Flávio Aquistapace
“Não podemos nos dar o luxo de primeiro destruir o planeta e depois ver como fica. Precisamos ser mais sóbrios e eficazes no uso dos recursos renováveis”. A declaração, vinda do ecossocioeconomista e decano professor da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais de Paris Ignacy Sach, aconteceu nesta quinta (29/3) durante o debate “O papel do investimento social na construção de cidades sustentáveis”, numa das maiores salas destinadas à programação do 7º Congresso GIFE, seminário realizado durante esta semana no Hotel Sheraton, em São Paulo.
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[Investimento social privado é o repasse voluntário de recursos privados de forma planejada, monitorada e sistemática para projetos sociais, ambientais e culturais de interesse público.
Fonte: GIFE]
Mediante uma atenta platéia, o professor – nascido na França -, uma das mais respeitadas vozes quando o assunto é desenvolvimento sustentável, insistiu na importância de se reposicionar as bases sob as quais se pratica a sustentabilidade hoje no mundo. Para ele, ainda “poucos países pensaram na sustentabilidade social e ambiental conjuntamente”.
No caso ele se refere a como encontrar formas de desenvolvimento urbano sem explorar o campo ou sem criar novos bolsões de miséria dentro das próprias cidades – “em favelas ou nas partes velhas da cidade”. Sach afirmou que o “desenvolvimento urbano não deve acontecer às custas do campo”.
Além disso, ele também destacou a importância de se alcançar uma coalizão internacional soberana especialmente dedicada ao assunto, propondo que as soluções sejam pensadas de forma integrada. “Precisamos redefinir as estratégias de desenvolvimento. Cidades sustentáveis devem fazer parte de um mundo sustentável”, defende.
Para que isso aconteça, segundo ele, o planejamento é imprescindível. “Não dá para deixar tudo nas mãos do mercado, sem planejar. Estamos rejeitando o planejamento na época do computador”, diz.
Sua proposta é ambiciosa. Ainda que reconheça a falta de um debate democrático genuíno entre governantes, empresários, trabalhadores e sociedade civil organizada, ele defende uma participação mais atuante por parte do Estado que garanta e regulamente estratégias sustentáveis nacionalmente a longo prazo.
Estas medidas seriam viabilizadas segundo a criação de um fundo de cooperação internacional, constituído a partir da doação de 1% do PIB de cada país, mais a tributação sobre a emissão de carbono e a cobrança de pedágio sobre a utilização de ares e oceanos.
Outro aspecto fundamental seria a criação de uma rede efetiva de cooperação tecnológica-científica organizada por semelhanças entre ecossistemas. “Somos ou não capazes de garantir um fundo internacional socialmente inclusivo e ambientalmente sustentável?”, provoca.
Observatórios
Para falar de experiências práticas promovedoras da qualidade de vida e da sustentabilidade em grandes cidades compareceram os representantes das redes Nossa São Luís e Nossa São Paulo, Eduardo Lago e Maurício Broinizi, respectivamente.
Eduardo Lago disse que o observatório social de São Luís, responsável por definir e monitorar índices de sustentabilidade municipais preza pela “difusão do conceito de responsabilidade social empresarial com investimento social privado em crianças e na educação”.
De acordo com ele, a rede existe para “cobrir deficiências do poder público”. Ainda segundo Lago, o grande desafio é despertar no cidadão interesse em participar das decisões políticas. “Uma pergunta que sempre surge é por que o cidadão não quer participar de um sistema que lhe é beneficiário?”, argumenta.
Para Maurício Broinizi, da Nossa São Paulo, um dos principais objetivos da rede – que anualmente mede a satisfação dos moradores da cidade e também o nível da confiança no poder público por meio de uma pesquisa de opinião – é contribuir para a autonomia e independência da sociedade civil sobre o Estado e sobre os partidos. “Batalhamos pela transparência dos indicadores. É um projeto de médio a longo prazo”, diz.
Broinizi ressaltou a necessidade de se aperfeiçoar a “sustentabilidade política”, consolidando a participação democrática nos espaços coletivos e públicos da cidade. Ele também disse que com a repercussão dos dados das pesquisas, tem-se contribuído para uma outra “relação com os bens materiais de existência, agora que descobrimos que a natureza é finita”.
GIFE
Com periodicidade bienal, o seminário GIFE – Grupo de Institutos Fundações e Empresas – reúne aproximadamente mil lideranças nacionais e internacionais para sinalizar uma direção estratégica para o investimento social privado no Brasil, apresentado sob uma perspectiva global. A conferência de abertura deste ano foi do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o tema foi o atual estado do investimento social no Brasil e as responsabilidades do Estado, da sociedade civil e do empresariado.