O modelo de transporte adotado no país e na cidade de São Paulo, chamado de “rodoviarista”, foi o foco principal no debate sobre a ampliação da Marginal Tietê, promovido pelo Movimento Nossa São Paulo, na manhã desta terça (25/8), no Sesc Consolação. O evento abriu as atividades do dia Mundial Sem Carro, comemorado em 22 de setembro.
“A prefeitura está anunciando uma série de obras viárias, e são todas feitas para o automóvel”, afirmou Marcos Bicalho, superintentendente da Associação Nacional dos Transportes Públicos (ANTP). De acordo com Bicalho, São Paulo investe neste modelo “rodoviarista” que privilegia o caminhão e o transporte privado, desde Prestes Maia, com “resultado nulo”. Bicalho argumentou que a proposta de ampliação da Marginal Tietê está totalmente na contramão dos conceitos que especialistas, técnicos e a ANTP têm defendido, “de mobilidade urbana sustentável", que privilegia uma rede de transporte público integrada.
Rafael Poço, integrante do Coletivo Ecologia Urbana, criticou a falta de consulta à sociedade para a realização da obra, reclamou que o licenciamento ambiental não poderia ser feito apenas pela prefeitura, mas pelo governo estadual, e afirmou que há poucas informações sobre o impacto ambiental e os custos. “Essa obra teve uma pressa absurda em ser aprovada e não temos ainda informações de qual o tamanho e inclusive de quanto vai custar.” E pouco depois acrescentou: “Estou pessoalmente dedicado a combater essa obra não só pelo impacto, mas porque a sociedade civil não pode silenciar diante das imposições.”
Tanto Bicalho quanto Poço mencionaram como mais viável o investimento nas vias alternativas à Marginal Tietê, como Marquês de São Vicente e Zaki Narchi, que está previsto no Plano Diretor atual e que não foi feito até agora. Essas vias são vistas como uma forma de desafogar a marginal, ao mesmo tempo em que poderiam integram o trânsito às atividades da cidade.
O secretário Eduardo Jorge, que participou da mesa por meia hora e teve que sair para outro evento, concordou que é preciso mudar o modelo rodoviarista adotado na cidade e no Brasil há décadas. Porém, defendeu a obra com os seguintes argumentos: “não se faz uma mudança [cultural] desse porte sem uma intervenção nacional, regional e municipal também de longo curso” e “o antigo tem que continuar rodando enquanto não vem e não nasce o novo”. Antes de sair, foi questionado por Bicalho se acreditava que a obra teria efetividade, ou seja, que iria desafogar o tráfego. “Se eu não acreditasse não daria o licenciamento”, respondeu Eduardo Jorge.”
Ricardo Laiza, também superintendente de planejamento da CET, afirmou concordar que o modelo precisava ser revertido, mas que a própria sociedade e a imprensa cobram da CET mais fluidez no tráfego. Segundo Ricardo, somente com maior consciência da sociedade seria possível mudar o modelo rodoviarista. “Nós somos técnicos que seguimos diretrizes políticas, que são mudadas com movimentos da sociedade”.
Todas as manifestações do público foram contrárias à obra. O arquiteto e urbanista Nabil Bonduki disse que São Paulo “tem que assumir a liderança para reverter o modelo [rodoviarista]”. E destacou que só será alterado o modelo se os “investimentos em transporte coletivo forem maior do que no individual”.
De acordo com Josefábio Kalazans, falta um planejamento maior em que a sociedade seja ouvida. “O que a cidade pede é um plano global de circulação em todos os níveis que demanda a participação da sociedade civil.”
Odilon Guedes, do GT Orçamento do Movimento Nossa São Paulo, destacou que diante da “catástrofe ambiental anunciada” do aquecimento global, devido aos combustíveis fosseis, “é inadmissível querer colocar mais carros na rua”.
Maurício Broinizi, coordenador da Secretaria Executiva do Movimento e mediador da mesa, destacou a importância de haver audiências públicas e registro das propostas feitas pela sociedade. Devemos “cobrar em cada lugar que a gente for participar que a audiência registre as propostas, saia em ata e seja publicada no diário oficial.”
Obras previstas na Marginal Tietê
O projeto da chamada “Nova Marginal” prevê a ampliação de 23 quilômetros de pistas de cada lado, criando seis novas faixas para circulação de carros, com o objetivo anunciado de reduzir os engarrafamentos na via em 35%. O início das obras da nova marginal foi anunciado no dia 4 de junho, e começaram no dia 13 do mesmo mês. Em 16 de julho um conjunto de organizações não governamentais protocolou uma ação judicial pedindo a interrupção das obras.