” Abaixo o viaduto” – Folha de S.Paulo

 

RUY CASTRO

RIO DE JANEIRO – Em Seul, na Coreia do Sul, a derrubada de um viaduto de 6 km ressuscitou o rio Cheonggye e o centro histórico da cidade, que ele matara ao ser construído nos anos 60. Hoje, em vez de carros passando por cima, o novo calçadão à margem do rio recebe 80 mil pessoas por dia. Há shows de música e festivais de lanternas que encantam os coreanos, reduziram a violência e geram dinheiro.

Esses elevados vêm do tempo em que o futuro do ser humano era tornar-se um automóvel. No Rio, em 1960, tivemos o viaduto da Perimetral, ligando a zona portuária à avenida Brasil e acotovelando as lindas casas onde funcionou a administração do Brasil nos séculos 18 e 19. As casas se salvaram, mais ou menos, mas a região foi avacalhada, e o Mercado Público, demolido -só restou uma torre, onde hoje fica o restaurante Albamar. A Perimetral foi a única grande obra que Juscelino, tão generoso para com o resto do país, deixou no Rio. Antes não tivesse deixado nada.

E, em São Paulo, há, naturalmente, o Minhocão. Não conheci a cidade antes dele, mas posso imaginar a vida que fervia na região que ele degradou. Nos últimos anos, sempre que comentei que a Perimetral e o Minhocão precisavam ser demolidos, as pessoas davam um salto: "Mas e o trânsito??? Vai ficar ainda pior do que está!".

Será? O elevado de Seul tinha o dobro de extensão do Minhocão paulistano. Levou seis meses para ir ao chão, tempo em que os cidadãos aprenderam a usar menos o carro, criaram-se corredores de ônibus e inverteram-se mãos de ruas. Hoje, menos carros circulam por Seul e ninguém sente falta.

Sonho com o dia em que verei a Perimetral de joelhos, aos cacos, achatada, para glória maior do Rio e dos ricos e pobres, brancos e negros, que protagonizaram naquelas ruas a história do Brasil.

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