ENEM: o caminho para democratização do acesso à universidade


Maria do Carmo Brant de Carvalho
Maria Alice Setubal


Sem desconsiderar a gravidade da violação da prova, os últimos acontecimentos envolvendo o exame e que resultaram no seu adiamento não devem desqualificá-lo ou encobrir a sua relevância

A repercussão dos problemas enfrentados pelo Ministério da Educação para realização do novo Enem é proporcional à dimensão, abrangência e relevância que o exame adquiriu neste ano e ao impacto dele esperado. Mais de 4 milhões de estudantes devem comparecer à prova que será aplicada em 1.829 municípios de todos os estados do País e servirá como ferramenta de seleção para o ingresso em 81% das universidades públicas federais.

É essa magnitude que dá relevância à avaliação. A intenção do Ministério da Educação é criar mecanismos alternativos ao vestibular, que hoje se constitui um instrumento de exclusão bastante perverso, que premia aqueles que já são privilegiados, reforçando e legitimando a desigualdade do nosso sistema educacional. Ao unificar o processo de seleção nessas instituições, o MEC também espera promover maior mobilidade dos estudantes no território, democratizando o acesso a essas vagas.

Um outro efeito que o Ministério da Educação espera produzir com essas mudanças é a reformulação do currículo do Ensino Médio, hoje determinado pelo vestibular, isto é, pelo acúmulo excessivo de conteúdos. A medida articula-se a um conjunto maior de ações – o Programa Ensino Médio Inovador – que procura conferir uma nova identidade à última etapa da Educação Básica.

O novo Enem mantém a sua característica peculiar – de avaliar competências e habilidades -, mas passa a dialogar mais diretamente com o currículo do Ensino Médio. Dividida em quatro áreas (Linguagens e suas Tecnologias, Ciências Humanas e suas Tecnologias, Ciências da Natureza e suas Tecnologias e Matemática e suas Tecnologias), a prova valoriza o raciocínio e a capacidade analítica do aluno em detrimento da memorização de fórmulas e informações.

Sem desconsiderar a gravidade da violação da prova, os últimos acontecimentos envolvendo o exame e que resultaram no seu adiamento não devem desqualificá-lo ou encobrir a sua relevância. Seu potencial de proporcionar avanços importantes para a qualidade do ensino do País, de democratizar o acesso às universidades públicas e de mudar os paradigmas tradicionais de avaliação deve ser preservado de julgamentos precipitados e de interesses alheios à causa da educação brasileira.

A agilidade e prontidão do MEC na resolução do problema sustentam a credibilidade desse valioso instrumento para a educação pública. As novas datas para realização do Enem já foram anunciadas: 5 e 6 de dezembro. Uma articulação nacional, envolvendo Fundação Cesgranrio, Cespe/UnB, Correios, Força de Segurança Nacional e Polícia Federal, deve assumir o desafio de produzir, distribuir e aplicar a prova em tempo recorde, resguardando a segurança do exame. Dessa forma, está assegurado o caminhar para a construção de uma nova proposta para o Ensino Médio.

Maria do Carmo Brant de Carvalho é pós-doutora em Ciência Política e Superintendente do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec).

Maria Alice Setubal
é socióloga pela Universidade de São Paulo (USP), doutora em Psicologia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e mestre na área de Ciências Políticas (USP). É presidente da Fundação Tide Setubal e do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec).
 

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