Estudo realizado pela Unifesp indica que existe relação direta entre a situação econômica do aluno e o aprendizado nos colégios. Doação de livros didáticos é citada como solução
Rodrigo Couto
São Luiz do Norte (GO) Quanto maior a porcentagem de indivíduos pobres em um município, pior é o desempenho Escolar. É o que constatou uma pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). A situação econômica determinou em até 58% o rendimento dos alunos das Escolas municipais, enquanto nos estabelecimentos estaduais o mesmo percentual ficou em 44%. Para reverter o cenário, a coordenadora do levantamento, Christina Andrews, recomenda a continuidade do Plano Nacional de Formação de professores, do Ministério da Educação (MEC), e a criação de medidas de impacto, como a entrega dos livros didáticos aos estudantes de baixa renda. “Em vez de devolvê-los à instituição ao fim de cada período letivo, como acontece atualmente, seria positivo permitir que esses jovens ficassem com seus livros. É importante que eles possam consultá-los em casa sempre que tiverem alguma dúvida”, defende a pesquisadora.
Especialistas consultados pelo Correio concordam com a sugestão da responsável pelo estudo. Doutora em Educação pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Maria Abádia da Silva, que atualmente leciona na Universidade de Brasília (UnB), diz que o livro pertence ao aluno. “Sempre defendi que as coletâneas deveriam ser de propriedade dos estudantes. É fundamental que os jovens, de qualquer série, fiquem com os livros o tempo todo, inclusive fora do horário Escolar”, analisa. “Não basta colocar uma biblioteca dentro da Escola. É preciso ir além do livro didático. O governo deve fornecer obras literárias e com outras temáticas, como música e dança, por exemplo”, observa.
A possibilidade de os alunos permanecerem com os livros didáticos depende da redução de custos do mercado editorial, segundo o sociólogo e o coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara. “A propriedade do livro não deve se restringir aos filhos da elite e da classe média. No entanto, para reverter essa realidade, é preciso baratear o preço dos livros. O mercado brasileiro é um dos mais caros”, lembra. “Ao contrário de outros países, como a Inglaterra, as coletâneas no Brasil são muito sofisticadas. É possível fazer um bom material e com valor reduzido”, frisa.
Procurada pela reportagem, a secretária de Educação Básica do MEC, Maria do Pilar Lacerda, não foi localizada para comentar as sugestões do estudo.
O levantamento da Unifesp também revelou que, apesar do baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), 35 municípios apresentaram notas acima da média nacional (3,9) no Índide de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).
Aulas
Em São Luiz do Norte (GO), um dos municípios destaques na pesquisa, que apresentou nota 6 no Ideb, a pequena Maria Isabella da Silva, 8 anos, futura estudante da 4ª série do ensino fundamental, comemora boas notas, mas lamenta o fato de não ter dinheiro para comprar livros. “Se eu pudesse ficar com os cadernos da Escola seria muito bom.” A mãe, Luciete Forte da Silva, 33, diz que a garota ficou aflita por não ter atingido a pontuação máxima em todas as disciplinas. “Em português e matemática fiquei com 9,5. Gostaria de ter tirado era 10”, diz Maria Isabella. Ela e a irmã, Maria Eudina, outra craque das notas altas, são sustentadas pelo salário mínimo que Luciete recebe.
Christina atribui o maior impacto da pobreza no rendimento Escolar dos alunos das instituições municipais ao fato de que a expansão do ensino fundamental ocorreu principalmente nesses estabelecimentos. “Com o crescimento no número de estudantes, as Escolas municipais passaram a ter uma proporção maior de jovens pobres do que as Escolas estaduais”, diz.
O número
58% – Percentual de alunos de Escolas municipais que têm o rendimento afetado pela situação econômica, segundo o estudo da Unifesp
Noite do pijama
Secretária de Educação de São Luiz do Norte (GO), Cleide Maria da Silva não soube apontar as causas para o bom desempenho da cidade no Ideb, mas dá pistas para o interesse dos alunos. Entre os projetos desenvolvidos a cada mês nas cinco Escolas municipais para incentivar os estudantes, ela cita a 1ª Noite do pijama, quando 81 alunos da 1ª a 4ª série do ensino fundamental (faixa etária de 7 a 10 anos) passaram uma noite dentro da Escola declamando poesias e ouvindo músicas. Vestidos de pijamas, alunos e professores lancharam e dormiram na Escola.
“Foi um sucesso. Eles já estão cobrando a realização de uma outra edição neste ano”, conta Cleide. “Também temos o programa de ensino e aprendizagem, que oferece aulas de reforço duas vezes por semana aos alunos com dificuldade”, acrescenta. Para evitar que as crianças residentes em pequenos povoados próximos ao município fiquem sem estudar, a prefeitura e o governo estadual implantaram a chamada Escola ativa. “Na verdade, é uma turma de 15 alunos do 1º ao 5º do ensino fundamental que estuda junto, numa mesma sala. Como seria inviável formar turmas de dois estudantes, decidimos copiar um modelo que já é adotado pelos índios”, explica.
A cidade ainda realizou a semana da alimentação e um projeto sobre a Páscoa. (RC)