Ex-secretário é a favor de decreto que libera prédios em área de preservação

 

Arquiteto e urbanista Jorge Wilheim diz que medida não contraria o Plano Diretor, que ajudou a elaborar; promotor do Meio Ambiente José Eduardo Lutti contesta a legalidade do decreto

Airton Goes airton@isps.org.br

O decreto do prefeito Gilberto Kassab, que autoriza a Companhia Metropolitana de Habitação (COHAB) e a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) a construírem prédios residenciais para a população de baixa renda no entorno das represas Billings e Guarapiranga e em outras áreas da cidade, divide opiniões em São Paulo.

O arquiteto Jorge Wilheim, ex-secretário municipal do Planejamento (da gestão anterior) e um dos elaboradores do Plano Diretor vigente, é favorável à medida. Já o promotor de Justiça do Meio Ambiente da Capital José Eduardo Lutti, mesmo considerando que a intenção seja boa, discorda do método utilizado pela Prefeitura.

Segundo Wilheim, o decreto de Kassab não contraria o Plano Diretor Estratégico da cidade. “Está havendo uma confusão, a medida não prevê construção nas APPs [Áreas de Preservação Permanente], onde não se pode construir nada mesmo”, explica. “O documento fala em ZEPAM ([Zona Especial de Preservação Ambiental] e isto [a construção de prédios para moradia popular] estava previsto no Plano Diretor”, complementa.

Ele entende que a verticalização se justifica porque o entorno das represas é ocupado de forma horizontal, por favelas. “Ou se faz prédios de cinco andares para estas pessoas ou elas terão que ser deslocadas para outras regiões, do outro lado da cidade, o que é desumano”, avalia. Na visão do arquiteto, se o decreto for bem implementado, a conseqüência será a redução da taxa de ocupação do solo nas áreas de mananciais. “Ao invés de dezenas de casas, ocupando várias quadras, haverá um prédio, dentro de um espaço menor.” 

O ex-secretario de Planejamento argumenta ainda que para construir os futuros condomínios será necessária a concordância da Secretaria Municipal do Verde e Meio Ambiente. “O objetivo é permitir a realocação dos moradores das áreas de mananciais, sem empurrá-las para fora da região onde vivem” reafirma.

Quanto à interpretação do Ministério Público de que o decreto estaria desrespeitando as leis estaduais sobre a Billings e a Guarapiranga, Wilheim pondera: “É até possível que isto esteja acontecendo, mas uma coisa é a lei no papel, outra é a realidade, a moradia das pessoas”. Embora se declare um defensor da legalidade, ele entende que neste caso específico, se existir um conflito entre a medida e a lei, “tem que se mudar a lei, pois não se pode mudar a realidade”. O arquiteto conclui, deixando clara sua posição: “Não vejo nenhum inconveniente neste decreto”.

O promotor de Justiça do Meio Ambiente da Capital José Eduardo Lutti tem uma visão diferente sobre o tema. “O que disciplina a utilização das áreas de mananciais são as leis estaduais da Billings e da Guarapiranga. Elas têm toda uma regulamentação de como podem ser ocupadas estas regiões, que não inclui a verticalização”, afirma.

Lutti lembra que a discussão e a elaboração das leis sobre a Billings e a Guarapiranga levaram anos. “Não dá agora, de uma hora para outra, vir um decreto que desconsidere todo esse trabalho.” O promotor compreende que a intenção da Prefeitura, com o decreto, até pode ser boa, mas ele desconfia dos resultados. “Como dizem, de boas intenções o inferno está cheio.”

O caso, na opinião de Lutti, requer um estudo aprofundado, que envolve o Plano Diretor e as duas leis relacionadas às represas. “A idéia de garantir uma área maior de permeabilidade do solo [que viria com a verticalização das moradias nas áreas de mananciais] é interessante, mas não podemos aceitar da forma que isto está sendo feito”, diz ele, reforçando a tese de que a legislação precisa ser respeitada.

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