Incorporadoras aproveitaram mudança de Lei de Zoneamento para, entre outras coisas, construir prédios mais altos ao lado de vilas
CAIO DO VALLE – O Estado de S.Paulo
Milhares de novas construções na cidade são irregulares. Essa é a avaliação do advogado do Instituto Brasileiro de Eco-Desenvolvimento (Ibed), Bruno Brasil. Em 2008, a entidade que ele representa propôs uma ação civil no Ministério Público Estadual (MPE) para barrar um desses empreendimentos nos Jardins, na zona sul paulistana. No fim de janeiro, a Justiça suspendeu novamente a construção das obras, que haviam recomeçado após decisão favorável do Tribunal de Justiça em outubro.
O que o Ibed entende por irregulares são edificações que ainda levam em conta os parâmetros da antiga Lei de Zoneamento, extinta em fevereiro de 2005. Depois disso, regras como altura dos prédios se tornaram mais rígidas. Também mudaram os critérios para edifícios ao lado de vilas, que teriam de ser muito mais baixos do que antes, para a preservação arquitetônica e urbanística das ruelas fechadas.
Especificamente, esse é o problema que o Ibed detectou em um prédio projetado para a altura do número 1.389 da Rua Peixoto Gomide, como informou o Estado em janeiro. Os incorporadores planejaram uma estrutura de 24 andares, permitida pelo zoneamento anterior. Entretanto, a nova lei só autoriza um prédio de 15 metros de altura, bem menor, com cerca de cinco andares.
Brasil diz que entre a aprovação da atual Lei de Zoneamento, em agosto de 2004, e a sua entrada em vigor, seis meses depois, diversas incorporadoras, incluindo as responsáveis pelo prédio da Peixoto Gomide, protocolaram projetos na Prefeitura para a obtenção do alvará da obra e para tentarem se beneficiar das velhas regras, mais flexíveis e que permitiam prédios maiores em várias zonas densamente povoadas.
Dados da Secretaria Municipal da Habitação revelam que foram protocolados 1.829 processos de alvará de aprovação de edificação nova e de alvará de aprovação e execução no período citado pelo defensor do Ibed.
Duas empresas – a FRC Incorporação e a Sanca Engenharia – registraram pedidos para a construção de um prédio residencial naquele trecho da Peixoto Gomide na mesma data, poucos dias antes da entrada em vigência do novo zoneamento, no início de 2005. Uma ingressou com um pedido para uma área com seis casas e outro para uma área com apenas quatro dessas residências. "Obviamente, não tinham segurança de que conseguiriam comprar todas as casas. Não sabiam como ia acontecer, então entraram com dois projetos", afirma o advogado Brasil.
Em nota, a SPE Peixoto II, sociedade que representa as construtoras por trás do empreendimento, assumiu que mandou dois projetos poucos dias antes da data limite para os requerimentos serem feitos conforme os critérios antigos e, por isso, estava no prazo. Além disso, informou que posteriormente foi dado prosseguimento ao requerimento que abrangia os seis imóveis que dariam lugar ao terreno onde seria o prédio, invalidando os pedidos anteriores.
Imbróglio. No mês passado, ao saber que as obras seriam retomadas após decisão favorável do TJ às incorporadoras, o Ibed entrou com recurso para tentar manter as obras suspensas, enquanto o caso não for julgado no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Supremo Tribunal de Justiça (STJ). Antes de seguir para Brasília, o pedido é avaliado pelo TJ para que se decida se será ou não admitido.
Em caráter provisório, o desembargador Samuel Alves Júnior acatou o pedido do Ibed e parou a construção. Isso até que Prefeitura e construtoras se pronunciem e ele possa decidir se a questão subirá para as instâncias superiores.
Moradores próximos da obra se organizaram para tentar barrar o empreendimento. Na internet (http://peticaopublica.com.br/PeticaoVer.aspx?pi=P2013N35591), circula um abaixo-assinado para tentar convencer Alves Júnior da importância de manter a obra parada. Um dos signatários é o empresário Charlô Whately, de 57 anos, que vive na cobertura de um prédio vizinho. Para ele, a nova construção trará sombra e atrapalhará o tráfego da região.