Uso de empresas de papel pode configurar desvio de verba pública; especialista questiona até pagamento em parcelas
O Estado de S.Paulo
A gastança com a verba de gabinete dos vereadores de São Paulo está na mira da Polícia Civil e do Ministério Público Estadual (MPE). O Departamento de Polícia de Proteção da Cidadania (DPPC) abriu ontem inquérito para apurar a suposta formação de quadrilha para o desvio do dinheiro público. A Promotoria do Patrimônio Público e Social da capital também vai investigar o caso a partir de hoje.
A suspeita é de que o uso de empresas de papel serviu para fraudar prestações de contas que justificam o reembolso pelos vereadores de R$, 7,5 milhões por ano – cada um tem direito a R$ 14,8 mil por mês. "O inquérito ficará a cargo da Divisão de Crimes a Administração", afirmou o delegado Dejar Gomes Neto, diretor do DPPC.
A decisão de abrir a investigação foi tomada depois que o Estado revelou irregularidades nas empresas que deram aos vereadores notas fiscais que justificaram a utilização da verba de gabinete. A abertura do inquérito é o primeiro passo tomado pela polícia para acabar com a suposta farra nos gastos dos vereadores.
Fora da lei. Especialistas ouvidos pelo Estado apontaram outros problemas na prestação de contas dos vereadores. Um exemplo é o fracionamento de pagamentos para não ter de abrir licitações. Embora as parcelas mensais não excedam R$ 8 mil, como determina a lei 8.666/93, há ocasiões em que o valor pago a uma mesma empresa ao longo dos meses acaba superando o teto.
O advogado Adílson de Abreu Dallari, especialista em Direito Público, diz que a prática é ilegal. "Não se pode fracionar o valor total do serviço para driblar a necessidade de licitação", assinala.
Nesses casos, diz Dallari, o entendimento do Tribunal de Contas do Município (TCM) é de que se deve somar todas as parcelas para se chegar ao valor total do serviço prestado. Além disso, ele afirma que as contratações deveriam incluir as razões que levaram à dispensa de concorrência pública. "Toda dispensa de licitação tem de ser justificada. Estamos tratando de dinheiro público." / MARCELO GODOY, BRUNO TAVARES, DIEGO ZANCHETTA E RODRIGO BURGARELLI
PARA LEMBRAR
Após levantamento de três meses, o Estado revelou no domingo que a verba mensal disponível aos vereadores paulistanos para o reembolso com gastos correntes do gabinete – como gráfica, despesas de Correios e papelaria – é muitas vezes usada na contratação de empresas que não têm sede própria, telefone, site, e-mail nem registro de serviços prestados fora do Palácio Anchieta.