Afra Balazina
A regulamentação da Política Estadual de Mudanças Climáticas praticamente ignora o papel do transporte no corte das emissões de gás carbônico (CO2) em São Paulo. Nas 67 páginas do decreto há apenas três artigos que abordam o "transporte sustentável". O próprio governo admite que o setor é um dos principais desafios para que São Paulo atinja a meta de cortar 20% das emissões de CO2 até 2020, comparado aos níveis de 2005.
A lei, aprovada em novembro de 2009, levou sete meses para ser regulamentada. Ela prevê a "adoção de metas para a implantação de rede metro-ferroviária, corredores de ônibus, ampliação do serviço de transporte aquaviário urbano e ciclovias para trabalho e lazer". Porém, a regulamentação assinada na semana passada não avança nessas questões nem coloca números.
Especialistas na área ambiental dizem que o decreto pecou nesse ponto. Um dos artigos, por exemplo, é bastante genérico. Fala que "o transporte sustentável no Estado de São Paulo deverá priorizar investimentos que visem o aumento da participação de transportes ferroviário, hidroviário, cicloviário e dutoviário em relação ao transporte rodoviário".
Para Paulo Saldiva, médico da Universidade de São Paulo que estuda a poluição do ar, faltam metas mais claras de redução das emissões veiculares. Segundo ele, na área de transporte é possível obter tanto o corte de emissão de gases-estufa, que provocam o aquecimento global, como a redução da poluição do ar local, que causa doenças.
Guarany Osório, consultor especializado em ciências jurídico-ambientais, avalia que São Paulo saiu na frente ao assumir uma meta. E considera que o governo agora precisa se debruçar na questão complexa do transporte.
Rachel Biderman, do Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas, lembra que o Estado ainda não tem um inventário de emissões. "O decreto está incompleto. Após termos o inventário talvez seja preciso fazer outro para complementar." A lei ordena que o governo finalize a elaboração desse documento até novembro.
Em 2009, a Secretaria do Meio Ambiente informou que trabalha com estimativa de emissão de 100 milhões de toneladas de gases-estufa em 2005. A meta de 20% equivaleria, por exemplo, a cortar quase metade do que a indústria paulista emitiu de CO2 em 2006, quando o total chegou a 38 milhões de toneladas.
Casemiro Tércio Carvalho, coordenador de planejamento ambiental da secretaria, confirma que o transporte e a energia usada na produção industrial são os setores que mais emitem gases-estufa no Estado. Segundo ele, em abril de 2011 devem ser apresentadas as metas setoriais, incluindo as do transporte.
"O inventário nos dirá quais são os setores que mais contribuem com as emissões e qual é o potencial de redução de cada um. A meta não será igual para todos." Ele ressalta que o Plano Diretor de Desenvolvimento de Transportes (PDDT) tem como meta para 2020 diminuir o transporte rodoviário de 93% do total para 65%. Se isso ocorrer, haverá uma redução das emissões do setor em cerca de 40%.