“Radar Rio+20 debate Cidades Sustentável” – Radar Rio+20

 

por Bruno Toledo – GVces

A discussão sobre modelo de desenvolvimento e meio ambiente passa obrigatoriamente pela forma como os centros urbanos são organizados e geridos. É nas cidades – que hoje concentram a maior parte da população mundial – que as decisões políticas são tomadas, e elas são o terreno mais fértil para uma mudança de paradigma sobre desenvolvimento, tanto pelos seus inúmeros problemas quanto pela sua importância econômica e social. Construir cidades mais sustentáveis e mais inclusivas é um passo importante rumo a uma nova concepção de desenvolvimento.

Tendo em vista a importância das cidades e do nível local na solução de problemas e desafios ambientais, o Radar Rio+20 promoveu seu primeiro debate nesta quinta-feira, 29 de março, no Salão Nobre da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo. Iniciativa do GVces com o Vitae Civilis, o Instituto Socioambiental (ISA) e a Rádio Estadão/ESPN, o Radar Rio+20 acompanha as discussões, os temas e as notícias referentes à próxima Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável que ocorrerá no Rio de Janeiro no próximo mês de junho. Mediado por Paulina Chamorro, da Rádio Estadão/ESPN, o debate reuniu o economista e professor da PUC-SP, Ladislau Dowbor, o empresário Oded Grajew, idealizador do Fórum Social Mundial e fundador do Movimento Nossa São Paulo, e a pesquisadora Cecília Ferraz, coordenadora do programa Desenvolvimento Local do Gvces.

Para Oded Grajew, o modelo atual de cidade reflete o esgotamento do paradigma de desenvolvimento econômico das últimas décadas. "Nós precisamos mudar o modelo de desenvolvimento, porque a ciência nos mostra que estamos esgotando os recursos do planeta e aumentando a desigualdade entre as pessoas. E os grandes desafios estão nas cidades, onde a maioria da população mundial vive atualmente”, disse Grajew. Para ele, no entanto, esta mudança não é algo simples, “pois existem muitos interesses em jogo, de grupos que se beneficiam do modelo atual; por exemplo, se você privilegia um sistema de transporte público amplo e eficiente, você acaba enfrentando os interesses da indústria automobilística e das construtoras, que pelo peso econômico acabam tendo grande influência sobre as decisões políticas”.

Nesta linha, Ladislau Dowbor apontou que o principal problema por trás dos desafios da vida urbana moderna é a governança deste espaço urbano. "Nosso problema não é falta de recursos, mas sim as falhas na governança, na capacidade de utilizar eficientemente os recursos que temos; como pode uma cidade com PIB per capita de 32 mil reais como São Paulo ainda ter esgoto a céu aberto?", argumentou . “Quando uma cidade com tantos recursos como SP não consegue resolver questões elementares como saneamento e transporte, temos um problema de governança", completou o economista.

A cidade é um importante fator dentro de um modelo de desenvolvimento pelo seu papel enquanto polo de consumo, e naturalmente este papel de consumidor coloca os espaços urbanos como um ponto de partida para mudanças neste modelo. Segundo Grajew, "85% dos brasileiros vivem nas cidades; é nas cidades onde os produtos rurais, ou mesmo os produtos da Amazônia, são consumidos; dessa forma, naturalmente as cidades possuem um grande poder, sendo o lugar onde as decisões importantes são tomadas". Para Dowbor, mudar o consumo não significa torná-lo austero, mas sim inteligente: “O consumo não pode continuar o máximo possível e descartando aquilo que não nos serve em lixões. Precisamos consumir inteligentemente, com bom senso".

Uma nova governança local

É no nível local onde as pessoas possuem maior capacidade de agir e de participar do processo decisório político. Consequentemente, uma reforma na governança da cidade passa pela participação de seus cidadãos e pelos instrumentos com os quais eles podem analisar os problemas comunitários e vislumbrar possíveis soluções. Um exemplo apresentado durante o debate foi o trabalho desenvolvido pelo programa Desenvolvimento Local do GVces, sob a coordenação de Cecília Ferraz, na cidade paraense de Juruti.

Em 2005, a empresa mineradora Alcoa convidou o GVces a apresentar uma proposta de desenvolvimento local de longo prazo para as comunidades de Juruti, onde planejava iniciar a exploração de minas de bauxita. Na época, a cidade possuía cerca de 30 mil habitantes, e tinha como atividades econômicas principais a agricultura de subsistência e a pesca. A preocupação era que as mudanças decorrentes das operações da mineradora não representassem problemas sérios para a comunidade local, e que servissem como um incentivo para um desenvolvimento local de longo prazo.

A proposta desenvolvida pelo GVces, “Juruti Sustentável”, deu origem a formulação e sistematização de indicadores que avaliassem aspectos da cidade, como criminalidade, serviços de saúde, educação, entre outros setores relevantes da comunidade. Para Cecília Ferraz, a participação da comunidade foi fundamental para estabelecer estes indicadores. "Perguntamos às pessoas o que era desenvolvimento para eles, o que deveria ser monitorado neste desenvolvimento, e como poderíamos monitorá-lo".

O envolvimento da comunidade no processo de construção destes indicadores não foi importante apenas para torná-los empiricamente mais robustos, mas também para que se tornassem instrumentos importantes de governança local. "Para nós, a dimensão destes indicadores cresceu quando vimos a importância que eles tinham adquirido aos olhos dos membros daquela comunidade; as pessoas começaram a se mobilizar em torno das informações dos indicadores, a fazer pesquisas, trabalhos, propostas de política públicas", disse (eu prefiro colocar o nome quando se trata de uma moça, mas fica a seu critério). As informações dos indicadores serviram para conscientizar as comunidades de Juruti de seus desafios coletivos, e permitiram desenvolver caminhos próprios para o enfrentamento e resolução destes problemas e, assim, mudar a realidade de forma conjunta.

Informação e transformação da realidade

Para Cecília Ferraz, o envolvimento da população em torno de soluções para os problemas comuns é fundamental. “Para que estes indicadores sejam de fato uma ferramenta de governança, a população precisa se sentir envolvida; este esforço não é pequeno, mas a mobilização da população em torno da solução de problemas é possível”, argumenta .

A informação é um elemento importante para mobilizar as pessoas em torno de seus problemas comuns e de possíveis soluções. “Precisamos nos apropriar da cidadania para mudar as coisas. Não adianta esperar por um salvador da pátria, alguém que terá a solução mágica para resolver o problema”, disse Ladislau Dowbor. Para Oded Grajew, há uma cultura de conformação com os problemas. “É necessário que tenhamos indignação diante da situação, como forma de modifica-la".

Próximo debate: No próximo dia 23 de abril, o Radar Rio+20 promoverá seu segundo debate, com o tema Energia, novamente no Salão Nobre da FGV-SP, no período da manhã.

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