Em clima tenso, candidatos participaram, cada um em um horário, de encontro promovido pela Rede Nossa São Paulo. Tucano reagiu a críticas contumazes de ex-presidente: "Lula é o maior atacador do Brasil”
Carolina Freitas
Mesmo sem estar frente a frente, os candidatos a prefeito de São Paulo, José Serra (PSDB) e Fernando Haddad (PT), entraram em confronto nesta segunda-feira, em evento promovido pela Rede Nossa São Paulo. Eles trocaram farpas, sobretudo, em relação ao tema saúde. Serra acusa Haddad de querer dar fim às parcerias entre a prefeitura e organizações sociais vinculadas a hospitais particulares. O petista nega a intenção, afirma que quer apenas fiscalizar esses contratos e diz que Serra usa contra si a “tática da desinformação”. O tucano, por sua vez, reagiu a críticas contumazes do maior cabo eleitoral de Haddad: "Lula é o maior atacador do Brasil.”
Os dois foram convidados a falar sobre suas propostas diante de uma plateia de cerca de 200 pessoas – cada um a seu tempo. O primeiro a ser sabatinado foi Haddad. Em seguida, veio Serra. Os dois chegaram a ocupar, ao mesmo tempo, o hall do teatro onde ocorria o evento, mas sequer se cumprimentaram. O clima durante a explanação de cada um dos candidatos foi tenso. Eles tinham de responder a uma série de perguntas lidas por representantes da ONG dentro de seis eixos temáticos. As questões eram as mesmas para os dois.
A ONG é presidida pelo empresário Oded Grajew, petista e ex-assessor de Luiz Inácio Lula da Silva. Em julho, o prefeito Gilberto Kassab (PSD), aliado de Serra, travou uma queda de braço com a Rede Nossa São Paulo. A ONG apresentou um balanço informando que a prefeitura tinha cumprido até então 63% das metas estabelecidas por Kassab no início da gestão. O prefeito rebateu dizendo que cumpriu 73% das metas e criticou o trabalho da Nossa São Paulo. “Eles agem de má fé”, disse o prefeito na ocasião.
Nesta segunda-feira, uma pergunta sobre segurança pública que citava uma experiência da cidade gaúcha de Canoas foi a que mais causou controvérsia. O prefeito da cidade, Jairo Jorge da Silva (PT), foi secretário adjunto do Ministério da Educação quando Haddad comandava a pasta. A ONG informou que o exemplo foi escolhido por ser resultado de um trabalho conjunto entre a prefeitura petista, o governo do estado, na época do PSDB, e o governo federal, do PT.
Quando Haddad começava a responder se gostaria de seguir esse modelo em São Paulo, foi interrompido por um homem, que gritou. “Essa pergunta é uma piada!” O petista devolveu: “Piada é o que está acontecendo em São Paulo. Tem gente morrendo em São Paulo por causa da falta de segurança.” Haddad fez elogios ao programa e ao prefeito de Canoas. “Temos várias experiências em que o prefeito se envolveu e, por meio de uma ação comunitária, conseguiu reduzir os indicadores de criminalidade.”
A seu turno, confrontado com a mesma pergunta, Serra disse que a experiência da cidade gaúcha era “moderninha e bonitinha”, mas não funcionaria em São Paulo. “Canoas é menor do que a maioria das subprefeituras de São Paulo”, disse o tucano. “Uma cidade de 500.000 habitantes não pode ser comparada a uma cidade de 11 milhões de habitantes.” Serra reclamou da omissão na pergunta do trabalho dos Conselhos Comunitários de Segurança (Conseg) e de avanços feitos na área pelo governo estadual. “Vale a pena, um dia, vocês tentarem responder por que São Paulo é a cidade com menos incidência de homicídio.”
O tucano irritou-se com uma pergunta em que uma representante da ONG mencionava a “ausência de verdadeira política pública de cultura” na cidade. “Você detalha, por favor, essa pergunta, lista o que está faltando, diz por que a Virada Cultural não é boa”, irrompeu o candidato. Em entrevista após o evento, Serra classificou como “político-eleitoral” o questionamento. “A pergunta tinha um conteúdo partidário. Mas eu já sabia. Eu vim aqui para isso.”
O tucano compareceu ao evento acompanhado por quatro assessores e por sua secretária. Sentou à mesa munido de um iPad, uma cópia de seu plano de governo e uma grossa encadernação com uma divisória colorida sobre cada tema da administração municipal. Na plateia estavam coordenadores de campanha de Serra, o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), vereadores e secretários municipais. Ao longo do evento, Serra mostrou incômodo, com longos suspiros.
Uma mulher interrompeu a fala do tucano aos gritos, quando ele contava que tinha encontrado as subprefeituras loteadas quando assumiu a prefeitura depois da gestão de Marta Suplicy do PT. “E agora não está loteado?”, disse a espectadora. “Não está não!”, respondeu de pronto o tucano. “Se é para ter debate político aqui, podemos ter.” Oded Grajew pediu que a plateia tratasse o convidado com educação para “preservar a credibilidade” da ONG. Ao final, agradeceu Serra por ter comparecido apesar dos “obstáculos políticos”.
Saúde no centro do debate – A questão das parcerias entre a prefeitura e as organizações sociais continua dominando o debate entre os candidatos. “Tem ameaça sim de Haddad acabar com as parcerias em hospitais, ao contrário do que ele veio aqui dizer”, afirmou Serra diante da plateia. “Ele prevê que isso seja eliminado, o que vai gerar uma anarquia. Essa é a posição do PT.” Pouco antes, o petista tinha afirmado ao mesmo auditório: “Não existe a possibilidade de romper com as organizações sociais. Eu defendo as parcerias. O Tribunal de Contas está mandando é ter transparência.”
Em entrevista após o evento, Haddad refutou as acusações do adversário. “Eu não preciso falar com meias palavras. Eu digo as coisas que eu vou fazer e ponto final. Não preciso que ele [Serra] interprete. Eu não preciso de intérprete”, disse o petista. “Vou manter as parcerias, até porque sou um admirador dessas entidades.” Haddad tem acusado Serra de participar de um plano para privatizar 25% dos leitos de hospitais estaduais de São Paulo. Nas palavras do tucano, um “lero-lero”. ”Se alguém é rico, tem um plano de saúde, e é atendido no hospital público, simplesmente o plano de saúde tem de ressarcir. É só isso, mais nada”, explicou Serra.
Lula, o atacador – Questionado, após o evento sobre a afirmação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em comício em Campinas, de que “tucano tem bico bonito, mas é predador”, Serra disse que os adversários jogam baixo. “Se eu for comentar os ataques do Lula, eu não faço outra coisa. Ele é o maior atacador do Brasil”, disse o candidato. “Eles fazem a velha estratégia deles: jogam baixo e acusam os outros de jogarem baixo. Lula é especialista nisso.” Haddad também reclamou do nível da campanha. “Ontem pedi uma medição das inserções de Serra na TV: 77% delas me atacavam. Ele pode levar a 100%. Daí não passa.”