Criança que não passa pela creche é altamente prejudicada, diz especialista

 

As “Consequências pedagógicas e sociais da falta de vagas em creches e EMEIs” foram debatidas pela professora Maria Stela Graciani no 1º Seminário de Educação Infantil da Cidade Ademar e Pedreira

Airton Goes airton@isps.org.br

“A falta de creche é altamente prejudicial para a vida da criança.” A afirmação é da professora Maria Stela Graciani, coordenadora do Curso de Pedagogia e do Núcleo de Trabalhos Comunitários da PUC-SP. Ela foi uma das debatedoras do 1º Seminário Educação Infantil da Cidade Ademar e Pedreira.

No evento, realizado sábado (26/3), Maria Stela coordenou a sala temática “Consequências pedagógicas e sociais da falta de vagas em creches e EMEIs” – uma das quatro salas temáticas do seminário. Segundo ela, na faixa etária de zero a três anos a criança já está elaborando e construindo sua identidade, personalidade e caráter. “Na creche, ela adquiri os elementos fundamentais para que no futuro possa respeitar os outros e ter um convívio social saudável.”

A professora destaca a importância do ensino nesta fase e cita como exemplo uma criança que tira o brinquedo da mão de outra. “Dizer para a que tomou o chocalho, que a outra já estava com o brinquedo e que ela poderia procurar outro, é parte desse processo educativo.” 

Para a coordenadora do Curso de Pedagogia da PUC-SP, a criança excluída do ensino infantil, quando chega no 1º ano do ensino fundamental, apresenta uma defasagem de aprendizado em relação à que teve oportunidade de passar pela experiência. “Ela vai ter um olhar diferente e a defasagem poderá ser percebida na relação com o outro e até na coordenação motora”, explica.

A defasagem no aprendizado, na avaliação da professora, pode provocar discriminação. "Um aluno que não passou pela educação infantil vir a ser chamado de burro”, exemplifica. Maria Stela lembra que até jogar bola e brincar de “amarelinha” são coisas aprendidas.

Em função do grande número de crianças sem acesso ao ensino infantil – na cidade de São Paulo o déficit de vagas em creches e de EMEI é de aproximadamente 120 mil –, a especialista defende a necessidade de se discutir formas de impedir que estes alunos sejam ainda mais prejudicados no ensino fundamental.

Outro fator que reforça a importância da creche para a sociabilidade e o aprendizado das crianças, em sua opinião, é a falta de espaços na comunidade. “Não tem mais parquinho e os locais para brincar estão cada vez mais restritos”, constata.

Maria Stela lamenta a “despreocupação” histórica do poder público com a educação infantil. “A pesquisa [sobre o assunto], muitas vezes, é guardada e não utilizada para a educação.”  

Preocupada com as declarações do ministro da Educação, Fernando Haddad, e do secretário municipal de Educação, Alexandre Schneider, durante o 1º Seminário de Educação Infantil da Cidade Ademar e Pedreira, ela entende que a situação só ira mudar se houver vontade política e a sociedade se mobilizar para enfrentar o problema. Nesse sentido, a professora elogiou o seminário como uma boa iniciativa para organizar e mobilizar a população local.

O ministro Fernando Haddad disse aos participantes do seminário que o governo federal dispõe de programa e de recursos para, em parceria com os prefeitos, construir 6 mil creches em todo o país. Segundo ele, entretanto, a Prefeitura de São Paulo ainda não assinou nenhum convênio com a União para receber recursos do programa.

Alexandre Schneider, por sua vez, argumentou que faltam terrenos na Cidade Ademar e Pedreira para a construção dos equipamentos de educação infantil. Outra justificativa do secretário municipal de Educação para a dificuldade de se ampliar o número de vagas em creches e EMEIs é a legislação. Ele se comprometeu a retornar à região, daqui a 90 dias, para ouvir as demandas específicas das organizações e dos moradores que participaram do seminário.

De cada grupo de 100 crianças que necessitam de vaga em creche na região da Subprefeitura da Cidade Ademar (que inclui o distrito da Pedreira), apenas 45 conseguem matrícula.

Para organizadores, seminário fortaleceu sociedade local

Em uma avaliação preliminar, os organizadores do 1º Seminário de Educação Infantil da Cidade Ademar e Pedreira colocam a qualidade dos debates como um dos pontos positivos do encontro. O comparecimento do ministro e do secretário municipal de Educação, além do número de participantes – 252 pessoas se inscreveram para o evento –, também merecem destaque na análise. 

“A vinda do ministro [Fernando Haddad) em nosso bairro foi muito importante, pois, na visão dos professores da região, ele se tornou uma pessoa mais próxima”, opina Erika Pampolin, diretora da Escola Estadual Professora Yolanda Bernardini Robert e participante da organização do seminário.

Ela relata que, após o evento, várias pessoas vieram perguntar quais as propostas que poderão ser apresentadas ao secretário (Alexandre Schneider), que prometeu se reunir com as entidades e os moradores da região daqui a 90 dias.

Garantindo ter ouvido “só elogio” sobre o seminário, Erika conta que o evento mexeu com a sociedade local. “Mostrou que a gente precisa organizar outros eventos desse tipo e chamar os representantes do poder público para dialogar sobre os problemas da região”, comemorou.

Outra participante da organização animada com o resultado do encontro é Vania Correia, integrante da Pastoral do Menor e do Fórum Social da Cidade Ademar e Pedreira. “A primeira coisa positiva foi provar para a sociedade local a força que ela tem quando está organizada”, enumera, antes de continuar: “Outra coisa importante foi mobilizar a população em torno do tema [educação infantil], pois as pessoas ficam reclamando ou tomando medidas individuais e um evento, como este, nos mostra que temos de atuar de forma coletiva”.

Vânia aponta, ainda, para a continuidade do movimento. “Está aberto um canal de diálogo com o poder público. Cabe, agora, às organizações locais cobrarem para que a reunião prometida pelo secretário municipal de Educação realmente aconteça.”

 

Compartilhe este artigo