“Em SP, novas regras para emissão de licenças geram crise entre governo e ambientalistas” – Jornal Valor

 

Samantha Maia, de São Paulo  

Mudanças na estrutura responsável pelo licenciamento ambiental no Estado de São Paulo têm gerado divergências entre o governo estadual e ambientalistas, que se retiraram recentemente das reuniões do Conselho Estadual do Meio Ambiente de São Paulo (Consema) em protesto contra as novas diretrizes. Na avaliação do governo, a centralização do licenciamento na Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) e as novas regras de funcionamento do Consema darão mais agilidade aos processos e reduzirão custos. Os ambientalistas, entretanto, reclamam que a sociedade está perdendo poder de decisão sobre a emissão de licenças.

Até abril deste ano, além da Cetesb, mais três órgãos eram responsáveis por emissões de licenças em São Paulo: o Departamento Estadual de Proteção dos Recursos Naturais (DEPRN), o Departamento de Uso do Solo Metropolitano (Dusm) e o Departamento de Avaliação de Impacto Ambiental (Daia), todos ligados à Secretaria do Meio Ambiente. O Consema, que só existia por meio de decreto, passou a ser regido por uma lei que estabelece suas atribuições.

Aí é que começa o problema. Segundo a lei, o conselho existe para acompanhar as políticas do Estado e estabelecer normas relativas à avaliação, ao controle e à recuperação dos recursos ambientais. "A Secretaria de Meio Ambiente tem órgãos executivos, como a Cetesb, e o conselho, que é um órgão normativo e recursal", diz Germano Seara Filho, secretário-executivo do Consema.

Desde sua criação em 1983, porém, o Consema tem forte atuação na análise de estudos de impacto ambiental, as EIA-Rima. Os estudos eram encaminhados para as câmaras técnicas do Consema, e levados a plenário quando um requerimento era apresentado por 9 dos 36 conselheiros (os ambientalistas possuem seis cadeiras). "O Consema ficava dedicando muito do seu tempo a questões menores, como análise de EIA- Rimas", diz Seara Filho.

Segundo o novo modelo instituído com a lei, para levar um estudo de impacto ambiental a plenário, os conselheiros terão que submeter o requerimento à votação da maioria do conselho. O Consema também poderá decidir sobre a emissão de uma licença quando o EIA-Rima for encaminhado ao plenário pelo secretário estadual do Meio Ambiente. As câmaras técnicas deixarão de existir.

"O novo modelo inviabiliza a a análise de um licenciamento pelo Consema com a desculpa de acelerar o processo", diz Heitor Tommasini, do Movimento Defenda São Paulo e membro da bancada ambientalista no conselho. Para o conselheiro Carlos Bocuhy, presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam), a decisão do governo afeta a transparência dos licenciamentos. "O Consema existe para discutir políticas públicas e o licenciamento é uma das pautas."

O secretário-executivo do Consema diz que a retirada da bancada ambientalista das reuniões não se justifica, já que as mudanças foram discutidas. "Toda essa mudança foi discutida no Consema. A votação não foi unânime, mas foi pela maioria", diz. Segundo ele, as novas diretrizes não devem deixar o processo de licenciamento menos rigoroso, mas concentrá-lo na Cetesb, que é o órgão oficialmente responsável pelo procedimento. "É positivo a Cetesb ser a única licenciadora. Antes os usuários não sabiam que órgão procurar, e o objetivo é evitar paralelismo", diz.

Originalmente, a Cetesb é responsável pela fiscalização e licenciamento de atividades poluidoras. Segundo a nova estrutura, instituída este ano, a companhia, que possui 2 mil funcionários, passa a cuidar também do licenciamento de projetos que tenham interferência em áreas de proteção ambiental. Licenciamentos de obras de pequeno impacto devem ser feitos por agências regionais.

A relação entre o Executivo e os conselheiros ambientalistas ficou mais complicada após a publicação, em outubro, de uma resolução que passa o controle do cadastro das entidades ambientais – base para a eleição da bancada ambientalista do Consema – , que era de responsabilidade do conselho, para a Coordenadoria de Educação e Ambiente, órgão executivo da secretaria. Segundo Seara Filho, a mudança não traz prejuízos às entidades, pois os critérios para cadastramento não foram alterados.

Para Tommasini, a medida visa restringir a admissão de novas entidades. "Uma mudança administrativa desse porte deveria ter sido discutida no conselho. O fato dela ter sido uma surpresa nos leva a pensar que a intenção do governo é interferir no processo de escolha." Os ambientalistas estão preparando uma pauta de reivindicações ao governo em relação às mudanças e à política ambiental do Estado. 

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