Programas de Haddad e Serra na TV e no rádio precisam tratar da cidade, de seus problemas e das propostas para resolvê-los
Começa amanhã a propaganda eleitoral do segundo turno na cidade de São Paulo. Fernando Haddad, do PT, e José Serra, do PSDB, disputam a preferência de uma capital que, em sua complexidade, expressão demográfica e peso econômico, é comparável a Estados ou mesmo a países.
A população municipal, de 11,5 milhões de habitantes, se equipara à da Bolívia e supera a de Portugal. O PIB da cidade anda pela casa dos R$ 500 bilhões, equivalente ao de nações como Israel e Egito.
A magnitude dos problemas também impressiona. A extensão das linhas de metrô é de apenas 74 km; na Cidade do México chega a 200 km; em Madri, a 280 km. O tempo de escolaridade médio da população é de 7,6 anos; na China, alcança 12 anos. Nas demais áreas, precariedades análogas poderiam ser facilmente apontadas.
Embora as soluções nem sempre dependam apenas do poder municipal, o prefeito é o responsável pela definição de políticas e propostas para a cidade. O que os candidatos planejam fazer?
Na área de transporte público, por exemplo, os contratos de concessão de ônibus irão vencer no ano que vem. Que regras devem guiar a nova licitação? Haverá, como é necessário, racionalização dos percursos, melhoria da qualidade da frota e articulação com as linhas de trem e metrô? E qual será o critério de reajuste das tarifas?
Os corredores de ônibus prometidos -mas não realizados- pela atual gestão serão, enfim, construídos? Em que prazo? Os repasses municipais para o Metrô vão continuar? Em que condições?
São Paulo precisa de estacionamentos e garagens subterrâneas em áreas estratégicas, como na vizinhança de terminais de ônibus, estações de trem e de metrô. Que modelo será adotado?
O atual Plano Diretor, de 2002, venceu, e um novo terá de ser aprovado. Ainda que pareça algo abstrato, distante do dia a dia da população, trata-se de ferramenta essencial para orientar o desenvolvimento urbano na próxima década.
As atuais linhas mestras serão mantidas? Quando e como a ideia, já formulada, de oferecer mais trabalho na periferia e mais moradia social no centro vai se transformar em realidade? A atual política de ocupação da cracolândia e o projeto da Nova Luz serão mantidos?
Na área administrativa, qual será a linha de gestão? O modelo das organizações sociais (OSs) tem dado bons resultados, embora se ressinta de fiscalização mais efetiva. A ideia é aperfeiçoá-lo ou voltar à gestão estatal direta? O funcionalismo precisa ser ampliado?
Na saúde, a atual administração prometeu três novos hospitais. Eles serão construídos? Em que prazo? Haverá verba pública suficiente ou serão feitas parcerias com o setor privado?
Tema polêmico na educação, a progressão continuada será preservada ou se pretende reavaliar o mecanismo, que faz sentido na teoria, mas nem sempre dá bons resultados na prática? Os dois candidatos pretendem aumentar o tempo de permanência dos alunos nas escolas -como isso será feito, dentro de que cronograma, a que custo?
Quanto aos CEUs, lançados pela prefeita Marta Suplicy (2001-2004), foram bem acolhidos pela população a ponto de terem sido adotados nas gestões seguintes. Novas unidades devem ser construídas ou já é hora de optar por propostas menos custosas? E o deficit de creches, afinal, será sanado?
O eleitor paulistano consagrou no primeiro turno as duas principais forças políticas, PT e PSDB, mas o fez de maneira sinuosa e hesitante. Deu sinais de insatisfação com as opções tradicionais ao manter o candidato Celso Russomanno (PRB) durante semanas como líder nas pesquisas.
É razoável ver nesse movimento a inclinação por uma "terceira via", menos contaminada pelas rixas e vícios da velha política e mais promissora para a resolução de problemas práticos.
Não se trata de reivindicar, ao se constatar tal demanda, uma disputa meramente técnica -e despolitizada. A expectativa, entretanto, tratando-se de pleito municipal, é que os postulantes enfrentem as questões mais candentes do cotidiano e do futuro de São Paulo.
Embora a maioria dos problemas comporte diversas soluções, os candidatos, talvez pelo esforço de pasteurização dos publicitários, evitam assumir o confronto direto entre as propostas. Em uma democracia mais madura, todavia, as divergências podem ser mais nítidas, e as opções, mais transparentes.
Talvez seja exigir demais, quando se sabe que o candidato tucano chegou ao segundo turno sem ter se dado ao trabalho de apresentar um programa de governo -o que deve fazer somente amanhã.
As questões aqui levantadas são apenas algumas das inúmeras que dizem respeito à vida dos paulistanos. Há muitas outras, que vão da elevada dívida pública à remodelagem das subprefeituras.
Não falta assunto. Falta debate.