“Pesquisa revela córregos ocultos que agravam cheias” – Folha de S.Paulo

 

Há sete anos, grupo mapeia em detalhes cursos d’água do subsolo paulistano

Além de ajudar na hora de destinar recursos contra as enchentes, estudo também tem finalidade ambiental

CRISTINA MORENO DE CASTRO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O córrego Água Preta nasce numa praça, passa pela rua Paulo Vieira, atravessa uma garagem, cruza ruas sem saída, corta a avenida Pompeia, segue por um beco atrás de várias casas e deságua pouco adiante, no Tietê.

Não por acaso, o bairro da zona oeste paulistana protagonizou várias cenas de enchentes no verão passado.

Era o Água Preta, enterrado e canalizado há meio século, assombrando a população. Seu mapeamento, em detalhes, é trabalho de um grupo de pesquisa da FAU-USP que há sete anos traça rotas de cursos d’água ocultos.

Os pesquisadores acreditam que a divulgação dos endereços por onde eles passam, além de ajudar na hora de direcionar investimentos públicos antienchete, também tem um fim ambiental.

"Quando se sabe que na porta de sua casa tem um córrego, a pessoa pensa duas vezes antes de jogar lixo na rua", afirma o coordenador da pesquisa, o arquiteto e urbanista Vladimir Bartalini.

A Prefeitura de São Paulo afirma possuir "todas as informações relevantes sobre os córregos da cidade", mas os mapas que torna públicos são bem mais genéricos.

O grupo já mapeou em detalhes outros seis córregos. "A cidade é uma grande bacia", diz Paulo Pellegrino, professor da FAU-USP.

Ele afirma que hoje estamos recebendo a herança por um modelo de drenagem que via como maior solução para as enchentes a canalização que levava as águas para bem longe e bem rápido.

"Isso gerou um nó, porque não tem mais para onde essa água ir. É grande a quantidade de água nos pontos mais baixos e ela recebe todo o lixo sem ser filtrado pela vegetação", afirma Pellegrino.

Não foram pensadas faixas sem ocupação ao lado de córregos, o que deixou os locais onde cheias são naturais totalmente impermeáveis.

"Há um confronto entre interesses imobiliários e problemas das enchentes, sem considerar que os córregos podem contribuir para a vazão dos rios maiores", diz Candido Malta Campos Neto, especialista em história do urbanismo e planejamento, da Universidade Mackenzie.

Esses córregos seguem quase invisíveis para a população que vive sobre eles, depois de tanto tempo desde que foram canalizados, já que o processo começou no final do século 19. E para o poder público, que tem material cartográfico "muito precário", segundo o professor.

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