companhia de Engenharia de Tráfego em 2006.

Pasqualini, em parceria com a SPTrans, tem um projeto de conscientizar motoristas de ônibus de que pode haver uma convivência pacífica com os ciclistas. “Muitos deles sofrem do sentimento de que a gente não pode andar na via, mas o trabalho deles pode custar a vida de alguém”, diz. “Vou falar da visão do ciclista, de como ele se movimenta na cidade”.

Já que são 60 mil motoristas e cobradores, o projeto é que cada garagem tenha um multiplicador, para que este possa conversar com os outros.

Outra crítica no quesito “conscientização” que Pasqualini cita é a formação do condutor no Brasil. “Tem que haver conscientização e punição”, diz. “O ato de dirigir é tratato com banalidade”.

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