Disponível, mas acessível?


 
Entidades de apoio a deficientes reivindicam acessibilidade a sites no Brasil

Por Bruna Escaleira*

Na era da internet, a grande democratizadora da informação, o mundo parece estar ao alcance de um clique – sensação que se intensificou quando o governo passou a disponibilizar diversos serviços na rede. No entanto, nem todos conseguem acessá-los. Embora exista tecnologia que permite o acesso de deficientes visuais e auditivos a páginas on-line, seu uso na produção dos sites brasileiros ainda é muito insuficiente.

Diante disso, representantes da organização Acessibilidade Brasil, da Associação Paraense das Pessoas com Deficiência (APPD), da empresa pública Processamento de Dados do Estado do Pará (Prodepa) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Pará (Fapespa), reunidos no Fórum Social Mundial 2009, em Belém, decidiram redigir uma carta à Câmara dos Deputados exigindo uma sessão extraordinária que discuta e estabeleça metas para a plena implementação das normas de acessibilidade nos sites do país.

As entidades lutam pela disseminação da consciência de que, ao produzir um portal on-line, é preciso utilizar cores e contrastes que não sejam confundidas por daltônicos, dispositivos que permitam a reprodução das palavras em áudio para cegos, bem como marcações de localização em cada página dentro do domínio, por exemplo. São pequenos detalhes que fazem toda diferença para milhões de brasileiros, e implementá-los não é mais segredo.

Há sete anos, a ONG Acessibilidade Brasil vem criando e disponibilizando ao público softwares e outros mecanismos digitais inovadores para o atendimento dessa demanda. No site www.acessobrasil.org.br, é possível acessar o Correio Braille, que permite o envio de cartas para deficientes visuais de todo território nacional; o Dicionário de Libras para surdos e o Avalidor e Simulador para AcessibilidadE de Sítios (Ases), que pode ser utilizado por produtores de sites para identificar os critérios de acessibilidade não atendidos em suas páginas e como atendê-los.

Além disso, o presidente da ONG, Guilherme Lira, apresentou novos projetos do grupo como o Dirce – Leitor Daisy (Digital Acessible Information System), que possibilitará a narração de livros para pessoas cegas com marcação de páginas e ficará pronto por volta de junho; o Gerador de gráficos táteis, que aprimorará traços de imagens impressas para cegos possibilitando a leitura de gráficos e mapas; Interfaces acessíveis para o projeto Soluções de Telecomunicações para Inclusão Digital (STID), que possibilitará a marcação de consultas médicas on-line; e o Tradutor de Libras On-line, que será desenvolvido com a tecnologia UNL – Universal Network Language da ONU.

A maior parte desses projetos é realizada em parceria com entidades de apoio às pessoas com deficiências ou com o governo, que concedeu à Acessibilidade Brasil o Prêmio de Tecnologia da Informação 2008 pela criação do Ases. No entanto, em alguns casos, a ONG ainda encontra dificuldades para a implementação de suas idéias, mas não desiste: “durante 5 anos, tentamos fazer um acordo com o correio brasileiro para facilitar o envio de cartas em Braille, e não conseguimos. Então, disponibilizamos o ‘Correio Braille’ em nosso próprio site; imprimimos as cartas dos usuários em nossa sede e as mandamos aos correios, mas queremos que eles assumam essa responsabilidade”, aponta Guilherme.

Da base ao topo

Adinamar Corrêa, da empresa pública Processamento de Dados do Estado do Pará (Prodepa), também enfrenta a falta de interesse na implementação de sites acessíveis, usando sua própria força de vontade e oferecendo a produção de páginas adequadas aos critérios de acessibilidade às entidades governamentais com as quais tem contato. Para ele, as poucas melhorias efetivadas ocorrem “devido à atuação de pessoas e não de uma instituição ou governo”.

Utilizando o sistema Ases, a Prodepa lançou o primeiro site acessível em 2006. Depois de 2 anos de trabalho, apenas cerca de 20% dos sites do Governo do Pará foram transformados em acessíveis e, hoje, só 10% permanecem acessíveis devido à falta de manutenção.

“Deveria existir um curso de especialização em acessibilidade”, defende Guilherme, diante do comentário de Alexandre de Diniz da Fapespa, que teve seu site montado com a ajuda de Adinamar, e aponta as dificuldades de sua equipe para manter o portal acessível.

O problema não é só do Pará. No momento em que o governo passa a disponibilizar boa parte de seus serviços apenas via rede, muitos deles ainda não são acessíveis, como o Sistema Nacional de Convênios (Sincov). Além disso, muitos infocentros ainda não contam com instrutores pra auxiliar os deficientes a usar os computadores, nem bons equipamentos que suportem a tecnologia disponível.

No entanto, para que essa situação mude, é preciso mobilizar toda a sociedade. “Deficiente, reclame, não use os sites e outros serviços que não são acessíveis, não vejo outra forma de mudar essa situação a não ser a pressão popular”, ressalta Guilherme.

*Bruna Escaleira, Camila Souza Ramos e Tatiane Ribeiro são alunas de jornalismo da Escola de Comunicação e Artes (ECA) da USP, que fizeram reportagens sobre o Fórum Social Mundial 2009 em colaboração para alguns sites, como o portal do Movimento Nossa São Paulo. A cobertura completa feita pelas estudantes pode ser acessada no blog http://tresnoforum.wordpress.com/

Compartilhe este artigo