“Motorista que ameaçar ciclista vai ser multado a partir de hoje” – Folha de S.Paulo

Fiscalização da CET será maior em pontos com altos índices de acidentes, caso da Paulista

Em apenas 20 minutos, especialista constata seis infrações de trânsito em um único cruzamento da cidade

VANESSA CORREA
DE SÃO PAULO

Os motoristas que não respeitarem quem pedala pelas ruas da capital serão multados a partir de hoje.

Dentro da nova campanha da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) a favor do ciclista, os agentes de trânsito foram treinados a usar três pontos do CTB (Código de Trânsito Brasileiro).

Aproximar-se demais da bicicleta, fechá-la ao virar à direita ou ultrapassá-la sem diminuir a velocidade será passível de multa.

A polêmica norma de respeitar os 1,5 m de distância do ciclista não será aplica neste primeiro momento. Segundo a CET, não há como medir objetivamente a distância.

As multas com base em outros artigos do código de trânsito, adaptadas para a proteção dos ciclistas, poderão ser aplicas em todas as vias da cidade a partir de hoje.

Mas a fiscalização será mais intensa nos pontos onde foi maior o número de acidentes com ciclistas desde 2009. Entre eles, as avenidas Paulista e Brigadeiro Luís Antônio, com 15 e 18 ocorrências, respectivamente.

André Pasqualini, ciclista e consultor de mobilidade urbana que treinou os marronzinhos, acompanhou a Folha em três pontos da cidade onde há grande fluxo de bicicletas na sexta-feira.

A reportagem ficou em cada local por 20 minutos.

Na avenida Jabaquara com a Fagundes Filho, perto da estação São Judas do metrô (zona sul), seis motoristas poderiam ter sido multados, segundo Pasqualini. Pelo local, passaram 18 bicicletas.

Dois ciclistas foram ultrapassados por carros em alta velocidade. Quatro motoristas não deram a preferência na conversão à direita.

Na Paulista, por onde circularam dez ciclistas (algumas na calçada, o que é considerado infração), Pasqualini não constatou problemas.

"Quando há trânsito, é mais difícil de ser perigoso para o ciclista", diz o consultor. "É que os carros trafegam com velocidade mais baixa".

Na ciclorrota de Moema (zona sul), no cruzamento entre a avenida Ibirapuera e a Rouxinol, houve apenas uma infração. Onze ciclistas passaram pela via.

A maioria partia no cruzamento antes de o semáforo abrir, com medo de serem atropelados pelos carros que iriam fazer a conversão à direita. Apenas uma manobra sujeita a multa foi observada.

O único ciclista que esperou o semáforo abrir foi fechado perigosamente por um carro que fazia a conversão à direita, e teve até de sair da ciclorrota (que fica à direita da via) para não ser atingido.

"Outro dia quase fui atropelado porque não sai no vermelho", disse Lorenzo Bagini, 35, ciclista que estava no mesmo ponto na sexta.

Para Pasqualini, no último ano, os motoristas passaram a respeitar mais as bicicletas.

 

ANÁLISE

Segurança de ciclistas não depende só das multas
VAGUINALDO MARINHEIRO
DE SÃO PAULO

A multa a ser aplicada aos motoristas que colocarem os ciclistas em risco irá aumentar a segurança no trânsito ou apenas a arrecadação da Prefeitura de São Paulo?

Não há dúvidas quanto aos cofres públicos, já na questão segurança…

Cidades bem mais amigáveis para os ciclistas, como Amsterdã ou Copenhague, sabem que é muito difícil a convivência entre pessoas em quatro rodas e outras com duas.

Por isso, tentam sempre que possível separá-las.

Constroem ciclovias exclusivas, com sinais próprios de trânsito, ou vetam os carros em determinadas ruas.

Com isso, dão real segurança aos ciclistas e, outro ponto importante, fazem com que se sintam seguros, o que acaba funcionando como estímulo ao uso das bicicletas.

A soma de motivos geográficos (excesso de subidas) com a falta de segurança faz com que poucos ainda vejam as bicicletas como meio de transporte em São Paulo.

Um estudo realizado pelo Metrô revelou que menos de 1% das viagens na capital paulista são feitas com as "bikes". A grande maioria na periferia.

Em Amsterdã, esse número chega a 40%.

A cidade é considerada a mais segura no mundo para pedalar, e é possível também ir quase sem riscos para municípios vizinhos. Não à toa, a Holanda tem mais bicicletas que habitantes.

Muitas outras cidades preferem apenas pintar faixas nas ruas e destiná-las às bicicletas, sem uma separação por muros ou canteiros.

O que pode parecer uma vantagem, às vezes não é.

Estudos feitos por universidades do Reino Unido constataram que os motoristas tendem a manter os carros mais próximos das bicicletas quando elas estão nessas ciclofaixas.

Outro ponto contestado por pesquisas se refere ao uso de capacetes.

Uma delas, também britânica, mostrou que motoristas se aproximam mais dos ciclistas com capacete do que daqueles que pedalam sem.

É possível inferir a razão: sem capacete e sem faixas demarcadas, os ciclistas parecem mais frágeis aos olhos dos motoristas, que, civilizados, se veem na obrigação de prestar mais atenção neles.

Com ou sem multa. 

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