Uma mesa sobre trabalho escravo contemporâneo foi um dos destaques do segundo dia de atividades do Fórum Mundial Social 2010, em Porto Alegre, nesta quarta (27/1). Organizado pela Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo e a Frente Nacional contra o Trabalho Escravo, o evento contou com a participação do ministro Paulo Vannuchi (da Secretaria Especial de Direitos Humanos), da diretora da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil Laís Abramo e do senador José Nery, além de representantes da Justiça, do Ministério Público e da sociedade civil.
O objetivo do encontro foi avaliar quais foram os avanços e dificuldades no combate ao trabalho escravo até agora. E quais são os principais desafios para a sua erradicação. Para isso, foram debatidos o perfil das atividades que utilizam mão-de-obra escrava no país, a atuação do poder público no combate do crime e os projetos de lei que ajudariam a acabar com a escravidão contemporânea. Entre os projetos, há a Proposta de Emenda Constitucional 438, conhecida como “PEC do Trabalho Escravo”. A proposta prevê o confisco de propriedades onde for encontrada exploração de mão-de-obra análoga à escravidão e sua destinação ao programa nacional de reforma agrária.
“O trabalho escravo é a antítese mais clara do trabalho decente, que é a grande bandeira da OIT. Hoje, ainda, mais de 12 milhões de pessoas trabalham forçadamente em todo mundo. Na América Latina, esse número chega a 1,3 milhão. Da parte dos escravagistas, o lucro supera os US$ 30 bilhões”, informou Laís Abramo, diretora da OIT no Brasil. Apesar do cenário ainda longe de ser o ideal, ela enfatizou que o Brasil tem sido referência positiva na luta pela erradicação do trabalho escavo. “Somos protagonistas”, concluiu.
José Nery, senador pelo Pará e presidente da Comissão de Combate ao Trabalho Escravo do Senado Federal, destacou algumas iniciativas do Congresso, mas também apontou exemplos de omissão. “Apesar do esforço de alguns setores para aprimorarmos a legislação, os parlamentares ainda estão devendo muito à sociedade. Tramitam na Câmara e no Senado diversos projetos, muitos deles idênticos, mas não avançamos na aprovação da PEC 438”, criticou o senador. E enfatizou: “Garantir a expropriação da terra dos escravagistas corresponderá a uma segunda Lei Áurea”.
Marcus Barberino, juiz do trabalho da 15ª Região e coordenador das oficinas jurídicas da Comissão Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo, admitiu que o conceito de trabalho escravo ainda é pouco claro e que os próprios juízes o desconhecem. Segundo ele, apenas sensibilizar a categoria não é suficiente, já que os concursos públicos “não neutralizam visões conservadoras”. Barberino também criticou a atual legislação que, segundo ele, trata apenas da sanção e não da erradicação do trabalho escravo no Brasil. “É um crime sistemático, que perpassa todas as cadeias produtivas do País e está na mesa, na vida dos brasileiros”, completou.
Uma das participações mais esperadas do encontro, o ministro Paulo Vannuchi aproveitou a ocasião para defender o Plano Nacional de Direitos Humanos proposto pelo Governo Federal e alvo de muita polêmica. Mas também destacou os avanços na luta contra o trabalho escravo no Brasil e convocou os setores diretamente envolvidos na questão, como a Copnfederação Nacional da Agricultura (CNA) a “acompanhar uma ação de fiscalização e autuação para não restar dúvidas sobre a existência do crime no País”.
Vannuchi lembrou também que o Tocantins já tem uma lei estadual contra o trabalho escravo, e que outros estados poderiam fazer o mesmo. Além disso, cobrou das empresas “que se dizem socialmente responsáveis, principalmente as grandes” a assinatura do Pacto Nacional do Trabalho Escravo. “Não adianta só fazer marketing. O trabalho escravo não é só coisa de fazendeiro, é negócio de grandes capitalistas”, concluiu.
REPORTAGEM: LUANDA NERA