“Para encurtar o caminho até o escritório” – Valor Econômico

Por Carolina Cortez | De São Paulo

Para chegar ao trabalho, Adriana Garcia pega um ônibus no Sacomã, bairro da zona Sul de São Paulo, até o metrô. Lá, ela passa por oito estações até chegar à Consolação, onde faz baldeação para a linha amarela com o objetivo de tomar o trem em Pinheiros. Já no trem, mais quatro estações a separam de seu objetivo, a avenida Engenheiro Luis Carlos Berrini. Ao descer, ela anda mais dez minutos até o prédio da Laureate International Universities, onde trabalha como assistente administrativa há dois anos, na avenida das Nações Unidas. O trajeto todo leva cerca de duas horas – isso quando não há imprevistos como chuvas fortes na capital. Como o percurso da volta é o mesmo, Adriana gasta em torno de quatro horas por dia para chegar ao escritório.

"Já estou cansada todos os dias antes mesmo de o expediente começar", diz. De carona, entretanto, o tempo que ela gasta poderia ser reduzido para 50 minutos por viagem, ou uma hora e quarenta minutos por dia. "Eu teria mais condições de aproveitar melhor o meu tempo se não ficasse tanto na rua. Poderia estar mais com o meu filho, que tem apenas quatro anos, entrar para uma academia ou fazer cursos de idioma", complementa.

Problemas de mobilidade como os de Adriana são muito comuns em megalópoles como São Paulo – mundialmente conhecidas por seu trânsito caótico e pela infraestrutura de transporte deficitária em relação ao seu índice populacional. Por conta disso, as empresas começam a se preocupar com a qualidade de vida dos funcionários que moram longe do trabalho e perdem muito tempo na locomoção até o escritório.

Uma das iniciativas tomadas recentemente foi por companhias da região do Brooklin, zona Sul da capital paulista, em parceria com o Banco Mundial. O projeto, realizado como um piloto no Brasil e no México, segue rumo à terceira e última fase, prevista para junho.

Na primeira, foram selecionadas empresas localizadas em regiões de difícil acesso para mapear o tempo que cada colaborador leva de casa até o trabalho. Na segunda etapa, foram levantadas possíveis alternativas de transporte para esses funcionários como carona, uso de bicicletas, horários flexíveis de trabalho e home office. Já a terceira fase consistirá no acompanhamento, por agentes do Banco Mundial, da execução do projeto em cada empresa participante. Isso porque as mudanças culturais envolvem, ainda, gastos com infraestrutura – para motivar o uso de bicicletas, por exemplo, é preciso instruir o funcionário sobre segurança de trânsito e construir vestiários e bicicletários.

"Como o projeto envolve empresas do mesmo prédio, elas podem se organizar para dividir custos, o que eleva as chances de sucesso", explica Andrea Leal, coordenadora do setor de transporte, da unidade de desenvolvimento sustentável do Banco Mundial. Segundo ela, o objetivo é replicar o programa em outras cidades da América Latina e países da África.

Em São Paulo, estão participando 20 companhias localizadas nos prédios do WTC e Cenu. Dos 1.054 colaboradores que responderam aos questionários, 38% levam mais de 60 minutos no trajeto ao trabalho. Ao todo, 25% utilizam transporte público, 6% pegam ônibus fretado e 57% vão dirigindo de carro – enquanto apenas 5% vão de carona. A bicicleta é utilizada por 0,4% dos funcionários e quase ninguém faz home office com frequência.

A Laureate, que aceitou ingressar no programa, pretende implementar neste semestre diversas medidas para reduzir o tempo que seus funcionários perdem no trânsito. Entre as principais está o uso de ônibus fretado, subsidiado pela companhia, o home office e o incentivo à carona. Segundo explica Rosa Moraes, diretora da Laureate no Brasil, o funcionário que der carona terá direito a uma vaga no estacionamento, hoje disponível apenas para o alto escalão da empresa. Além disso, os colaboradores que pegarem carona, usarem o ônibus fretado ou a bicicleta, terão direito a pegar táxi em casos de emergência. "Estamos estudando, ainda, reembolsar quem decidir deixar o carro em casa, seja diretamente no salário ou em descontos em serviços como academia", afirma.

A ideia de deixar o carro em casa, também incentivada pelo Banco Mundial, tem como objetivo contribuir para a redução do trânsito de São Paulo e da emissão de gases do efeito estufa na atmosfera. "Além de motivar as empresas a prezarem pela qualidade de vida dos funcionários, queremos contribuir para que a iniciativa privada perceba que ela é tão responsável quanto os governos pelos impactos ambientais", analisa Andrea.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) compartilha dessa opinião. "Temos de dar o exemplo aos nossos associados", afirma Eleno Gonçalves Junior, superintendente adjunto de operações da entidade. Por conta disso, a empresa, que aceitou participar do proje to, pretende reduzir o tempo que seus funcionários levam no trajeto até o trabalho de diversas formas, com o incentivo à carona, ao teletrabalho e ao fretamento de ônibus subsidiados pela instituição. "Quem não tiver condições de executar o trabalho de casa terá a opção de distribuir a carga horária pela semana de forma a conseguir folgar um dia inteiro. Ou seja, vir ao escritório apenas quatro dias, e não cinco."

Mesmo sem o alcance do Banco Mundial, cujo projeto é focado apenas nos prédios do WTC e Cenu, grandes empresas estão desenvolvendo seus próprios programas de mobilidade. Um exemplo é o Citibank, que desde outubro do ano passado tem motivado seus funcionários a usarem um sistema organizado de caronas, o Caronetas, principalmente aqueles que não trabalham na unidade da avenida Paulista, abastecida por diversas linhas de metrô. A companhia, que soma mais de sete mil funcionários no país, também apoia o home office em três dias semanais e o uso de bicicletas, mas é no Caronetas que se concentram os mais recentes investimentos em mobilidade. A plataforma, criada pelo empresário Marcio Nigro em 2011, é um site que reúne a oferta e a demanda de caronas no país. As empresas participantes cadastram seus funcionários, que podem acompanhar em tempo real quem está se dirigindo até o trabalho no momento e solicitar carona.

Quem dá carona recebe uma moeda virtual, que poderá ser trocada por vale presentes em lojas. Segundo Priscilla Cortezze, superintendente de assuntos corporativos e sustentabilidade do Citibank, nos últimos três meses já foram cadastrados mais de 250 funcionários no site. "Os participantes têm gostado muito, pois descobrem que os colegas são também vizinhos e acabam fazendo amizade", afirma. Este ano, o objetivo é expandir o uso de caronas entre funcionários de outras companhias. Hoje, somente colaboradores do Citibank estão autorizados a levar colegas de trabalho.

Para Nigro, a origem do trânsito das grandes cidades está nas empresas, o que implica que é responsabilidade delas minimizar o tempo que seus colaboradores gastam para chegar. "O benefício do programa pode ser calculado facilmente. Reduzindo o número de veículos nas ruas, o trânsito será menor e o tempo até o trabalho, também", estima.

Gilson Giannocoro Salateo, técnico de planejamento e manutenção de aeronaves da TAM, sabe que sua empresa participa do Caronetas, mas prefere deixar o carro em casa para ir ao trabalho de bicicleta. O percurso dura cerca de 20 minutos, partindo do Brooklin até o aeroporto de Congonhas. "Vou de carro apenas quando está chovendo. Gosto da ideia de poder me exercitar no trajeto, pois quase não sobra tempo no meu dia para atividades físicas", diz.

Para que isso seja possível, ele leva a roupa de trabalho na mochila e se troca no vestiário da empresa. Salateo adotou a prática quando a companhia estreou o bicicletário, em novembro. "Procuro incentivar meus colegas a fazerem o mesmo e dou dicas de segurança sempre que alguém me procura", afirma.

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