Em discurso na Câmara, ex-judoca afirma que quebra de sigilo fiscal e bancário foi feito de ‘forma obscura’
Acusado de cobrar propina em CPI, ele diz que não era o relator, cargo ocupado por atual secretário de Haddad
DE SÃO PAULO
O campeão olímpico de judô e vereador Aurélio Miguel (PR) criticou ontem o Ministério Público e a imprensa durante pronunciamento de aproximadamente 12 minutos na Câmara Municipal.
A um plenário quase vazio ele afirmou que teve os sigilos fiscal e bancário quebrados de "forma obscura, para dar manchete". Miguel é acusado de cobrar propina para livrar shoppings de investigações da CPI do IPTU, em 2009, da qual ele era o presidente.
O judoca é investigado por lavagem de dinheiro e já foi denunciado pela Promotoria por suspeita de corrupção e improbidade administrativa.
Na semana passada, a Folha revelou que o vereador teve uma explosão patrimonial após se tornar parlamentar.
Miguel disse que abriu em 2012 seus sigilos fiscal e bancário ao Ministério Público.
"Este vereador colocou seus sigilos à disposição. Não só autorizou a quebra como levou [ao Ministério Público] todos os impostos de renda e também todos os extratos bancários por não temer nada a respeito desse absurdo que tentam me envolver."
Ele diz ainda que, desde 2006, questiona os processos da Secretaria Municipal de Habitação. "Peço que se faça uma investigação naquele órgão, que é uma caixa preta."
Miguel afirma que está sendo "incriminado e condenado por suspeita". Segundo ele, parte de seus bens são relacionados a herança, como a de um imóvel de R$ 3,5 milhões herdado de sua mãe.
"Tenho rendimentos suficientes para conseguir os bens que tenho, tenho empréstimo do meu genitor e financiamentos da Caixa."
"RECADO"
No discurso, Miguel deu declaração interpretada por vereadores como um recado: "Eu não era o relator da CPI, era apenas o presidente."
O relator na comissão era Antonio Donato (PT), atual secretário de Governo da gestão Fernando Haddad (PT).
Vereadores ouvidos pela Folha disseram, antes mesmo do discurso, que ele citaria Donato com a intenção de passar o recado de que, se não tiver o respaldo do governo para se defender, o secretário poderia ser envolvido.
O governo tem maioria na Câmara e Miguel acredita, segundo relato de outros vereadores, que a única maneira de salvar seu mandato é obter o apoio de Haddad.
Citar Donato no discurso seria, então, uma ameaça velada. O secretário de Governo não quis se manifestar.
Desde que Miguel foi citado pela primeira vez em supostas irregularidades, em junho do ano passado, a Câmara não tomou nenhuma providência para investigá-lo.
Porém, para os próximos dias, é esperada uma representação na Corregedoria da Casa contra o judoca -então, a Câmara terá de dar uma resposta oficial sobre o tema.
(GILBERTO BERGAMIM JR., EVANDRO SPINELLI E ROGÉRIO PAGNAN)