“Carro, sim, mas sem taxa de inspeção” – Valor Econômico


Por Raphael di Cunto, Sérgio Ruck Bueno e Murillo Camarotto

A última edição de pesquisa realizada anualmente pela Rede Nossa São Paulo, uma organização não governamental, revelou que o percentual de paulistanos que usam automóvel "quase todos os dias" cresceu de 15% em 2007 para 23% em 2011. Sufocada pelos congestionamentos, São Paulo foi a primeira cidade do país a implantar a inspeção veicular. O apelo da causa ambiental faz com que a medida seja copiada por outros municípios. Mas os candidatos a prefeito divergem sobre a cobrança da taxa.


O atual contrato da inspeção veicular paulistana foi assinado pelo ex-prefeito e hoje deputado federal Paulo Maluf (PP) em 1996, mas passou dez anos na gaveta. O serviço começou a funcionar em 2007, pelas mãos do prefeito Gilberto Kassab (PSD). A taxa paulistana, de R$ 44,36, é a principal crítica dos candidatos de oposição a Kassab. O licenciamento do carro só pode ser feito após a realização da inspeção e o não cumprimento implica em multa de R$ 550. No Rio de Janeiro, a inspeção obedece a lei estadual e inclui a verificação de itens de segurança.

O candidato José Serra (PSDB) diz que é favorável à inspeção por melhorar a qualidade do ar. Aliado de Kassab, ele afirma que manterá a taxa. "Se não existisse, todos pagariam pelo serviço, mesmo os que não têm carro." A inspeção paulistana não prevê averiguação dos itens de segurança e Serra já antecipa que não há previsão no contrato para realizá-la. Já Gabriel Chalita (PMDB) lembra que há um projeto no Congresso Nacional para regulamentar a verificação dos itens de segurança. "Como é uma lei federal, caso seja aprovada, deverá ser cumprida em território 
municipal." Para o candidato, a inspeção em São Paulo é cara. Se eleito, pretende acabar com o monopólio da empresa Controlar sobre o serviço.

Celso Russomano (PRB) concorda com a inspeção, mas diz que extinguirá a taxa. "Não pode ser cobrado do dono do veículo por esse monopólio; tudo na mão de uma única empresa." Ele pretende usar o IPVA para custear o serviço, incluindo a inspeção dos itens de segurança. "Temos uma quantidade enorme de acidentes de trânsito por problemas com luzes freios e amortecedores", afirma.

Fernando Haddad (PT) defende a inspeção ambiental, mas discorda da forma como é feita. "Cobra-se uma taxa abusiva para uma inspeção sumária e que não atende a parâmetros de combate a poluição e redução de riscos de acidente", diz. Ele promete acabar com a taxa e custear o serviço com a arrecadação de IPVA e rever os prazos para vistoria, para que os carros recém-saídos das fábricas não sejam obrigados a passar por inspeção.

Também favorável, Soninha Francine (PPS) defende mais rigor com carros que já estão "fora da lei". Para ela, embora a prefeitura possa rever o valor da taxa, não seria justo extingui-la. "O custo seria dos cofres públicos e até o aposentado sem carro ou o trabalhador desempregado pagariam", diz. 

Com uma frota de 731,9 mil veículos, Porto Alegre não se enquadra na lei 

federal 20.203/01, que autoriza os municípios com frota de 3 milhões ou mais de veículos a estabelecer programas e normas de controle de emissões. O governo do Estado, porém, enviou no ano passado à Assembleia Legislativa projeto de lei que institui a inspeção veicular ambiental anual no Rio Grande do Sul, a começar pelas cidades da região metropolitana da capital, amparado na resolução 418/2009 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).

O projeto admite parcerias com as secretarias municipais de saúde para avaliar danos causados pelas emissões e prevê cobrança de uma taxa de R$ 54,83. Parte dos recursos arrecadados seria repassada aos municípios, mas a proposta sofre críticas até dos partidos da base do governo. Os candidatos se dividem ante a possibilidade de abraçar uma causa impopular. "[A inspeção] representa segurança, mas o custo tem que ser adequado", diz o prefeito José Fortunati (PDT), que concorre à reeleição. Para ele, a taxa proposta pelo Estado supera os gastos com o serviço. Segundo conta, a prefeitura implantou um sistema próprio de inspeção de emissões e itens de 

segurança, mas os testes não são obrigatórios.

"Estamos fora, porque o projeto só serve para elevar arrecadação e pegar só carros velhos", diz o candidato do PSOL, Roberto Robaina. "É um projeto meramente arrecadatório", reforça o candidato do PSTU, Érico Corrêa. Já o deputado estadual Adão Villaverde, que concorre pelo PT, mesmo partido do governador Tarso Genro, admite parceria com o Estado desde que a contrapartida ao município seja adequada. "Sempre que se propõe uma taxa há rejeição, mas as pessoas precisam enxergar que algumas coisas são positivas e devem ser feitas", diz. Embora reconheça que o projeto é "antipático", o candidato do PSDB, Wambert Di Lorenzo, também aceitaria parceria com o Estado. "Mas poderíamos pensar em um modelo menos oneroso, incluindo a taxa no IPVA", destaca.

A necessidade de mudar o conceito de locomoção urbana e fiscalizar a qualidade dos transportes já começa a atrair forças da comunidade e também do setor produtivo A Confederação Nacional da Indústria (CNI) preparou um estudo para ser encaminhado à presidente Dilma Rousseff que trata sobre a queda de produtividade na indústria como consequência do tempo que o trabalhador perde no deslocamento.

"A indústria está preocupada porque a baixa produtividade provoca redução na atividade econômica", disse recentemente o vice-presidente da CNI, José Mascarenhas. Segundo a Rede Nossa São Paulo o tempo médio gasto diariamente pelo paulistano em locomoção pela cidade está em uma hora e 42 minutos, mas 19% da população gasta mais de quatro horas nos 
deslocamentos diários.

Em Recife, um grupo criado nas redes sociais, batizado de "Direitos Urbanos", recentemente convocou um movimento de ocupação da Avenida Agamenon Magalhães, um dos principais corredores da capital pernambucana, contra a construção de dois grandes viadutos perpendiculares à avenida, projeto em análise pelo governo estadual, mas que encontra resistência entre os que acreditam que a obra irá representar uma tragédia urbanística.

A frota do Recife cresceu acima da média nacional nos últimos dois anos. Os crescentes congestionamentos apresentaram aos recifenses experiências já conhecidas dos paulistanos. Trechos curtos, de menos de cinco quilômetros, podem levar mais de uma hora para serem vencidos. Em alguns locais do centro não há vagas na rua e os estacionamentos privados são escassos. Para piorar o quadro, a prefeitura dispõe de apenas dois guinchos para atender 
toda a cidade.

Esta é a primeira reportagem da série "Mobilidade nas Eleições"
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