“Cidades em colapso” – Folha de S.Paulo

 

O arquiteto Christian de Portzamparc, à frente de plano de reurbanização de Paris, diz que metrópoles devem unir mais centro e periferia

MARIO GIOIA
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma cidade flexível, repleta de parques por diversos bairros, transporte fácil e qualidade de vida acessível a todos os habitantes. Essa metrópole ideal, imaginada pelo arquiteto Christian de Portzamparc, é quase uma utopia, frente aos graves problemas enfrentados por locais tão diversos como São Paulo, Paris e Pequim.
"Paris, assim como São Paulo, está à beira do colapso", afirma Portzamparc, 65, o principal arquiteto em atividade na França e ganhador do Prêmio Pritzker (o Nobel da arquitetura), no ano de 1994.
"Quando eu falo na França que Paris vive os mesmos problemas de São Paulo, as pessoas acham que é um exagero, mas não é", diz ele. "As metrópoles são fenômenos novos. Suas dificuldades devem ser enfrentadas de novas maneiras."
À frente de um dos dez escritórios de arquitetura contratados pelo governo Sarkozy para reformular o urbanismo da Grande Paris em um período de 20 a 40 anos, Portzamparc esteve em Brasília na segunda e na terça para participar de seminário internacional sobre as metrópoles.
De lá, pela TV, viu o caos que se abateu sobre São Paulo após temporal, na terça. "É uma situação esperada. Privilegiar grandes vias expressas [como as marginais] e o transporte individual termina por criar coisas desse tipo."
Para Portzamparc, as grandes avenidas criam, pouco a pouco, bairros-enclaves, que não se relacionam com o restante da cidade de forma sustentável. "Em Paris, por exemplo, essa circulação expressa cria setores segregados. Isso cria espaços sem futuro, que vivem unicamente de um tipo de atividade. Uma cidade sustentável tem de ser flexível."
Por isso, o arquiteto observa semelhanças entre as atuais configurações da capital francesa e seus arredores e da Grande São Paulo. "A separação física e social, os problemas gerais de transporte, resultaram, em 1995, na grande onda de violência pela qual passaram Paris e outras cidades francesas. São Paulo não passou por isso, mas também vive um problema grave de circulação."
Pequim, que o urbanista visitou recentemente, também está optando por um modelo errado, segundo ele.
"É uma loucura, eles têm seis ou sete autoestradas periféricas e não investem nada em transporte público. Por que não? Porque todas as indústrias automobilísticas estão lá e vão investir em décadas de crescimento do mercado automobilístico na China, uma coisa imensa."

Soluções
O conceito de cidade flexível proposto por Portzamparc para Paris reinventa uma antiga ideia sua, a de quadra aberta, junto de grandes intervenções sobre o tecido urbano da capital e seus arredores.
O plano cria "arquipélagos" verdes, parques espalhados por diversas regiões e espaços ociosos de linhas férreas.
Transporte coletivo é outro foco do programa, com a construção de um monotrilho (espécie de metrô) sobre o atual anel periférico da Grande Paris, além de outras linhas para integrar todas as cidades.
"Falo em quadras abertas há 20 anos, cujo centro é a rua, uma invenção extraordinária. Temos de revalorizar a rua, que é a verdadeira organização espacial de democracia, onde pobres e ricos andam lado a lado."

Brasil
Fascinado pela arquitetura brasileira feita por nomes como Oscar Niemeyer e Affonso Eduardo Reidy (1909-1964, que projetou o MAM Rio), "a melhor do mundo quando a estudava na adolescência, nos anos 60", Portzamparc diz que espera que seu projeto no Rio, a Cidade da Música, seja concluído no final do ano que vem.
"Seria uma coisa desastrosa se não a finalizassem. Existem detalhes de acústica muito específicos que devem ser seguidos. O público de um concerto da Orquestra Sinfônica Brasileira e da Osesp, por exemplo, merece receber um bom som."


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