Nota sobre o PL 108/09 – que propõe a criação do auxílio-creche

 

Consideramos inadequada a proposta de instaurar um Programa de Auxílio-Creche às mães que aguardam atendimento nas creches do município de São Paulo. É louvável que o Legislativo Municipal se preocupe com o grave problema da baixa cobertura no atendimento à Educação Infantil em São Paulo. No entanto, propostas como essa se revelam ineficientes, pois não atendem o direito dos/as trabalhadores/as de terem seus filhos freqüentando creche e pré-escola, nem o direito da criança à educação, contrariando o que designa a nossa Constituição Federal nos artigos 7, XXV e 208, IV. É direito da criança o acesso a creches e pré-escolas de boa qualidade, é opção das famílias matricularem suas crianças e é dever do Estado o provimento do atendimento na rede de educação formalizada, com garantia de qualidade e oferta por parte do poder público, para todas aquelas famílias que assim o desejarem.

Reiteramos aqui o posicionamento de diversos fóruns e movimentos de Educação Infantil e da educação em geral, apresentado em fórum público na Câmara Municipal, no dia 29 de abril de 2009, assim como o posicionamento dos movimentos de mulheres: cumprimento do direito à educação de qualidade desde o nascimento e ao longo de toda a vida e a recusa a medidas paliativas que responsabilizam as mulheres pelo cuidado e educação de seus filhos pequenos.

Propostas como essa, em vez de fortalecer as famílias, fortalecerão os programas de guarda domiciliar e escolas particulares de baixa qualidade. O atendimento nas instituições de Educação Infantil significa a garantia de que as crianças estejam em um ambiente coletivo em que sejam cuidadas, tenham vivências com outras crianças e adultos, brinquem e produzam cultura, ao mesmo tempo em que as/os familiares se sintam apoiados e valorizados, sintam-se responsáveis pela educação compartilhada das crianças pequenas, em instituições que respeitem e fortaleçam os vínculos familiares e que sigam os pressupostos de um atendimento de qualidade.

Todas/os sabemos que, apesar de significativos avanços na última década, no que diz respeito à ampliação de matrículas nas creches e pré-escolas, o direito à Educação Infantil no município de São Paulo não foi plenamente garantido. Especialmente com relação às crianças de 0 a 3 anos, a cobertura do atendimento no município ainda é muito baixa: 14,5% das crianças de 0 a 3 anos, enquanto temos 63,8% das crianças de 4 e 5 anos e 95,2% das crianças de 5 e 6 anos atendidas em creches ou pré-escolas (dados do Seade e Censos Escolares de 2006, sistematizados pelo Tribunal de Contas do Município), ferindo inclusive as metas previstas pelo Plano Nacional de Educação. Em números absolutos, temos atualmente quase 102 mil crianças matriculadas nas creches e 316 mil crianças matriculadas nas EMEIs (dados de junho de 2008, Centro de Informática de SME). A distribuição das matrículas em creches por dependência administrativa em 2006  era de cerca de 35 mil matrículas nas creches municipais e 65 mil matrículas nas creches conveniadas.

Ao considerarmos a destinação dos recursos orçamentários do município por nível de ensino entre 1995 e 2006 , percebemos um pequeno aumento na destinação de recursos para as creches e pré-escolas , com uma ampliação significativa do total de matrículas, em especial nas creches, mas também nas pré-escolas, entre 1998 e 2006. É preciso ponderar, portanto, que a ampliação de vagas na Educação Infantil tem se dado sem a devida ampliação dos recursos públicos.

Em discussões conjuntas, temos apontado alguns princípios centrais para a ampliação do atendimento público da Educação Infantil no município:
– a universalização, com prioridade inicial ao atendimento à demanda nas áreas de maior vulnerabilidade social;
– o atendimento em período integral das crianças de 0 até 6 anos;
– a ampliação do atendimento com qualidade (grupos menores, materiais e espaços adequados, formação dos profissionais de Educação Infantil, supervisão adequada, projeto pedagógico consistente e construído coletivamente, entre outros);
– a posição contrária à realização das parcerias público-privadas na Educação Infantil, uma proposta de gestão criada para os setores de infra-estrutura e não para a educação.

A proposta do PL 108/09 tem sido defendida por alguns pressupostos que gostaríamos de discutir:
– a idéia de que a prefeitura não tem tido condições para suprir a demanda não pode ser aceita. Se a Educação Infantil é uma prioridade pública, recursos devem ser utilizados para tanto e rapidamente;
– o valor proposto (bolsa auxílio de 1/2 salário mínimo por criança que aguarda uma vaga) é superior ao per capita destinado às creches conveniadas, responsáveis pelo atendimento de cerca de 65% das matrículas em creches no município;
– afirmar que esse projeto gerará empregos é reafirmar a lógica de responsabilização das mulheres e do atendimento privado na Educação Infantil;
– questionar as propostas de bolsa-auxílio creche não significa desconsiderar, muito pelo contrário, as dificuldades das mulheres que buscam alternativas para o atendimento de seus filhos, mas sim ponderar que essa iniciativa não leva em conta os direitos das mulheres e das crianças pequenas: o atendimento de qualidade em instituições coletivas.

Dispomo-nos a formular e discutir com urgência propostas para a rápida ampliação do atendimento nas creches do município, orientadas pelos princípios enunciados anteriormente, de garantia do direito à Educação Infantil e, portanto, pública – como a construção de novas creches diretas e a ampliação dos convênios com entidades sem fins lucrativos.
Atenciosamente,

Fórum de Educação Infantil das Entidades Conveniadas
Fórum Paulista de Educação Infantil
Fórum Regional de Educação Infantil – Grande São Paulo
GT Educação do Movimento Nossa São Paulo
Movimento Creche para Todos

 

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