LUCILA LACRETA
ESPECIAL PARA A FOLHA
A paisagem é um bem de usufruto coletivo. A Lei Cidade Limpa criou um paradigma no trato da paisagem de São Paulo ao proibir propaganda nos imóveis particulares. Hoje é possível instalar apenas anúncios indicativos, como nomes de lojas, e, mesmo assim, bem pequenos. Ao retirar outdoors e outras peças publicitárias gigantescas, a paisagem foi resgatada e a população passou a ver a cidade como ela é: surgiram edifícios interessantes, conjuntos arquitetônicos harmoniosos, enfim, uma cidade agradável e mais bem cuidada apareceu.
A lei foi tão bem sucedida que se tornou "case" internacional. Cidades estrangeiras convidaram técnicos da prefeitura para explicar o segredo de tão grande resultado em curto espaço de tempo. Porém, estamos prestes a perder essa qualidade conquistada. Nos próximos dias, começaremos a ver a famigerada propaganda eleitoral tomar conta da nossa cidade.
Diferentemente do que ocorreu na eleição passada, quando a propaganda ao ar livre foi proibida, agora a lei federal dará o tom: poderão ser instalados ao longo das vias cavaletes, bonecos, bandeiras e mesas para distribuição de propaganda eleitoral. Além disso, nos imóveis particulares, será permitida a instalação de faixas, cartazes, pinturas e inscrições de até 4 m2. Cabe lembrar que a lei de 2008, ainda em vigor, proibiu propaganda em muros, inclusive a propaganda eleitoral.
Num país onde o controle e a fiscalização deixam muito a desejar, ninguém garante que os abusos serão coagidos com firmeza. Mais uma vez, suas excelências -os candidatos- darão o mau exemplo ao não respeitar uma conquista dos paulistanos. Mais uma vez, nossos administradores se curvam diante de pressões esquecendo-se que foram reeleitos justamente por enfrentá-las.
Em vários países existe propaganda eleitoral em vias públicas, porém há delimitação muito clara dos poucos lugares onde pode ser instalada e em quantidade equivalente ao número de candidatos e seus partidos. Antevemos que assistiremos ao triste espetáculo da lei do mais forte a multiplicar a propaganda da sua candidatura aos quatro cantos, a competir pelos olhares dos eleitores. Há muitas formas de chegar ao eleitor e, certamente, emporcalhar a cidade não é a melhor delas.
Lucila Lacreta é arquiteta e urbanista e diretora do Movimento Defenda SP