Secretaria diz que contratos foram assumidos por outros parceiros; fórum prepara ação para exigir reajustes
Filipe Vilicic
O congelamento dos repasses da Secretaria de Assistência Social fez entidades desistirem de convênios e demitirem funcionários. A Associação Evangélica Beneficente, que tem nove trabalhos com a pasta, deixou um abrigo que mantinha em Santana para mais de 20 crianças abandonadas. "Não tínhamos recursos para manter o serviço", diz um integrante da associação, que pediu para não ser identificado. "As despesas aumentaram, mas os repasses não. E a situação nos pegou despreparados, sem condições para continuar o trabalho."
De acordo com o Fórum da Assistência Social, ao menos outras duas entidades paulistanas desistiram de serviços prestados por problemas financeiros. "Há ainda dezenas que pretendem cancelar contratos no ano que vem, se os reajustes não forem feitos", declara o coordenador da associação, William Lisboa. Segundo Lisboa, o fórum prepara uma ação judicial para exigir da Prefeitura ajustes nos convênios. "Essa situação não pode continuar", diz. "Se o governo persistir em desprezar as necessidades do setor, os serviços logo serão sucateados e aumentará o número de pessoas carentes, como mendigos e crianças abandonadas, nas ruas."
A assistente social Paula Lusa Soares, gerente da Promove Ação Sócio Cultural, que possui três contratos com a secretaria, receia perder o emprego com a crise. "Sem as mudanças necessárias nos repasses, pode ser que me troquem por alguém com um salário menor, mas com menos experiência", diz Paula, que tem um soldo superior aos cerca de R$ 2 mil estipulados pela Prefeitura para seu cargo. "Os aumentos vieram principalmente com os dissídios da categoria."
Paula se formou em Serviço Social em 1982 e administra há oito anos o centro de desenvolvimento social e produtivo para adolescentes em Vila Albertina. Ela relata que há uma demanda reprimida na região: cerca de 500 jovens estariam esperando por assistência. E, para Paula, se o orçamento municipal destinado à área não aumentar esse grupo permanecerá sem atendimento.
Mesmo entidades saudáveis financeiramente protestam. "Felizmente, temos uma boa poupança e muitos doadores, o que nos faz depender menos da boa vontade do governo", afirma Carlos Nambu, representante da Rede Salesiana, instituição com cinco convênios. "Mas se não tivéssemos esse respaldo, estaríamos sofrendo."
A assistente social Neiri Bruno, integrante do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Seguridade e Assistência Social da PUC-SP, analisa que demissões e dificuldades financeiras prejudicam a qualidade dos trabalhos. "Relações entre o Estado e organizações filantrópicas deveriam ser mais benéficas, já que essas entidades ajudam com um serviço público que é de responsabilidade do governo", diz. "Conflitos entre a Prefeitura e as entidades têm como consequência a estagnação do setor e o aumento da demanda reprimida."
Para o vereador Ítalo Cardoso (PT), criador da Frente Parlamentar em Defesa da Política de Assistência Social, há descaso da atual gestão com o tema. "Os mais prejudicados são os assistidos e a população, que sofre, por exemplo, com o agravo dos problemas sociais", defende.
OUTRO LADO
Segundo a secretaria municipal, 12 organizações encerraram convênios neste ano. "Por irregularidades na documentação apresentada ou porque não tinham interesse em continuar o serviço", alega a chefe de gabinete, Maria Luiza Gomes de Azevedo. "Não tenho ciência de centros que deixaram a parceria por problemas financeiros." A Prefeitura ainda diz que os contratos cancelados foram imediatamente assumidos por outras entidades e os serviços não foram descontinuados.