A maioria das escolas da rede pública brasileira organiza-se pelo sistema de seriação. Se o aluno de determinada série não alcança as metas estipuladas para quela etapa, é reprovado. “Esse mecanismo gera evasão escolar e distorção idade-série”, afirmou a pedagoga e assessora do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), Zoraide Faustinoni.
A pesquisadora participou, com a socióloga Helena Singer, do debate “Ciclos, Progressão Automática e Reprovação”. Promovido pelo Grupo de Trabalho de Educação do Movimento Nossa São Saulo, o evento ocorreu na última semana na capital paulista. As duas debatedoras se posicionaram contra a reprovação, apontando como alternativa o sistema de ciclos. No entanto, criticaram o modo como essa proposta vem sendo implementada no Brasil.
Se a escola diz para o aluno que ele deve estudar, caso contrário, será reprovado, não vamos para nenhum lugar. A escola precisa apresentar o conhecimento como um valor”, comentou Zoraide. “O que importa hoje não é acumular conhecimento, mas saber navegar , estabelecendo conexões entre as diversas habilidades e disciplinas”, reforçou Helena Singer, também
diretora pedagógica da Associação Cidade Escola Aprendiz.
Segundo a assessora do Cenpec, uma alternativa ao sistema seriado, baseado na reprovação, é a proposta de organização por ciclos de aprendizagem com progressão continuada. Esse sistema está baseado na reorganização de tempo, espaços e conteúdos curriculares. Pressupõe ainda mudança na forma de trabalho na sala de aula e na forma de avaliação.
“Cerca de 20% das escolas públicas no país adotaram o sistema. Mas houve problemas na implementação. Hoje temos promoção automática, não progressão continuada”, disse Zoraide.
Para Helena, o sistema de ciclos foi implementado dentro do paradigma da seriação, marcado pela organização piramidal da escola (concentração de poder) e pelo conhecimento enciclopédico.
“Não se rompe com a série enquanto toda essa estrutura estiver colocada, pois permanece a lógica da educação bancária”, afirmou Helena, lembrando o conceito de Paulo Freire. Para o educador, a lógica bancária prevalece no modelo tradicional de prática pedagógica, no qual o professor transmite o conteúdo ao aluno, como se depositasse dinheiro em um banco.
Um dos nós do sistema de ciclos é a recuperação. Zoraide reforçou a necessidade da recuperação contínua dos conteúdos não aprendidos. O diagnóstico das dificuldades do aluno deve ser feito por meio de uma avaliação do processo. “Os professores devem ficar mais próximos do aluno,
acompanhando seu desenvolvimento”, disse.
De acordo com Zoraide, é equivocada a ideia de que no sistema de ciclos não há metas a serem alcançadas periodicamente. “Para que a proposta funcione é necessário um trabalho coletivo da escola em torno de metas, na seleção dos conteúdos e na elaboração de projetos significativos”.
“A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) dá autonomia para a criação do projeto político-pedagógico da escola. No entanto, isso é pouco implementado”, comentou Helena.