“Bairros nobres concentram registro de BOs na capital” – Jornal da Tarde

 

Dos 595 mil boletins de 2008, 100 mil foram feitos em distritos como Perdizes, Lapa, Itaim Bibi e Portal do Morumbi. Números podem indicar concentração de patrulhamento e também crimes patrimoniais, em que há pedido de seguro

MARICI CAPITELLI, marici.capitelli@grupoestado.com.br

Delegacias de áreas nobres de São Paulo, como os bairros do Itaim-Bibi, Pinheiros, Perdizes e Portal do Morumbi, responderam pela maior parte dos registros de boletins de ocorrência feitos pelos paulistanos em 2008. Já os moradores de bairros periféricos das zonas leste e sul foram os que menos procuraram os distritos para registrar crimes, segundo o Departamento de Polícia Judiciária (Decap). Em toda a cidade, foram feitos 595.350 registros.

A cidade é dividida em oito delegacias seccionais. Os 14 distritos que fazem parte da 3ª Seccional de São Paulo, em que se incluem Lapa, Pinheiros, Perdizes e Portal do Morumbi, tiveram o maior número de boletins registrados em 2008: 100.636 (veja quadro ao lado). A 8ª Seccional, que engloba bairros do extremo leste da capital, como Guaianases, São Mateus e Cidade Tiradentes, é a última no ranking: 50.995 boletins.

Renato De Vitto, defensor público e coordenador da comissão de Segurança Pública do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), afirma que a disparidade pode estar relacionada ao patrulhamento de cada região. Segundo ele, como boa parte dos boletins é resultado de flagrantes da PM, os BOs seriam um indício do efetivo maior da corporação em bairros ricos. “O número menor de ocorrências nas áreas pobres pode indicar um policiamento menos ostensivo”, diz De Vitto. Ele diz, no entanto, que faltam pesquisas para definir o perfil e a incidência do crime em cada região.

Descrédito, mau atendimento e medo de represálias são indicados como fatores que desmotivam os moradores de bairros mais pobres a procurar as delegacias. “Se a pessoa não acredita que a polícia vai solucionar o problema, ela não irá registrar mesmo, porque, muitas vezes, teme as lideranças criminosas do bairro”, diz De Vitto. O defensor afirma ainda que há casos em que o crime organizado resolve os conflitos a partir de suas “leis”. Para melhorar o atendimento nas delegacias, hoje começa a funcionar um novo sistema (leia abaixo).

Para Denis Mizne, do Instituto Sou da Paz, o relacionamento entre as comunidades e a polícia é decisivo para o registro dos BOs. “Nas periferias, essa relação é mais tensa e há uma tendência em não se confiar na polícia.” Para especialistas, um fator é fundamental para o maior número de BOs nas áreas nobres: os crimes contra o patrimônio. “O número é muito maior que o de homicídios, que ocorrem nas periferias”, diz José Vicente da Silva, ex-secretário Nacional de Segurança.

Seguro

Ter seguro dos bens faz a diferença para que as vítimas procurem as delegacias, pois as seguradoras exigem o registro para ressarcir os clientes. “Os bens com seguro estão nas áreas nobres”, afirma De Vitto. A mesma hipótese é defendida pelo coordenador do Núcleo de Estudo da Violência da USP, Sérgio Adorno. “Nessas áreas, as pessoas têm negócios e muitas vezes estão associadas a seguros. É preciso registrar (a ocorrência) para obter a compensação financeira”, argumenta. Segundo ele, em geral isso não ocorre nos bairros mais periféricos.

Para Marco Antonio Pereira Novaes de Paula Santos, diretor do Decap, uma soma de fatores ocorre para que as áreas nobres tenham mais registros. “Facilidade de locomoção, concentração maior de moradores e esclarecimento (da população). Normalmente, as áreas nobres comportam centros comerciais. Existe uma concentração maior de veículos melhores. É lógico que o número de crimes patrimoniais é maior.”

Colaborou Felipe Oda

Leia também: "Menos DPs farão BO nas zonas leste e norte de SP" – O Estado de S. Paulo

Compartilhe este artigo