Por Felipe Maeda Camargo – felipe.maeda.camargo@usp.br
A partir de dados da Prefeitura de São Paulo e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do período de 1995 a 2006, o pesquisador Daniel Hideki Bando verificou que o agrupamento de 18 distritos da região central, centro-sul e centro-oeste da cidade apresenta a maior taxa de suicídios (6,3 para 100 mil habitantes).
Dezoito distritos da região central de São Paulo apresentam alta taxa de suicídio
O estudo de Bando, fruto de sua dissertação de mestrado para o Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, também constatou que a elevada taxa está associada ao fato de os suicidas serem de distritos de maior renda, a maioria solteiros, migrantes e católicos, quando comparados a outras regiões da cidade. O agrupamento engloba bairros como Alto de Pinheiros, Barra Funda, Bela Vista, Bom Retiro, Brás, Cambuci, Consolação, Itaim Bibi, Jardim Paulista, Liberdade, Moema, Morumbi, Pinheiros, Perdizes, República, Santa Cecília, Sé e Vila Mariana.
Já em 14 distritos da região sul (Campo Grande, Campo Limpo, Capão Redondo, Cidade Ademar, Cidade Dutra, Grajaú, Jardim Ângela, Jardim São Luís, Santo Amaro, Socorro, Pedreira, Raposo Tavares, Vila Andrade e Vila Sônia) o quadro é o oposto. Esse agrupamento tem a menor taxa de suicídio (3,3 para 100 mil habitantes), o qual coincide com o fato de ser a região com maior número de casais e de evangélicos da cidade.
Segundo Bando, esses dados estão próximos aos chamados fatores de risco levantados pela Organização Mundial de Saúde (OMS), condições sociodemográficas em que há mais casos de suicídio. O quadro da OMS de 2002 aponta as condições de ser solteiro e migrante, e fazer parte de estrato econômico extremo, como fatores de risco para o suicídio.
Isso pode demonstrar uma possível relação com a elevada taxa de suicídio no agrupamento da região central de São Paulo, onde certas características preenchem os requisitos desses fatores de risco: região de elevada renda (fazer parte de estrato econômico extremo), com bastantes solteiros e migrantes.
No entanto, não se pode afirmar que há uma relação direta entre o número de suicídios e esses aspectos, visto que a pesquisa de Bando não analisou as características das pessoas que se suicidaram, ou seja, foram analisados dois bancos de dados diferentes. “É difícil concluir algo, ainda tem muita coisa para se estudar. Mas (o estudo) já é uma evidência”, diz o pesquisador.
Divisão por regiões
Apesar de aproveitar dados da Prefeitura e do IBGE, Bando destaca que seu trabalho os desenvolveu com mais profundidade, pois “as taxas de suicídio nunca foram mapeadas na cidade e não há estudos recentes sobre os fatores de risco.”
O pesquisador, sob a orientação da professora da FFLCH Ligia Vizeu Barrozo, utilizou um programa de geoprocessamento para identificar o agrupamento de risco ao suicídio por determinadas regiões. Cada agrupamento podia ter no máximo 50% da população da cidade.
Ao analisar uma possível relação das taxas com os fatores de risco para suicídio, Bando se baseou também num estudo feito pelo sociólogo Émile Durkheim. “As variáveis (fatores de risco ao suicídio) foram parecidas com as que Durkhein estudou na França no final do século XIX.”, afirma Lígia sobre as semelhanças dos dois trabalhos.
Pelo estudo de Durkheim, Bando aproveitou a teoria do sociólogo sobre integração social para explicar os fatores de risco encontrados: “Uma das idéias dela (da teoria) diz que ‘o suicídio varia na razão inversa do grau de integração dos grupos sociais que a pessoa faz parte’”, explica Daniel, que diz que certos fatores de risco encontrados se encaixam nessa teoria. O pesquisador exemplifica com a situação da pessoa solteira, que tem maiores chances de não estar integrada a um grupo social, mais destacadamente uma família, o que pode propiciar o suicídio.
Contudo, a identificação dos católicos diverge com o levantamento da OMS que aponta o protestantismo como fator de risco ao suicídio. “A explicação se adapta à peculiaridade de São Paulo. No nosso caso, se observa que os evangélicos estão mais unidos entre eles”, ressalva Bando. Sua orientadora completa que esse aspecto dos evangélicos funciona como uma “ajuda social” contra o suicídio. “Já os católicos são mais dispersos, o que os põe, de acordo com a tese de Durkheim, numa categoria de risco”, diz Ligia.
O estudo de Bando e Ligia será publicado em forma de livro, com o lançamento previsto para o primeiro semestre de 2010 pela editora Humanitas/Fapesp.