Os mais de 4 milhões que insistissem em ficar receberiam de bandeja algo como um paraíso urbano
Diante da pesquisa do Movimento Nossa São Paulo, publicada nesta edição, mostrando que mais da metade (57%) dos paulistanos se mudaria daqui se tivesse oportunidade, é tentador imaginar como seria a cidade sem alguns milhões de pessoas. Os mais de 4 milhões que insistissem na selva de pedra receberiam de bandeja algo muito próximo de um paraíso urbano.
Basta lembrar como fica a cidade em grandes feriados, quando uma parte significativa dos paulistanos foge para o litoral e o interior. Não seria exagero dizer que uma das coisas que ainda tornam esta metrópole viável é uma espécie de contrato social tácito que permite que, de tempos em tempos, uma parte da população possa aproveitar sua infraestrutura de forma mais plena e tranquila.
É claro que São Paulo não seria a mesma e nem teria a mesma pujança sem grande parte de seus moradores, provavelmente o principal patrimônio que a cidade conquistou ao longo do tempo.
Também não cabe a ninguém julgar aqueles que manifestam abertamente a vontade de se mudar daqui. São Paulo é mesmo um cidade difícil, e o número dos que já pensaram ao menos uma vez em deixar a cidade, ainda que tenha sido numa mesa de bar, deve ser bem maior do que o revelado pela pesquisa.
O fato, porém, é que os que efetivamente se mudam ainda são relativamente poucos. E o motivo é simples: São Paulo tem muito a oferecer, a começar por oportunidades de emprego, de educação e de renda. Talvez uma parcela dos que dizem querer trocar de endereço tenham condições de efetivamente fazê-lo, mas não se mobilizam para isso, pois, no fim da contas, o poder de atração da metrópole prevalece.
Assim, com tanta gente alimentando o desejo nem tão íntimo de sair daqui, mas sem oportunidades reais ou motivação suficiente para colocar o plano em prática, São Paulo vai perpetuando a relação de amor e ódio com seus moradores. Criticar a cidade, mais do que um hábito, já faz parte do DNA do paulistano.
Eu, que vim de fora, há mais de 20 anos, e fiz de São Paulo minha cidade por adoção, não sou exceção. Mas me incomoda, por exemplo, ouvir recém-chegados ou quem está só de passagem por aqui tratar São Paulo como filial do inferno, ignorando tudo que esta gigante cheia de contrastes tem a oferecer a quem se joga na experiência de vivê-la.
(Fernando Leal*
Editor (fleal@destakjornal.com.br))