Prefeito adapta discurso de campanha a plano de metas mais enxuto; oposição critica governo e diz que PT ‘compactua com o irregular
Artur Rodrigues e Rodrigo Burgarelli
Prestes a completar cem dias no poder da maior cidade do País, na próxima quarta-feira, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), adaptou promessas de campanha à realidade e apresentou um plano de metas mais enxuto que o da campanha. Ao mesmo tempo, já começou a tirar do papel algumas das suas principais propostas, deixando de lado as grandes bandeiras do antecessor Gilberto Kassab (PSD).
Entre os compromissos flexibilizados está o fim da taxa da inspeção veicular, aprovada na Câmara Municipal no mês passado e criticada por ser apenas parcial. Quem não passa no teste continua tendo de pagar. “Dá para dizer que estamos isentando uma inspeção de cada (contribuinte). Imagine uma pessoa que precisa de dez inspeções para passar? É justo com aquele que regulou seu motor? Não é razoável”, justificou-se o prefeito.
Haddad garante que não se restringirá ao plano de metas, lista que não contemplou promessas feitas durante a campanha eleitoral, como os repasses de verba para o Metrô ou a construção de parques. Para ele, os primeiros meses já serviram para pavimentar o caminho para poder cumprir tudo que prometeu, em uma administração que é vista como vitrine pelo PT. “Se não fizer nos primeiros dias, depois sua atividade de criação e inovação fica muito mais difícil”, afirma.
Algumas mudanças profundas, porém, já estão tomando forma nos primeiros cem dias de governo. Grande parte delas está enterrando antigas marcas da gestão Kassab. Além da própria inspeção veicular, cujo modelo atual (com inspeções anuais pagas pelos proprietários e feitas pela Controlar) havia sido iniciado e defendido pelo ex-prefeito, vários outros projetos que caracterizam os seis anos de Kassab à frente da Prefeitura.
Um deles é o projeto Nova Luz. O plano deixado pronto pelo ex-prefeito previa a contratação de uma empresa que teria poder de desapropriar qualquer imóvel que julgasse necessário em um perímetro de 45 quarteirões. Em troca, ela faria obras de urbanização e incentivaria novos tipos de ocupação do espaço.
O modelo de concessão foi julgado inviável pelo petista, apesar de ele não descartar um eventual uso de parte do projeto que custou R$ 14 milhões ao município. “Eu tenho de ser coerente com as ideias que eu defendi, sem me preocupar se isso agrada ou desagrada ex-prefeitos em geral, não é só o anterior”, disse Haddad.
Foco
O principal projeto social de Kassab, as tendas para moradores de rua, deve ser substituído por um programa do governo federal. Contrariando o estilo de xerife do antecessor, o prefeito também deslocou o foco da Guarda Civil Metropolitana (GCM) e dos policiais militares da chamada Operação Delegada do combate à pirataria e comércio irregular para a segurança pública e afrouxou a legislação que pune donos de imóvie responsáveis pelas calçadas irregulares.
Além disso, todos os coronéis da Polícia Militar que administravam as 31 subprefeituras da cidade foram substituídos por técnicos civis.
Críticas
"O PT, desde o governo da Luíza Erundina, sempre pactuou com o que não era regular, seja na ocupação irregular de terras ou a questão dos camelôs. É algo que nos preocupa”, criticou o líder da oposição, Floriano Pesaro (PSDB).“O Haddad enxugou promessas de campanha no nível de sete para um e abandonou promessas sem colocar nada no lugar”, disparou.
Para o vereador Marco Aurélio Cunha (PSD), do partido de Kassab, Haddad ainda aproveitará os projetos do governo anterior, mesmo que não admita isso. “Você pega um projeto bonito, bom, que tem uma cara do partido anterior e acaba fazendo algo parecido, mas com um outro nome.”
O ex-prefeito Gilberto Kassab não quis dar entrevista, mas afirmou, por meio de sua a assessoria de imprensa, que “tem orgulho de ter avançado em todas as áreas da administração municipal, o que inclui a criação de programas ambientais, sociais e de combate ao comércio ilegal e à pirataria”.