Reformar um prédio deixa de ser exercício de decoração e passa a ter obrigações com futuro do Planeta
Bruno Versolato, especial para O Estado de S.Paulo
SÃO PAULO – Até 2020, 80% dos edifícios existentes nas grandes cidades já estarão construídos. O restante estará em fase de projeto ou em obras. No entanto, a maioria deles ainda é construída ou reformada com técnicas e materiais pouco ou quase nada sustentáveis. “Construção sustentável não é apenas eficiência energética e reúso d’água. Envolve materiais de baixo impacto no ambiente, uso de madeira de reflorestamento e métodos de construção eficientes. Hoje, cerca de 20% de uma obra vai para o lixo. Em um prédio de 5 andares, 1 vira entulho”, afirma o engenheiro ambiental e professor da PUC-Rio Carlos Penna.
Segundo o World Watch Institute (WWI), arquitetos e engenheiros em todo o mundo não têm conhecimento dos materiais, desenhos e técnicas úteis para levantar prédios sustentáveis. Edifícios são responsáveis por cerca de 30% de todo o uso de energia, emissão de gases do efeito estufa e geração de dejetos. “A construção e renovação de construções é o setor com maior potencial técnico e econômico para reduzir emissões”, diz um estudo, citando o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC).
Mas, nos últimos anos, o mundo da construção civil começou a abrir os olhos para o lado sustentável de uma obra. Um exemplo é o complexo de escritórios Business Park. Há quatro anos, quem entrasse em um galpão desativado no bairro da Lapa, zona oeste de São Paulo, com a missão de transformar um colosso de concreto de 17 mil metros quadrados em um centro comercial, chamaria uma empresa de demolição e iniciaria a obra do zero. Construído na década de 1950, o local era obsoleto até mesmo para abrigar outra fábrica.
“Há menos de dez anos ninguém pensaria em usar a estrutura e construir outra coisa em cima”, afirma o arquiteto Tadasi Akeho.
Projetado e construído em 2006, o antigo galpão abriga hoje um moderno centro empresarial. “Só aproveitamos a estrutura do galpão”, conta o engenheiro Paulo Belucco. Os sanitários usam água captada da chuva e a parte elétrica foi projetada para chegar com alta voltagem na porta do cliente, para evitar superaquecimento e perdas em longos caminhos de fios com pouca espessura.
“Como aqui é uma área de várzea, cavando um metro já existe água, então é possível utilizá-la nas bacias sanitárias”, afirma Akeho. Além disso, os vidros usados na construção podem garantir iluminação adequada sem permitir que o calor entre.
“Reduzir, reaproveitar, reciclar”, repete constantemente o arquiteto Gustavo Calazans, especialista em reformas ecossustentáveis de casas e apartamentos. “Esse prédio, por exemplo”, diz ele, apontando a lapiseira com um gesto de mão para a sacada de seu escritório em Higienópolis, também na zona oeste de São Paulo, “tem 50 anos. O aço, a areia, o concreto já foram usados. Já fizeram o seu ciclo. Não há por que construir outro prédio”, diz ele. “A área dos velhos galpões aqui na zona oeste, os velhos prédios do centro, que são belíssimos, todos podem ser recuperados”, defende Belucco.
A recuperação do antigo galpão foi mais que uma obra arquitetônica. Foi uma intervenção urbanística. A área, até então industrial, tornou-se um centro de negócios e criou um eixo de desenvolvimento. “Notamos que até a vizinhança mudou”, diz Akeho.
EFICIÊNCIA ENERGÉTICA
Hoje, a eficiência energética das construções se tornou centro das discussões quando se fala em sustentabilidade desde o lançamento do pacote ambiental do governo de Barak Obama, nos Estados Unidos. Em 17 de fevereiro, Obama sancionou um plano que injeta US$ 20 bilhões para programas como o aumento da eficiência no uso de eletricidade nos prédios públicos e nas casas de famílias de baixa renda, e para tentar encontrar maneiras melhores para poupar energia. Especialistas na área concordam com ele em que a economia obtida com os investimentos em eficiência energética será maior do que o custo desses programas ao reduzir as contas de luz.
QUEBRANDO TUDO
O objetivo principal de uma reforma sustentável é tornar o prédio mais eficiente energeticamente. Mas um bom retrofit, nome técnico dado à adaptação de edifícios antigos a padrões sustentáveis, no entanto, leva em conta muito mais que isso. “Vivemos 90% do nosso tempo encaixotados”, afirma Penna. “Precisamos de ventilação natural, verde, algumas árvores, paisagem. Precisamos de conforto ambiental, se não a gente enlouquece”, conclui.
Prédio Anhangabaú ganha reforma verde
Gigante de 33 andares erguido nos anos 40 terá novo sistema de energia, água e elevadores
SÃO PAULO – Construído no final da década de 1940, o edifício CBI Esplanada, um gigante de 33 andares com lajes de 1.200 metros quadrados, vai passar por uma reforma. A atual escada de evacuação, em formato de caracol, será substituída por uma pré-moldada de metal, que permite saída mais rápida em caso de incêndio. O prédio ainda ganhará um novo sistema de detecção de fumaça.
Como o edifício precisará de uma repaginada, ele ganhará um novo sistema de energia, mais eficiente. Uma barra de cobre vai percorrer todos os andares, como em uma fábrica, e cada um dos inquilinos do edifício poderá usar a potência que desejar, sem sobrecargas. Os elevadores ganharam novas máquinas e cabines, para melhorar o consumo elétrico e suportar o fluxo de 20 mil pessoas por dia.
TERRENO ÚMIDO
Como o CBI Esplanada é tombado, as fachadas terão os aparelhos de ar-condicionado retirados, graças a um novo sistema de água fria que vai se beneficiar da tubulação de gás natural que passa sob o prédio. O solo do Anhangabaú vai contribuir para o consumo inteligente de água. A região era cortada por um rio, hoje aterrado. No entanto, o terreno continua úmido e, escavando em pouca profundidade, é possível encontrar água, que será usada nas bacias sanitárias.
Veja as matérias publicadas no caderno especial "Vida & Sustentabilidade" do jornal O Estado de S.Paulo
"Cresce o consumo verde" – O Estado de S.Paulo
"Regra complicada não tira interesse" – O Estado de S.Paulo
"Diversão a favor do ambiente" – O Estado de S.Paulo
"Conforto ambiental: mudança pode beneficiar a saúde" – O Estado de S.Paulo
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