“Indústria reduz custos com reúso” – O Estado de S.Paulo

 

Empresas investem em reaproveitamento de água não potável, mas ainda faltam estimativas nacionais

Andrea Vialli e Lucas Frasão, especial para o Estado

SÃO PAULO – As indústrias, que por décadas reinam como as grandes poluidoras dos rios, descobriram que o reúso de água é uma oportunidade para reduzir custos.Estão tomando a dianteira nessa área da reciclagem, que pode ajudar a corrigir uma distorção registrada há anos: o uso de água potável até para limpeza de casas e empresas. Apesar disso, o Brasil ainda não tem estimativas nacionais da quantidade de esgoto tratado que ganha nova utilização.

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Um exemplo de como a água pública poderia ser mais bem utilizada é a região metropolitana de São Paulo, que recebe, em média, 70 mil litros de água por segundo. Desses, nada menos que 80% viram esgoto. Segundo o professor Ivanildo Hespanhol, diretor do Centro Internacional de Referência em Reúso de Água (Cirra), vinculado à Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), as principais estações de tratamento têm potencial para tratar 18 mil litros por segundo, mas tratam apenas 13,6 mil. O resultado dessa equação é o despejo de mais de 40 mil litros, a cada segundo, de água não tratada nos rios de São Paulo. "Os programas de aproveitamento de água de esgoto tratada são minúsculos."

A lógica do reaproveitamento

Por outro lado, a indústria partiu firme para a prática de reúso. "Muito por conta da cobrança", explica. A indústria precisa ter outorga de captação de água e de lançamento de efluentes, e a segunda é especialmente cara. Ao reaproveitar a água no processo industrial, a empresa transforma efluente em matéria-prima.

Segundo uma pesquisa recente feita pelo professor com 2.311 indústrias paulistas de médio e grande porte, o custo conjunto diário de consumo de água, sem reúso, é de cerca de R$ 1 milhão. "Sem grandes investimentos, é possível reusar aproximadamente 60% do total de água consumida em uma empresa" – ou seja, o custo total dessas 2.311 empresas cairia para cerca de R$ 400 mil por dia. Hespanhol acredita que de 20% a 30% da indústria no Brasil pratica o reúso de alguma forma.

"A água começa a ser percebida pelas empresas como um bem de extremo valor", diz Marcos Ferreira, presidente da Haztec, grupo que presta serviços de tratamento de água para grandes indústrias. Segundo ele, os fatores redução de custos e expectativa da sociedade por padrões ambientais mais rigorosos estão transformando o modo como o setor privado lida com o recurso hídrico. Mas há limites para a reutilização.

"Nem toda água que entra na indústria recircula. Há perdas no processo com vazamentos e evaporação. Mas um índice de reaproveitamento razoável é da ordem de 70% a 80%", diz.

Ferreira explica que fabricantes de alimentos e bebidas, por exemplo, enfrentam restrições legais em relação à reciclagem: a água de reúso não pode entrar como insumo. Mas o aproveitamento pode ser maior em setores que a água é menos utilizada como matéria-prima e mais empregada nos processos. A siderúrgica ArcelorMittal Tubarão, ex-CST, na região metropolitana de Vitória, apostou no aproveitamento quase integral dos recursos hídricos. Hoje, 97,4% da água que entra na planta industrial é tratada e reutilizada. Nos últimos anos foram feitos ainda investimentos para dessalinizar a água do mar, para uso industrial, o que hoje satisfaz 95% da demanda. O restante, 5%, vem da concessionária local.

Mesmo com reúso, a siderúrgica gasta R$ 24 milhões por ano com água. "Sem as iniciativas de dessalinização e reúso, o custo da água seria simplesmente proibitivo", diz Luiz Antonio Rossi, gerente de Meio Ambiente da ArcelorMittal Tubarão.

A produção de aço é intensiva em recursos hídricos, mas o consumo de água por tonelada vem caindo na companhia, graças aos investimentos em sistemas de reaproveitamento. Em 2008, foi de 3,8 metros cúbicos por tonelada de aço produzido, o que fez a fábrica da Grande Vitória figurar entre as três melhores siderúrgicas do conglomerado ArcelorMittal no mundo, no que tange à gestão da água. A média de consumo de água no setor de siderurgia é de 11,5 m³ por tonelada de aço. Na Gerdau, que também produz aço, o índice de reaproveitamento é igualmente alto: gira em torno de 97,5% da água captada. "O reúso só não é maior porque ocorrem perdas com evaporação no processo", diz Érico Sommer, gerente de Energia, Meio Ambiente e Engenharia da Gerdau. Ele explica que o reaproveitamento da água trouxe uma economia de 40% a 50% nos gastos financeiros com o insumo.


ETE No Shopping

Mas os programas de gestão da água também começam a aparecer fora da indústria. Quem passeia pelo shopping center Parque Dom Pedro, em Campinas (SP), não faz ideia de que bem perto das lojas há uma estação de tratamento de esgotos (ETE) capaz de tratar 100% dos efluentes gerados no local.

Cerca de 35% da água volta ao sistema hidráulico do shopping para abastecer descargas dos vasos sanitários e para regar plantas nos jardins. "Temos capacidade para reaproveitar até 60% da água, e o faremos conforme a demanda crescer", garante Elizabeth Morita, responsável pela área de meio ambiente da Sonae Sierra, grupo responsável pela administração do Parque Dom Pedro e de outros oito shoppings em todo o País.

O grupo aposta também em captação da água da chuva. Em 2007 foi feito um piloto no Penha Shopping Center, zona leste de São Paulo. A água da chuva captada no sistema passou a ser usada na central de ar condicionado, o que já permitiu uma redução de 18% no consumo. Agora, outros dois shoppings, Boa Vista e Plaza Sul, passarão a usar o dispositivo.

 

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