“Problema de SP está no nº de veículos” – O Estado de S.Paulo

 

Especialista também considera o desequilíbrio entre economia e oportunidades o maior desafio hoje na cidade

Edison Veiga – O Estado de S.Paulo

Jorge Wilheim, arquiteto

Entre as pedras e as pessoas que formam a cidade, o arquiteto observa, analisa, interpreta. A cidade é, para ele, matéria-prima, cenário, suporte para criações e inquietações. Em São Paulo: Uma Interpretação (250 páginas, R$ 50, Editora Senac São Paulo), Jorge Wilheim desvenda a metrópole, da geografia aos desafios, passando, é claro, por seus protagonistas: os paulistanos.

Qual é o problema de SP?

O problema? Difícil dizer. Seus defeitos são as suas virtudes.

Como assim?

É uma cidade complexa, de um dinamismo muito grande, com uma população muito grande e criativa, mergulhada em um tipo de cultura que é de conquistadores urbanos. A cultura migrante, típica do Brasil, resulta do fato de o Brasil ter pouca gente em muito território. No caso de São Paulo, que cresceu de forma muito lenta durante os primeiros três séculos e meio e depois em grande velocidade, acabou se formando uma sociedade paulistana extremamente ativa, com muitos interesses sinérgicos e conflitantes. Mas isso traz inconvenientes. A infraestrutura sempre esteve em déficit em relação às demandas. Isso cria tensões e dificuldades na vida cotidiana, superadas de forma individual, cada um tentando resolver seus problemas. Mas muitas vezes essas soluções individuais conflitam com o interesse coletivo.

Como o paulistano pode se sentir mais parte da cidade?

É difícil ter uma compreensão global da cidade, porque ela é grande. Cada um de nós tem um sistema de vida que é repetido diariamente e utiliza parte da cidade, um conjunto de espaços, de edifícios, vias, meios de transportes. É um aproveitamento parcial da cidade.

Muitos passam a vida toda no mesmo bairro…

Sim, e isso não é defeito. É uma característica de cidades muito grandes, densas e ricas. Mas o paulistano sabe que está em um lugar de muitas oportunidades e dificuldades. Mesmo que ele não conheça toda a cidade, tem consciência de que está mergulhado em uma metrópole global, que reflete e influencia sua vida cotidiana. Mas o que ele usa da cidade é uma parte relativamente pequena. Isso é muito parecido em Nova York.

Mas lá a diferença entre os bairros é maior.

Porque lá você pode viver dentro do bairro, cada bairro é uma cidade. Acho que essa é a tendência de São Paulo também.

SP tem mais diversidade?

As metrópoles do mundo em geral atraíram populações de cidades diversas. Até certo ponto, portanto, é uma característica de toda cidade grande. Mas São Paulo tem uma característica própria, que é a facilidade com que as influências diversas se fundem.

Como compreender uma cidade tão complexa?

Sócrates dizia que a cidade é feita de pedras e pessoas. Você precisa ver a parte física e a parte dinâmica e humana. Para entender uma cidade, é preciso analisar e compreender as duas coisas e como elas agem uma sobre a outra.

Qual o maior desafio urbano?

A desigualdade. Enquanto tivermos desequilíbrio de economia e oportunidades, não conseguiremos ser desenvolvidos.

Há questões mais pontuais?

Habitação, moradia e mobilidade. Hoje, no trânsito, andamos na velocidade de um corredor de maratona. Claro que isso é altamente insatisfatório. O problema do crescimento da cidade não é tanto no adensamento de pessoas, mas no de veículos. Se essas pessoas tivessem um transporte público à altura das necessidades, o número de veículos poderia ser menor. Então existe um problema de padrão na divisão dos transportes que está defeituoso.

QUEM É

Nascido em 1928 na Itália, o arquiteto Jorge Wilheim mudou para São Paulo aos 12 anos. Em 1952, formou-se na Faculdade de Arquitetura do Mackenzie. Saíram de sua prancheta o Complexo do Anhembi, a sede do clube A Hebraica, o Sesi-Vila Leopoldina e o Hospital Albert Einstein. Também fez planos urbanísticos de cidades como Curitiba e Campinas. Ocupou vários cargos públicos.

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