Viver a menos de 50 m de vias de tráfego intenso aumenta em até 63% chances de ter artrite reumatoide, diz estudo
Poluentes podem agir como agressores e, se a produção de anticorpos contra eles for descontrolada, combatem células do próprio corpo
JULLIANE SILVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
Já se sabe que a poluição atmosférica pode causar problemas respiratórios e cardiovasculares. Agora, novos estudos
têm apontado que partículas
poluentes também aumentam
riscos de doenças autoimunes
-distúrbios que aparecem
quando as células de defesa
agem contra o organismo.
Um estudo recente da Escola
de Saúde Pública de Harvard
observou que a exposição a poluentes de rodovias eleva a incidência de artrite reumatoide.
Os pesquisadores usaram dados do Nurses" Health Study,
um estudo com 200 mil enfermeiras, que teve início em 1976
e levanta dados sobre a saúde e
a incidência de doenças nas
participantes.
Para esse trabalho, foram
consideradas informações de
90.297 mulheres. Após avaliar
as informações, constatou-se
que viver a menos de 50 metros
de vias de tráfego intenso aumentou de 31% a 63% as chances de as mulheres desenvolverem artrite reumatoide.
Foram excluídas variáveis
como tabagismo, uso de hormônios, índice de massa corporal e sedentarismo.
A artrite reumatoide desencadeia inflamações nas articulações, principalmente nos pés
e nas mãos. Isso pode causar
deformações e perda de movimentos na região atingida.
Pesquisadores acreditam
que os poluentes ajam como
agressores, e o organismo não
os reconhece como uma substância própria. Dessa forma, o
corpo reage, produzindo anticorpos para combatê-los.
Quando o faz de maneira descontrolada, acaba combatendo
células do próprio corpo.
"Há editoriais de revistas
científicas de muito prestígio
com evidências de que a poluição pode influenciar no sistema imune. Isso ocorre especialmente no caso de solventes
e de exaustão de diesel", diz o
patologista Paulo Saldiva, coordenador do Instituto Nacional
de Análise Integrada de Risco
Ambiental da USP (Universidade de São Paulo).
Além da artrite reumatoide, é
possível associar a inalação de
poluentes a outras doenças autoimunes, como tireoidite crônica autoimune, lúpus eritematoso sistêmico, síndrome de
Sjogren, vitiligo e esclerose
múltipla, acrescenta a endocrinologista Maria Ângela Zaccarelli Marino, professora da Faculdade de Medicina do ABC .
Poluição industrial
Marino realiza pesquisas no
Polo Petroquímico do Capoava,
que fica entre as cidades de
Santo André e Mauá e o parque
São Rafael (zona leste de São
Paulo). A área reúne fabricantes de produtos químicos derivados do petróleo, que são a
matéria-prima de resinas, borrachas, tintas e plásticos. "Estudamos poluição de indústria.
As doenças autoimunes são
muito frequentes perto das indústrias: quanto mais perto a
pessoa mora, maiores são os
riscos de problemas", afirma.
Os trabalhos foram realizados com 2.004 moradores da
região. Foi verificado que quem
mora na área poluída tem cinco
vezes mais chances de sofrer de
tireoidite crônica autoimune.
A doença surge quanto os anticorpos agem contra a tireoide, o que pode levar a uma inflamação da glândula e à queda
na produção de hormônios (hipotireoidismo).
Ainda não é possível definir,
no entanto, quais partículas poluentes são responsáveis por
desencadear tais problemas.
"Vamos começar a estudar
agora os agentes que provocam
essas doenças, para haver conscientização. Podemos escolher
a água, o alimento, mas não o ar
que respiramos. O ar precisa
ser filtrado para evitar novos
casos", afirma Marino.
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