Beatriz Farrugia
Rafael Abreu
Os moradores do Edifício Caracu não têm vizinhos. À esquerda, os 22 andares do antigo prédio da Polícia Federal estão vazios há seis anos. À direita, uma construção de 17 andares tem 10 pisos de apartamentos inutilizados – os outros servem de estacionamento. O cenário da Rua Antônio de Godói reflete a situação da região central de São Paulo. Segundo o IBGE, o centro tem 21.917 domicílios vagos, o que representa uma concentração de 677,5 domicílios desocupados por quilômetro quadrado, o maior índice da cidade.
O Edifício Caracu está no ponto mais crítico: o bairro da República, onde há 1.622 imóveis vagos por quilômetro quadrado. “No fim de semana, isso aqui fica parecendo um cemitério. Não tem ninguém, não anda ninguém”, conta o síndico do prédio, Aparecido Dias. Morador desde 1979,ele diz que a segurança na região piorou depois que a PF desocupou o Edifício Wilton Paes de Almeida, em 2006.
Propriedade da União, o prédio estava cedido à Prefeitura, que não usou o imóvel por causa do alto custo de reforma. Com 2 mil metros quadrados, ele foi transferido recentemente para a Unifesp, para a instalação do Instituto de Ciências Jurídicas. Segundo o reitor Walter Manna Albertoni, o imóvel está depredado e nenhum dos elevadores funciona. A Unifesp estima que ele só poderá ser ocupado em 2014, após reforma de R$10 milhões.
O alto valor das obras e a desvalorização imobiliária da região são empecilhos para que surjam iniciativas de reativação dos prédios, explica o presidente do Secovi- SP, Claudio Bernardes. “É preciso investir muito para recuperá-los, já que a maioria foi degradada ou tem fachadas históricas. O preço de venda acaba sendo menor que o de outras regiões.” O metro quadrado útil no centro de São Paulo sai por cerca de R$ 7,2 mil. Segundo Bernardes, a maior parte dos imóveis fica abandonada por causa de problemas familiares ou de herança. Essa grande quantidade de imóveis ociosos também é reflexo do processo de urbanização do município. A região central foi a primeira a ser verticalizada, com a construção do Edifício Martinelli, nos anos 1920, e durante décadas concentrou as principais empresas e instituições financeiras da cidade, as quais, posteriormente, migraram para a Avenida Paulista e para a zona sul. “A atividade econômica acompanhou essa migração, o que fez o centro entrar em decadência”, afirma Carlos Faggin, arquiteto e professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP.
Para o geógrafo Jean Pires, da USP, a solução deve partir do poder público, através de iniciativas capazes de repovoara região, mas sem incentivar a especulação imobiliária. “Os proprietários esperam um momento oportuno de especulação para vender os imóveis a preços mais altos.”
Habitação. De acordo com a Frente de Luta para Moradia (FLM), os quase 22 mil domicílios vagos na região central poderiam abrigar 100 mil pessoas. O cálculo é do coordenador geral do movimento, Osmar Borges, que não acredita no valor social dos programas de revitalização. “A Nova Luz tem uma visão de mercado, não de habitação social. Os interesses econômicos acabam favorecendo projetos de classes média e média-alta.”
A Secretaria de Habitação (Sehab), que não possui registro próprio sobre a quantidade de imóveis vagos na cidade, afirma que o Renova Centro prevê a reforma de prédios vazios para fins habitacionais. Por meio de acordos com a Companhia Metropolitana de Habitação de São Paulo (Cohab-SP), a Prefeitura pretende destinar 63 edifícios na região central para moradias populares, totalizando3.400unidadeshabitacionais.Atéomomento, no entanto, apenas três prédios foram entregues à população e cinco estão em obras. A reforma de outros nove está mais próxima de sair do papel. De acordo com a Sehab, das outras propriedades, 26 estão em fase desapropriação e 20 em fase de estudo de viabilidade técnica.